Por cidades mais "caminháveis"
Só se conhece verdadeiramente um lugar caminhando. Estima-se que uma pessoa saudável percorra, em média, 1,2 metro por segundo a pé. A velocidade reduzida ajuda o pedestre a voltar a enxergar a cidade ao redor, em todos os detalhes, belos e sórdidos, imperceptíveis da janela do carro.
Caminhar é um ato ancestral cada vez mais raro, solapado por uma urgência sem sentido. "Time is money", reluz o letreiro em neon piscando no alto de nossas cabeças. É preciso produzir, ganhar dinheiro, ser bem-sucedido. Se você for caminhando, esqueça: não haverá a tempo. Vá de carro. E fique preso no congestionamento.
Invejo os franceses, que têm até um termo para designar o caminhante sem destino, andarilho errante. Le flâneur. Nada mal "flanar" em Paris, perambulando nos grandes bulevares. Não estou na Cidade Luz, mas faço gosto de palmilhar as ruas nem sempre alegres de Porto Alegre (fotos). Tem lá seu charme.
Mover as pernas tornou-se algo tão importante nesse mundo de ponta-cabeça que, nas pesquisas de mobilidade urbana, ganha força um conceito de nome engraçado: "caminhabilidade", tradução de "walkability", em inglês.
Um dos primeiros estudos sobre o tema é do início dos anos 1990. Foi produzido por um canadense chamado Chris Bradshaw, em Ottawa. Desde então, a ideia se espalhou. Aqui, também temos um Índice de Caminhabilidade. O iCam foi lançado em 2016 pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil), em parceria com uma série de pesquisadores. Composto por 15 indicadores, o índice ajuda a medir as condições do espaço urbano pela ótica de quem anda.
Não basta querer: é preciso se sentir seguro para caminhar e, no mínimo, ter calçadas decentes, com acessibilidade - afinal, todos temos os mesmos direitos. Há cidades onde isso é prioridade. Dê um Google em Hamburgo, na Alemanha, por exemplo. A urbe decidiu, ainda em 2014, tirar os carros das ruas em 20 anos. Veja o caso de Berlim, que criou uma legislação exclusiva para pedestres.
Estamos milhares de quilômetros atrás nessa caminhada, retardatários comendo poeira e fumaça de veículos movidos a combustíveis fósseis. Mas é bom nunca esquecer: andar é de graça, é ecológico, é democrático e faz um bem danado. Mudar essa realidade depende de nós.
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