segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024


12 DE FEVEREIRO DE 2024
OPINIÃO DA RBS

OPINIÃO DA RBS

Indivíduos e instituições

A investigação da Polícia Federal (PF) que lastreou o desencadeamento da Operação Tempos Veritatis trouxe novos detalhes que permitem compreender melhor a participação de militares da ativa e da reserva nos planos para conspurcar a democracia no Brasil, antes e depois das eleições de outubro do ano passado. Evidências reunidas no despacho do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, como mensagens trocadas pelos envolvidos na trama e o vídeo na íntegra da reunião ministerial de 5 de julho de 2022, são peças essenciais para perceber que o país esteve, de fato, à beira de uma ruptura.

Um dos aspectos mais relevantes dos elementos colhidos e agora tornados públicos é o envolvimento de membros das Forças Armadas em serviço na maquinação antidemocrática. Sim, existiam oficiais graduados da ativa que eram entusiastas de um golpe e atuavam para uma sedição. Baseavam-se em teorias conspiratórias amplamente desmentidas acerca da lisura do processo eleitoral. 

Entre essas figuras proeminentes, como apontam as investigações, estaria o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, um dos alvos da operação deflagrada na quinta-feira. Uma minoria do Alto Comando do Exército (ACE) também topava embarcar na nau golpista, indicam as informações existentes, também apuradas pela imprensa ainda no ano passado.

Deve-se sublinhar, no entanto, que ao fim as Forças Armadas, como instituição, resistiram e permaneceram fiéis à Constituição, ao legalismo e ao seu papel profissional de organização a serviço do Estado brasileiro, e não do governo de ocasião. As negativas definitivas aos propósitos pessoais e políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro, sabe-se, vieram dos então comandantes do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Junior. Ainda poderá ser melhor examinado, no futuro, por quais razões ambos rechaçaram pressão, se por convicção, pela inviabilidade de uma ação ou por receio com as consequências inimagináveis na vida do país ocasionadas por uma virada de mesa. 

Mas o importante é terem tomado a decisão correta. A sequência de acontecimentos indica que os conspiradores, após o fracasso do plano inicial, começaram a preparar o ambiente que culminou com a arruaça violenta de 8 de janeiro de 2023.

O basilar é registrar que, ao cabo, as Forças guardaram uma posição de respeito à ordem democrática, mesmo depois de sucessivas tentativas de Bolsonaro e seu núcleo militar de cooptá-las. Passagens a ilustrar essas investidas não faltam. Basta lembrar a demissão do então ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, em 29 de março de 2021, que ao se despedir não deixou de ressaltar: "Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituições de Estado".

É preciso separar os indivíduos das instituições. As pessoas físicas de farda que tomaram parte da organização de um golpe devem ser investigadas e responder por seus atos conforme a lei, com direito à ampla defesa e o devido processo legal. Ao fim, serão condenados ou absolvidos. É o esperado para qualquer país que pretende ser considerado sério. A instituição, no entanto, deve ser preservada. 

O episódio tem ainda de servir para fortalecer no meio militar os princípios da hierarquia, da disciplina e da submissão à democracia e ao poder civil. O Brasil, ao longo de sua história, viveu vários momentos de ruptura engendrados por militares. O amadurecimento institucional do país não permite mais a quebra da ordem institucional. Os acontecimentos recentes devem prestar para enterrar de vez o mito da tutela militar.

O país pode ir além das punições aos indivíduos para reforçar o comprometimento das Forças Armadas com a sua missão profissional. Tramitam no Congresso duas propostas de emenda à Constituição (PECs) que colocam novos obstáculos para fardados se imiscuírem na política. Uma impõe mais dificuldades para a candidatura de membros da ativa e outra impede que exerçam cargos de natureza civil na administração pública. É um debate necessário e, se bem enfrentado, capaz de contribuir para elevar o crédito das Forças Amadas junto à sociedade.

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