terça-feira, 2 de maio de 2017

02 de maio de 2017 | N° 18834 
DAVID COIMBRA

  • Os ratos se unem

    Vou escrever sobre ratos e, antes mesmo de abordar o que me arrasta a esse tema, lembro de uma história antiga, que urge contar. A que segue aí embaixo:

    Minha mãe estava grávida, e quem se repimpava dentro da barriga dela era o degas aqui. Parece que estava bom por lá, porque, segundo os cálculos familiares, já havia passado da hora do nascimento, e nada de eu querer sair. Hoje, em retrospectiva, penso que tinha certa razão.

    De qualquer forma, lá estava a minha mãe, muito grávida, sentada pesadamente em uma cadeira na cozinha da casa da minha avó, que andava preocupadíssima com o atraso da chegada de seu primeiro neto.

    Ela, minha avó, lidava ao fogão, preparando o jantar, enquanto minha mãe observava. Foi neste momento que um rato invadiu o ambiente. Não era um ratão, desses de que hoje me ocuparei, e sim um ratinho. Um camundongo. Mas quem disse que isso importa? Minha mãe, como a maioria das pessoas, tem horror a rato. Só ela viu o camundongo se aproximando e, quando o viu, reagiu como reagiria a maioria das mulheres: ergueu as duas pernas do chão e deu um grito de pavor. Minha avó, virando-se do fogão e deparando com a filha grávida abrindo as pernas e urrando, pensou: “É agora!”.

    Desmaiou ali mesmo.

    Essa anedota familiar, embora verídica, não tem relação com os ratos de que falarei. Refiro-me aos grandes e gordos ratões da política brasileira.

    O rato, você sabe, é um animal que se move nas sombras. Ele está em toda parte, sempre sob a superfície, esgueirando-se pelos cantos mais improváveis. Você toma suas precauções, acredita que está a salvo, mas, de repente, aquela ratazana do tamanho de um gato se espreme por uma fresta pela qual só passaria uma barata e surge, ameaçadora, bem na sua frente.

    Eles são assim surpreendentes.

    Pois nossos ratões, hoje, estão empreendendo um movimento inédito a fim de se livrar da Lava-Jato. Depois de três anos acuados, eles encontraram uma forma de reagir: é a suposta candidatura de Lula à Presidência da República.

    Não foi por acaso que o liso Renan Calheiros se uniu a Lula, nos últimos tempos. Os outros, mais lentos do que Renan, só agora compreenderam: Lula é a única chance que eles têm.

    Não que Lula possa ser eleito presidente. Não será, em nenhuma circunstância. Lula perdeu o trunfo que o elegeu em 2002. Ele havia sido derrotado nas três eleições anteriores. Perdeu para um candidato péssimo, que era Collor, e foi surrado duas vezes por Fernando Henrique, que se elegeu em primeiro turno.

    Por que conseguiu, enfim, vencer? Porque se tornou palatável à classe média.

    Agora, Lula perdeu a classe média. E perdeu fragorosa e irremediavelmente. Pela última pesquisa, em que aparece na frente, com 30%, acabaria derrotado pelo grotesco Bolsonaro, numa reedição de Collor. Mas não há ainda outros candidatos, além deles. Quando houver, todos, até o Tiririca, ganham de Lula.

    É uma candidatura falsa. Nem Lula acredita nela. No entanto, mantê-la viva é importante para os ratões de Brasília, porque dificulta politicamente a ação da Lava-Jato.

    Pela justiça e pelo bom senso, Lula teria de ser condenado e preso. Só que é muito difícil fazer isso com um líder popular que supostamente resplandece como o próximo presidente.

    “Vejam, estão perseguindo o Lula porque não querem que ele se eleja!”. Esse, hoje, é o grito de alguns. Logo se tornará o grito de todos. Um Lula que desmoralize a Lava-Jato interessa a todos eles, inclusive ao PSDB. Os tucanos, você verá, em breve estarão defendendo Lula.

    Lula não se elegerá presidente. Mas unirá a classe política brasileira. Ratões, unidos, dificilmente são vencidos.

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