CLÓVIS
ROSSI
Dilma se engana sobre desigualdade
De
novo, uma governante insiste na falsa tese de que desigualdade caiu no Brasil,
ao contrário do mundo
A
presidente Dilma Rousseff engana-se e, por extensão , engana o público ao afirmar que a
desigualdade no Brasil está diminuindo, na "contracorrente" do que
ocorre no resto do mundo.
Pena
que essa suposta jabuticaba, fenômeno que só se dá no Brasil, seja lenda
incentivada pela omissão ou covardia de uma parcela majoritária da
intelectualidade.
No
Brasil, pode ter diminuído a desigualdade entre salários --e, mesmo assim,
tenho lá minhas dúvidas a respeito--, mas aumentou a desigualdade realmente
importante, que é entre rendimentos do capital e rendimentos do trabalho.
Paul
Krugman, Nobel de Economia, em recente artigo para o "New York Times",
explica didaticamente como se fazem as medições:
"Temos
duas fontes de evidências tanto sobre renda como sobre riqueza: pesquisas, nas
quais as pessoas são perguntadas sobre suas finanças , e dados sobre impostos. Dados de pesquisa,
embora úteis para acompanhar os pobres e a classe média, notoriamente
subestimam a riqueza e o rendimento dos que estão no topo. (...) Assim, estudos
do 1% ou 0,1% [os super-ricos] dependem principalmente de dados sobre impostos".
Vale
para os EUA, vale para o Brasil. Com a grave diferença de que, aqui, os dados
sobre impostos não estão disponíveis, o que impediu, por exemplo, o novo
economista-estrela, Thomas Piketty, de incluir o Brasil no livro que é a sensação
do momento, "Capital no Século 21".
Anos
atrás, em um dos textos em que apontei a subestimação de dados em pesquisas
sobre rendimentos, dois economistas do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas) diziam o seguinte:
"A
pesquisa do IBGE só capta 10% dos rendimentos das famílias com juros",
afirmava Marcelo Medeiros. Completava Sergei Soares: "Esses rendimentos são
muito mal medidos pela Pnad".
O
IBGE, que faz a Pnad, é a única fonte de informação sobre a suposta queda da
desigualdade. Logo, afirmar que ela vem caindo é uma falácia, no melhor dos
casos, ou uma baita mentira, no pior.
Sergei
Soares acaba de tomar posse como
presidente do Ipea, o que me anima a acreditar que ele, fiel à sua própria
constatação quando era apenas pesquisador, romperá a covardia acadêmica
predominante e esclarecerá que não existe a tal queda da desigualdade, salvo,
talvez, entre assalariados.
Para
que se tenha uma ideia aproximada de a quanto pode chegar o aumento do patrimônio
(riqueza) de quem o tem, cito dados dos EUA no primeiro trimestre: o valor dos
bens imobiliários teve aumento de US$ 759 bilhões (R$ 1,7 trilhão).
Não
sei se há dados a esse respeito no Brasil, mas todos sabem que os imóveis
tiveram uma bela valorização ultimamente. Duvido que o pessoal que depende do
Bolsa Família (e são um quinto dos brasileiros aproximadamente) tenha tido
valorização patrimonial parecida, se é que patrimônio tem.
Portanto,
a afirmação da presidente de que todos progrediram, mas os pobres progrediram
mais que os mais ricos, não passa de chute sem nenhum parentesco com os fatos.
crossi@uol.com.br
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