sábado, 15 de julho de 2023


15 DE JULHO DE 2023
CRISTINA BONORINO

INÉDITO

Em geral, buscamos o inédito. A novidade traz uma excitação, uma promessa de aventura, de novas experiências. Na maioria das vezes, é a força motriz para o trabalho que nós, cientistas, fazemos diariamente. Mas, de vez em quando, uma conjunção de fatores inéditos pode - e deve - causar preocupação. E sugerir cautela. Como na última semana, em que o planeta atingiu a maior temperatura média já registrada: 17.23ºC. E havíamos tido o junho mais quente já visto.

Nesta época do ano é verão no Hemisfério Norte e inverno no Sul. Normalmente é o período em que as temperaturas mais altas são atingidas no planeta - embora a gente jure que seja durante o verão em Porto Alegre. Mas mesmo nós sentimos o impacto dessas temperaturas aqui. Maio, junho e julho foram extremamente brandos, com dias quentes mesmo. E as ameaças de ciclones e chuvas foram realmente o problema neste nosso inverno.

Você deve ter ouvido falar que as temperaturas dos oceanos também têm alcançado picos inéditos. E o El Niño, um fenômeno recorrente que aquece o planeta em ciclos, retornou. Nunca antes tivemos o El Niño simultaneamente às temperaturas mais altas do planeta e os oceanos já tão quentes. Em abril, a temperatura média dos oceanos alcançou 21.1ºC - a mais alta já registrada. A elevação das temperaturas dos oceanos é maior no Hemisfério Norte - até porque ela é resultado de fatores muito conectados com a atividade industrial humana. Os oceanos absorvem esse calor gerado na Terra - sabemos como são brandas as temperaturas de áreas costeiras. Quanto mais quente, menos eles conseguem absorver o calor. E, com esse aquecimento, está o El Niño deste ano, esquentando mais os oceanos, empurrando correntes de ar equatoriais para o Oeste. Ele é equilibrado pelo La Niña, que traz águas mais frias e profundas para o Leste. E ano passado saímos de três anos de La Niña.

Em junho, o El Niño pode ter sido desencadeado por ventos anômalos que se originam no Pacífico Norte, como acreditam alguns cientistas, como a oceanógrafa Regina Rodrigues, da UFSC. E essa "manta" de água quente que cobre hoje os oceanos gera um calor que é preso pelo efeito estufa dos gases liberados pelas atividades industriais e urbanas. A conjunção inédita de fenômenos pode trazer temperaturas ainda mais altas - uma vez que o El Niño recém iniciou. Isso, claro, impacta todo o planeta. Mas em algumas áreas será mais crítico.

Há anos o cientista Carlos Nobre, hoje na USP, adverte sobre os impactos climáticos de diferentes percentuais de destruição da Floresta Amazônica. Segundo ele, se 20% da Amazonia for perdida, a temperatura global pode subir até mais 2.4ºC. Hoje, já foram perdidos 17% da floresta. Degelos massivos - e inéditos - na Groenlândia e na Antártica fizeram o nível dos oceanos subir gradualmente, afetando toda a vida marinha e as áreas costeiras. O que mais precisa acontecer para que leis e políticas públicas sejam modificadas em cada cidade do planeta?

CRISTINA BONORINO

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