sábado, 23 de novembro de 2024


23 de Novembro de 2024
COM A PALAVRA - James Alan Robinson

Professor da Universidade de Chicago e um dos agraciados com o Prêmio Nobel de Economia de 2024

"Países com instituições mais sólidas tendem a resistir com mais força". 

O economista inglês James Alan Robinson, 64 anos, foi um dos três laureados com o Prêmio Nobel de Economia deste ano. Nesta entrevista, ele comenta o seu trabalho e explica conceitos fundamentais de sua pesquisa sobre a diferença na prosperidade das nações.

Mathias Boni

Qual você acha que é, até agora, a maior contribuição do seu trabalho?

É ilustrar que são as próprias pessoas que criam as sociedades que geram prosperidade ou pobreza. A razão pelo Brasil ser mais pobre do que os Estados Unidos, por exemplo, é a maneira histórica como cada sociedade foi desenvolvida, como as instituições em cada país foram estabelecidas, os incentivos e oportunidades que são gerados a partir disso, tudo está relacionado às políticas que sustentam as sociedades e suas instituições. A geografia e a cultura de cada lugar também influenciam, mas não há nada de inevitável em relação a isso. É o seu processo de desenvolvimento histórico e o poder e formato das instituições que regem as nações que definem isso com mais força.

Como o processo de colonização europeia influenciou no desenvolvimento futuro das suas antigas colônias?

O exemplo das Américas é de certa forma fascinante, do ponto de vista de pesquisa, porque temos casos bem distintos de desenvolvimento dentro do continente, no sentido de que há países bem prósperos e também países bem pobres, e é impossível pensar na comparação do desenvolvimento dos países sem levar em conta o colonialismo e seu legado em cada lugar. 

Nós apontamos que, o que determinou, por exemplo, os aspectos iniciais de colonização do Brasil, é que as condições locais eram favoráveis ao estabelecimento de grandes plantações, como de cana-de-açúcar, e os colonizadores usaram a força de trabalho dos africanos escravizados para massificar essa produção. Em lugares como a Bolívia, os colonizadores se utilizaram do trabalho forçado dos indígenas para trabalhar na agricultura e na extração de minerais. Então, você tem como resultado essas sociedades hierárquicas, desiguais, que emergem desse período, essa é de certa forma a raiz da desigualdade na América Latina. 

Na América do Norte, o que aconteceu não foi um desejo benevolente dos colonizadores, mas as condições locais eram diferentes, não foi possível organizar uma sociedade local baseada no trabalho escravo em um primeiro momento, quando as instituições estavam se formando - no sul dos Estados Unidos isso ocorreu, mas só depois das instituições básicas já formadas - e isso criou uma dinâmica institucional muito diferente do que ocorreu na América do Sul.

? Vocês trabalham muito o conceito de instituições extrativistas na pesquisa. Pode explicar?

As instituições extrativistas eram as bases das sociedades que tinham como objetivo principal extrair riquezas minerais e produtos agrários das colônias, concentrando o poder político e econômico nas mãos de pouquíssimas pessoas. Essa economia extrativista e as instituições políticas e econômicas estabelecidas para dar suporte a esse sistema geraram desigualdade. 

Há uma sinergia entre o sistema econômico e o sistema político que o sustenta, gerando instituições fracas e um Estado fraco, controlados pelas poucas pessoas que detêm o poder econômico e político local. Se você pensar nos países da América Latina, a desigualdade do período colonial se estabeleceu porque o sistema político era altamente oligárquico e autocrata, a grande maioria das pessoas não tinha nenhum poder para pressionar por mudanças, porque todo esse poder estava concentrado nas elites, e instituições e Estados fracos são inoperantes para estabelecer um equilíbrio nessas sociedades. 

Por outro lado, instituições políticas e econômicas inclusivas são mais igualitárias, distribuem melhor as riquezas geradas pelas atividades econômicas locais, e os indivíduos da sociedade têm maior poder de decisão sobre as políticas públicas desenvolvidas.

Em países que se tornaram pobres por causa dessa colonização há atualmente um movimento inverso, com muitos cidadãos indo em direção à Europa. Como você vê isso?

Historicamente, a absorção de talentos vindos de outras regiões pode representar importante vantagem econômica para os países, mas quando esse movimento de imigração vem em massa, se torna uma questão política muito difícil de administrar. Isso se torna especialmente sensível nos tempos atuais, com a volta da força de ideologias ligadas ao nacionalismo e à identidade. 

Países europeus têm tentado todo tipo de possibilidade para evitar esse movimento, construindo o que chamam de "fortaleza europeia" ou mesmo aparecendo com ideias como deportar imigrantes para países africanos. A solução mais efetiva seria desenvolver as instituições nos países de origem e fortalecer os Estados, mas demandaria muito investimento e também um longo prazo para colher resultados efetivos.

Como observa o fenômeno da ascensão da extrema direita?

Nos EUA, uma boa parcela da população não teve melhora significativa nas condições de vida nas últimas décadas, principalmente se você não tem uma formação no ensino superior, e de alguma forma Trump conseguiu criar um projeto com apelo a essas pessoas. 

Obviamente, a culpa não é dos imigrantes, mas Trump diz que os imigrantes estão roubando os empregos dos americanos, o que não é verdade, só que o discurso funciona. Mas a imigração não é uma questão na Argentina, nem no Brasil, e mesmo assim Javier Milei e Jair Bolsonaro foram eleitos. Acredito que essa onda está mais ligada à frustração das pessoas com a ideia de democracia. Nos últimos cem anos, o mundo ficou mais democrático de forma geral. 

As sociedades ansiavam pela democracia, e muita coisa foi prometida a elas, mas para uma parcela das populações não necessariamente sua qualidade de vida melhorou. A partir desta frustração, líderes políticos com ideias claramente antidemocráticas têm conseguido captar esse sentimento, culpando qualquer que seja o inimigo que tenha mais apelo naquele contexto. Países com instituições mais sólidas tendem a resistir com mais força contra tentativas de subverter governos, enquanto os com instituições mais fracas acabam sofrendo mais riscos de hiatos democráticos. 

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