09
de junho de 2014 | N° 17823
CÍNTIA
MOSCOVICH
O SIMPLÓRIO E AS
ESTRELAS
Recebi
um vídeo no qual um rapaz de seus 40 anos, microfone que parece de brinquedo
junto ao rosto, fala a uma plateia lotada. Trata-se de uma palestra , digamos, motivacional, dirigida a gente
que quer se dar bem nos negócios ou que acaba de levar um fora da namorada –
tanto faz. O rapaz em questão é um desses gurus que acreditam ter inventado a
roda e que pretendem ajudar as pessoas na busca “daquilo que realmente
importa”. Didático, ele divide o mundo entre os que são como Gandhi ou como Eike Batista.
Ao
mesmo tempo em que o vídeo ceifava minhas esperanças de um mundo melhor, me
caía nas mãos A Culpa É das Estrelas, do americano John Green. O livro, que
fala de câncer, está há 62 semanas no topo dos best-sellers, com 1,5 milhão de
exemplares vendidos. Sem nem ler a primeira página , antecipei o conteúdo: o desespero diante
do diagnóstico, lições para enfrentar a rádio e a quimioterapia e, lógico,
aquela enxurrada de insights que a doença
proporciona – e que só deveria interessar a quem os tem. Pensei que o
tal do videozinho e o livro deveriam se casar e viver felizes para sempre no
Reino do Simplório.
No
entanto, o livro não era nada daquilo. Hazel Grace, a protagonista, já está em
estágio avançado da doença, sobrevivendo graças a uma nova droga (que, lastima
o autor, não existe de verdade). Ciente de que sua vida está por um fio, a
menina vive assombrada, mas evita queixas para não massacrar seus pais. Com
direito à depressão e a crises de falta de ar, Hazel tem que
carregar um tubo de oxigênio onde quer que vá.
Alentada
por tiradas de um humor meio desconcertado e cru, cheio do pasmo que o câncer
desperta, ela conhece Augustus Waters, jovem em remissão de um osteossarcoma.
Romance à vista, claro. Mesmo que o desfecho para eles dois – para todos – seja
conhecido, a gente fica torcendo para que consigam fazer tudo o que ainda falta
fazer. Meio aos trambolhões, consumam o amor, viajam e se divertem, perfazendo
uma iniciação afetiva incomum. Uma graça.
A
Culpa É das Estrelas não é autoajuda, não traz mensagem edificante, não divide
a humanidade em isso ou aquilo. O filme
baseado no livro acaba de estrear e espero que se mantenha fiel ao
espírito de Green: contar uma história na qual a morte é tratada de frente, sem
facilitações ou reduções, mas com uma qualidade de afetos que consola. No fim,
isso deve ser mesmo tudo o que realmente importa.
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