quinta-feira, 3 de dezembro de 2015



03 de dezembro de 2015 | N° 18374 
DAVID COIMBRA

O lado bom do pedido de impeachment

Aquele filósofo polonês, Bauman, diz que o nosso mundo moderno é um mundo líquido. Quer dizer: tudo é volúvel e fugidio como a água.

Essa abertura de processo de impeachment contra Dilma mostra que a política brasileira é mais instável do que se fosse líquida. A política brasileira é gasosa. Ou, pelo menos, tornou-se gasosa.

Há vinte e poucos anos, o impeachment de Collor, ao contrário, foi um processo sólido. Foram criadas condições políticas, sociais e legais para o ato. O movimento em direção ao impeachment era quase que inevitável e seu resultado totalmente previsível.

O processo de impeachment de Dilma, não.

Em primeiro lugar, está claro que a aceitação do pedido pelo presidente da Câmara é um ato de vingança. Eduardo Cunha perdeu o apoio do PT no enfrentamento de suas próprias dificuldades com a Justiça, e deu o troco. Ele nega, mas todos nós sabemos que é assim.

Quer dizer: trata-se de mesquinharia, de mera disputa de interesses. Do velho jogo do poder. Isso torna o pedido do impeachment inconsistente em si mesmo? Não.

Porque foi feito por juristas importantes, acavalados no tal “notório saber”: Hélio Bicudo, Miguel Reale Junior, Janaína Paschoal e Flávio Costa. Mais: eles se basearam, entre outros pontos, num parecer oficial do Tribunal de Contas da União. Logo, juridicamente o pedido deve estar bem sustentado.

Isso significa que o impeachment de Dilma será aprovado? Não.

Porque, para um pedido de impeachment ser aprovado, não basta haver condições técnicas e jurídicas. O julgamento do impeachment é feito no parlamento. Isto é: o julgamento é político. Sendo político, está sujeito à pressão da sociedade, à influência das mobilizações populares, aos humores dos dias.

E chegamos agora à nossa única certeza: durante o tempo em que esse processo for discutido, nada mais se fará no país. Todos, em toda parte, estarão se mobilizando, discutindo e se posicionando contra ou a favor da permanência de Dilma.

Que lado será mais forte e se mobilizará mais? Que lado levará mais gente às ruas? Que lado exercerá mais pressão sobre os políticos?

Aí estão mais perguntas sem respostas. Que Dilma é uma presidente impopular, isso é evidente. As pesquisas o mostram. Mas o desgaste do governo será suficiente para tirar os insatisfeitos de casa e levá-los em massa às ruas? Talvez sim, talvez não.

Tudo é impreciso. Tudo é líquido. Mas há um dado alvissareiro nessa questão aflitiva. Um só: depois de resolvido o caso, com Dilma saindo ou Dilma ficando, Dilma sairá ou Dilma ficará.

E ponto. E chega de discussão. E vamos começar, enfim, a tocar o país.

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