INTERVENÇÃO MILITAR
Atentado ao STF criou ambiente para avanço de apuração sobre trama golpista. Indiciamento de ex-presidente e outras 36 pessoas ocorreu uma semana após explosões na Praça dos Três Poderes. Incidente gerou entendimento entre membros da Corte e da Polícia Federal de que é preciso frear o projeto da anistia aos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro.
Não é mera coincidência o cerco contra o grupo suspeito de planejar um golpe de Estado em 2022 ocorrer uma semana após o atentado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Tão logo Francisco Wanderley Luiz detonou a sequência de bombas na Praça dos Três Poderes, no dia 13, entrou em curso a investida que culminou, na quinta-feira, no indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 36 pessoas.
Há um entendimento na cúpula da Polícia Federal (PF) e em setores do STF de que é preciso acelerar a conclusão dos inquéritos e trazer à tona o resultado das investigações para frear o avanço, no Congresso, da anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023.
O perdão aos suspeitos, com reversão da inelegibilidade de Bolsonaro, ganhou tração após a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos. A aprovação de um projeto de lei passou a ser ventilada como condição para parlamentares ligados a Bolsonaro apoiar Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) à presidência da Câmara e do Senado, respectivamente.
No STF, a naturalização com que o assunto ganhava escopo no Congresso e sobretudo na opinião pública, granjeando espaço na imprensa, causava incômodo explícito no ministro Alexandre de Moraes. Até mesmo no PT houve quem flertasse com a ideia, por entender que Bolsonaro seria o adversário de direita mais fácil de ser batido em 2026.
No último dia 13, Moraes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, estavam reunidos no Palácio da Alvorada quando houve o ataque à sede do STF. Naquela tarde, Lula deixou o Palácio do Planalto mais cedo, por volta das 17h30min, e o encontro com Rodrigues e Moraes não constava da agenda de nenhum deles. Após as explosões, se uniram ao trio os ministros do STF Gilmar Mendes e Cristiano Zanin.
Operação Contragolpe
No dia seguinte, 14 de novembro, a PF encaminhou ao STF relatório de 221 páginas no qual detalha suposta intentona golpista com planos para assassinar Lula, Moraes e o vice-presidente Geraldo Alckmin. Ao final do texto, quatro delegados pedem a prisão de quatro oficiais do Exército e um policial federal.
Um dia depois, em pleno feriado, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, chancelou a iniciativa policial. O despacho de Moraes acatando os pedidos e expedindo cinco mandados de prisão e outros seis de busca e apreensão foi emitido no domingo, 17 de novembro.
Batizada de Operação Contragolpe, a ação da PF foi às ruas no alvorecer de terça-feira, dia 19, dois dias após a decisão judicial e em meio ao encontro de cúpula do G20, no Rio.
Interlocutores de Moraes afirmam que ele aproveitou os holofotes da imprensa mundial e a presença no país de chefes de Estado das principais potências econômicas do planeta para demonstrar o vigor das instituições brasileiras.
Na sequência, o indiciamento na quinta-feira de Bolsonaro e outras 36 pessoas, acompanhado de novo depoimento do tenente-coronel Mauro Cid, compõem o cenário da maior investida contra o ex-presidente desde o fim de seu mandato.
Suspeitando que Mauro Cid estivesse omitindo informações sobre o papel de Bolsonaro na trama, Moraes fez questão de conduzir pessoalmente o interrogatório, expediente que costuma delegar para o juiz federal que o assessora nos processos.
É voz corrente no STF que Moraes estava irritado com a lentidão das investigações. Ao tempo em que o ministro cobrava celeridade da PF, o procurador-geral da República Paulo Gonet advertia os delegados de que a apuração precisa ser robusta e irrefutável, sem abrir brechas a eventuais anulações.
Para Moraes, a demora fazia crescer na Corte um espírito apaziguador e que defendia uma tramitação lenta dos processos contra Bolsonaro, para que ninguém fosse preso "antes da hora".
Moraes também sofre críticas de colegas sobre decisões consideradas rígidas demais. Ao atacar o STF, Francisco Wanderley Luiz precipitou a resposta da PF e do STF, fazendo recrudescer o sentimento de autodefesa da Corte. O entendimento agora é de que jamais houve um ambiente tão favorável à investida do ministro.
Inicialmente, Moraes pretendia desdobrar as investigações contra Bolsonaro em vários inquéritos como forma de obter condenações sucessivas. Nas últimas semanas, porém, ganhou força no gabinete de Gonet a apresentação de uma única acusação criminal, unindo os indícios de participar de tentativa de golpe de Estado, atentar contra instituições, vender joias da Presidência, falsificar comprovante de vacina e espionar adversários.
Na opinião de Gonet, tal construção jurídica teria maior amparo entre os ministros ao demonstrar com vigor a suposta ação criminosa e golpista de um grupo formado à época por militares de alta patente, ministros de Estado e o próprio presidente da República. _
Advogado de Cid diz que Bolsonaro sabia e depois recua
O advogado Cezar Bittencourt disse na sexta-feira, em entrevista à GloboNews, que o tenente-coronel Mauro Cid relatou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o ex-presidente Jair Bolsonaro sabia do plano para execução do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes. Logo após fazer a afirmação, porém, ele recuou das declarações.
Questionado, o defensor afirmou inicialmente que o ex-presidente "sabia tudo". Minutos depois, ele disse que não havia se referido ao "plano de execução".
Denúncia em fevereiro
O ministro Alexandre de Moraes encaminhará, na segunda-feira, o relatório final do inquérito à Procuradoria-Geral da República (PGR). A expectativa é de que a PGR apresente denúncia contra os indiciados a partir de fevereiro.
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