Entrelacos

 A despedida de Raul Randon

EMPRESÁRIO MORREU na noite de sábado, aos 88 anos. Missa e cerimônia de cremação ocorrem hoje, em Caxias do Sul

O empresário que deu seu sobrenome a um dos maiores conglomerados metalmecânicos do país e as iniciais de seu nome a uma iniciativa de sucesso no ramo de alimentos encerrou seu ciclo de empreendedorismo na noite de sábado. Raul Anselmo Randon morreu aos 88 anos, em São Paulo. O fundador das Empresas Randon estava internado no Hospital Albert Einstein desde dezembro, quando fez cirurgia para implantar um pino entre o quadril e o fêmur, mas complicações ocorreram desde então.

Catarinense de Tangará, foi em Caxias do Sul que o neto de imigrantes italianos ergueu um império que se mistura com o desenvolvimento da Serra. À frente dos negócios, que têm origem na pequena oficina mecânica que fundou em sociedade com o irmão Hercílio, em 1949, e se expandiram para uma das maiores fabricantes de carrocerias de caminhão, autopeças e implementos agrícolas do planeta, construiu trajetória marcada por empreendedorismo, responsabilidade social e veia visionária.

Baseava a confiança no sucesso de seus negócios naquilo que se tornou uma de suas máximas: o transporte e a comida são duas coisas que nunca vão terminar. Foi assim que, conforme os filhos foram assumindo o controle das fábricas ligadas à logística, expandiu seu olhar para o agronegócio e para a gastronomia. Em duas décadas, consolidou sete marcas no mercado, de maçãs a queijos e vinhos.

VISÃO EMPREENDEDORA EM TODOS OS ASPECTOS

Para além do empresário que empregava mais de 8 mil funcionários, no Brasil e no Exterior, Raul Randon gostava da vida e se dedicava a suas paixões, muitas vezes, transformando-as em negócios. Das viagens anuais à Itália, abraçou a ideia de um amigo de produzir um queijo inédito na América Latina, o grana padano. Para comemorar as bodas de ouro com a mulher, Nilva, em 2006, produziu com a vinícola Miolo, da qual se tornou sócio, o vinho especial que leva as suas iniciais, RAR. Na fazenda em Vacaria, onde gostava de descansar e jogar cartas com os amigos, deu início à plantação de macieiras que o tornou o quinto maior produtor e exportador da fruta no Brasil.

Foi a incursão na agropecuária que rendeu a Raul uma das histórias com as quais mais se divertia e gostava de contar, sendo muitas vezes convidado a relembrar em entrevistas. Após obter a licença para produzir o queijo tipo grana no Brasil, foi atrás de todo o equipamento mais sofisticado para iniciar os trabalhos. Mas não era o suficiente. Mesmo as vacas precisaram ser importadas. E foi assim que, num certo dia de 1996, o público que aguardava pelo desembarque de passageiros no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, assistiu à chegada, em dois Boeings, de 130 novilhas holandesas trazidas dos EUA. Poucas coisas pareciam deixar Raul mais orgulhoso do que o sucesso com o queijo.

Ao mesmo tempo cativante e identificada com a Serra, onde sempre morou, a figura de Raul Randon fascina pela ascensão do ajudante de ferreiro que em pouco mais de meio século de trabalho ingressou na lista de bilionários da revista Forbes Brasil, com fortuna estimada em R$ 1,27 bilhão em 2013. Dos mais de cem títulos e homenagens que recebeu em vida, ter sido o segundo brasileiro (o primeiro foi Jorge Amado) laureado doutor honoris causa pela Universidade de Pádua, uma das mais antigas e importantes da Itália, talvez tenha sido a mais importante. A honraria foi concedida em 2017. 

Sua trajetória foi contada em filme, livros e dezenas de entrevistas e perfis jornalísticos na imprensa de todo o país. Desta forma, o público pôde conhecer o homem que nadava três vezes por semana e o pai exigente de David, Roseli, Alexandre, Maurien e Daniel.