18 DE MARÇO DE 2019
DAVID COIMBRA
O que faz a infelicidade
Como as pessoas são infelizes. Como as pessoas sofrem. É assustador. Sobretudo porque a infelicidade não produz apenas a desventura do indivíduo que dela padece: pode afetar os outros, no entorno, e até quem ele nem sequer conhece.
Tome o caso da chacina de Suzano. Mas não olhe para as vítimas, olhe para os assassinos. Eram dois jovens, um de 17 anos, outro de 25. Eles saíram de casa para matar, sim, mas também saíram para morrer.
Há algo de muito errado aí. Algo de muito antinatural.
Os jovens, ainda que tenham seus problemas, e eles os têm, e não são poucos, os jovens cultivam sempre expectativas com o futuro. Os jovens acreditam que tudo de bom pode lhes acontecer. Os jovens, se são saudáveis de corpo e mente, anseiam pelos dias que virão.
Que vida miserável deviam levar os dois matadores de Suzano para fazer o que fizeram. Que tormento insuportável foi esse que os transformou em monstros e os levou inclusive ao suicídio. Como deviam sofrer!
O mais preocupante é que não existe remédio físico que possa curar tal doença. Não é a pobreza a causa da infelicidade. A pessoa pode ser rica, famosa, bela e realizada, e mesmo assim viver brutalmente, visceralmente infeliz. Não é nem o amor o antídoto contra a infelicidade. Mas o amor pelo menos dá uma garantia: pessoas que são amadas não tentam produzir a infelicidade alheia como os assassinos de Suzano. Pessoas amadas, se são infelizes, mortificam-se em particular.
O que, então, gera a infelicidade?
Se você examinar com mais critério os monstros de Suzano, bem como outros tantos, como o que matou 50 pessoas na Nova Zelândia, verá que eles cometeram monstruosidades esperando que elas dessem sentido às suas vidas. Os assassinos de Suzano queriam se tornar heróis em seu meio sombrio, hospedado em escaninhos da internet profunda. O da Nova Zelândia queria "limpar" o país de imigrantes muçulmanos.
A intenção é a mesma: fazer com que a existência tenha justificativa. É a busca de algo maior do que o sucesso e o dinheiro, algo maior até do que o amor, algo transcendente e impalpável. É a busca pelo sentido da vida.
Eis a nossa grande desgraça. Eis a nossa danação. Todos os outros seres vivos do planeta existem por existir, e nada mais. Mas nós temos consciência da nossa existência. Nós perguntamos: por quê? Por que estou vivo? Qual é o significado disso?
Há quem procure as respostas na religião, na filosofia ou na psicanálise, há quem adote uma causa, há quem carregue bandeiras, há quem se entregue a prazeres. Mas talvez tudo seja mais simples. Talvez você tenha tão somente de viver bem o seu dia. Aproveite o dia, ensinava o velho poeta Horácio.
De fato, um dia em que você fez coisas boas para você e para as outras pessoas, um dia que começou alegre e terminou em paz, esse dia fez sentido em sua vida. E uma vida feita de dias que fizeram sentido é uma vida que tem sentido.
Não é a sorte grande que lhe trará felicidade. São os pequenos deleites de cada hora. O sorriso do seu filho, o beijo da mulher amada, o telefonema da mãe, o abraço do amigo, uma boa refeição. É terminar o dia com um pouco de cansaço, sentir as pálpebras pesadas, deitar a cabeça no travesseiro e suspirar: foi um dia bom. Tudo de que precisamos é um dia bom.
DAVID COIMBRA
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