sábado, 23 de novembro de 2024


23 de Novembro de 2024
Opinião RBS

Aproximação sem alinhamento

Há 15 anos, a China é o maior parceiro comercial do país, com um saldo amplamente favorável ao Brasil. Apenas em 2023, as exportações superaram as importações em US$ 51 bilhões. Nas últimas décadas, o gigante asiático buscou aqui boa parte dos grãos e proteínas animais necessários para nutrir a sua imensa população de mais de 1,4 bilhão de pessoas e das matérias-primas, como o minério de ferro, essenciais para os investimentos pesados que fez em infraestrutura. 

Desde 2017, o Brasil é o principal provedor de alimentos para os chineses. É uma circunstância que torna natural a busca das duas nações por estreitar laços e incrementar negócios. A aproximação, porém, não deve comprometer a postura histórica de diplomacia nacional de não alinhamento automático a potências.

Nesta linha, foi prudente o Brasil ao formalizar na semana que passou vários acordos com a China, mas não aderir formalmente ao projeto Cinturão e Rota, que prevê aportes trilionários em obras e outros projetos em países que aceitem integrar a iniciativa. Uma participação plena no plano de Pequim implicaria na percepção de perda de autonomia geopolítica e de certa submissão aos interesses chineses no tabuleiro das disputas globais. 

A cautela é ainda mais necessária diante da chegada de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos. O republicano tende a escalar o conflito econômico com a China e ser mais agressivo em questões comerciais. Não é o momento para movimentos que podem ser compreendidos como pró-China e de afastamento dos EUA e demais países ocidentais.

Ainda assim, faz sentido fechar parcerias estratégicas com a China, incrementar o intercâmbio tecnológico e buscar abrir o mercado para novos produtos nacionais. Na visita do presidente Xi Jinping a Brasília, na quarta-feira, foram assinados 37 acordos bilaterais em áreas como agricultura, infraestrutura e indústria. Optou-se por tratar a aproximação como uma procura por "sinergias". Ou seja, casar ofertas chinesas com os objetivos brasileiros incluídos em iniciativas como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Nova Indústria Brasil (NIB).

O desafio brasileiro é diversificar a pauta de exportações para a China. As dificuldades residem, sobretudo, na baixa competitividade da indústria em comparação aos custos chineses. Mas há outras oportunidades, como a atração de indústrias chinesas em áreas como tecnologia e da cadeia de veículos elétricos. Em missão na Ásia, o governador Eduardo Leite iniciou na sexta-feira a visita à China, também com este objetivo de atrair investimentos

O mundo vive dias conturbados que dividem as grandes potências e seus aliados, com desdobramentos imprevisíveis tanto no campo dos conflitos armados como comerciais. O Brasil é uma democracia, como EUA e países europeus. De outro lado, faz parte de instituições como o Brics ao lado da Rússia do autocrata Vladimir Putin e da China, uma ditadura. 

A prioridade brasileira deve ser defender os próprios interesses, mantendo uma equidistância dos polos e afastando-se de seus conflitos. É uma posição que permite extrair vantagens de negociações com ambos os lados. O Brasil já é fornecedor seguro e preferencial de commodities para a China, o que garante condições diferenciadas na hora de costurar acordos. 

Conselho Editorial - Raquel Recuero - professora, pesquisadora e membro do Conselho Editorial da RBS

O jornalismo sob os algoritmos

As plataformas de mídia social, no entanto, trouxeram um novo modelo de produção e circulação de informações, diferente da mídia de massa. Agora, ao invés de apenas receber o conteúdo, as pessoas são agentes na escolha e no treinamento de ferramentas, denominadas algoritmos, que vão hierarquizar o conteúdo que verão dali por diante. 

E essa mudança é muito relevante na medida em que o conteúdo que os algoritmos entendem que mais interessa às pessoas não é, obrigatoriamente, aquele que elas precisam ter conhecimento para participar de seus espaços como cidadãs. Essas ferramentas, assim, passam a privilegiar, para um grande número de pessoas, por exemplo, entretenimento em vez de conteúdo jornalístico. Conteúdos que, muitas vezes, geram emoção, mas não informação. Conteúdos que polarizam e não dialogam. E que geram bolhas informativas.

O problema com este modelo é que ele acaba não apenas retirando a visibilidade dos conteúdos jornalísticos nessas plataformas, mas, igualmente, desidratando um pilar da participação cidadã. Em muitos casos, isso leva à radicalização das pessoas e à desconfiança em relação ao próprio Estado. Em outros, o cidadão simplesmente opta por consumir conteúdos que são mais agradáveis ou convenientes, ignorando os que são realmente necessários. 

Com menos atenção, o jornalismo tenta se reinventar, muitas vezes também privilegiando o entretenimento e o sensacionalismo ao invés das notícias. E o resultado disso é que temos menos informação de qualidade, mais apatia e menor participação. Afinal de contas, temos cada vez menos cidadãos. E, cada vez mais, menos jornalismo. Assim, não será surpresa se, no futuro, tivermos, também, menos democracia. 

OPINIÃO

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