sexta-feira, 14 de dezembro de 2018



Espírito natalino 

Então é Natal e, tal como na imortal canção de John Lennon, perguntamos o que fizemos. A história do nascimento de Jesus Cristo e da cristandade segue linda, inspiradora e vai permanecendo há milênios como um dos maiores patrimônios da humanidade, de todos os seres humanos. Poucos escritores teriam escrito uma narrativa tão comovente. Uma velha história diz que o mais importante foram os mandamentos trazidos pelo patriarca Moisés, que recebeu de Deus as tábuas. 

Dizem que Deus queria cem mandamentos e nosso bom Moisés conseguiu que fossem só dez. A gente sabe quem sem leis não há seres humanos e sociedade. Boa parte das pessoas entende que o mais importante é Jesus Cristo e o amor que ele pregou. Uns reclamam que não se pode amar muitas pessoas e muito menos todas, que não se deve oferecer a outra face e que o ser humano é o que é. 

Há os que pensam que, ao fim e ao cabo, o dinheiro seria o mais importante e que Marx teria tocado no cerne da questão humana. O tema segue em debate e o mundo segue dando suas voltas. Algumas décadas depois, Sigmund Freud, com a psicanálise e a descoberta do inconsciente, revelou que talvez o mais importante para os humanos fosse o sexo, fonte de alegria, prazer, preocupações, vida e morte. O sexo desde a tenra infância. 

Seguindo a história, dizem que Albert Einstein, o genial criador da teoria da relatividade, teria dito que, em realidade, não há uma coisa mais importante que a outra, e que leis, cabeça, coração, dinheiro e sexo estão pós-modernamente embolados, tudo muito relativo. Os escritores de best-sellers sabem há muito que as pessoas se interessam, principalmente, por amor, sexo e poder, tantas vezes mesclados com crimes, espiritualidade, História e magias. 

Num mundo tão complexo, cheio de novidades a cada segundo, em ritmo hipercinético supersônico e lotado de seres múltiplos, dotados de várias personalidades, em cento e tantos países, realmente está tudo misturado. Einstein falou e disse. A letra do lendário tango Cambalache, composta em 1934 por Discépolo, aliás, já tinha cantado a pedra. 

Vivemos entre a razão e a doideira e a mistura cambalacheante. Claro, há os que buscam o bom senso, valores clássicos, um equilíbrio possível, um mundo mais harmônico e pacífico. Ainda bem que são muitos. Bons valores e virtudes caem bem e, na história da humanidade, entre as aberturas e as fechaduras das sociedades, a coisa sempre foi assim. 

Abre, solta, fecha, abre de novo, velhas novidades, utopias e distopias, nada de muito novo sob a luz do sol, a não ser o sol, que é novo toda manhã e não cansa de brilhar, nos aquecer e depois tirar uma soneca, não sem antes dar aquele espetáculo no entardecer diário, com entrada franca. 

O sol não pode viver perto da lua, decretou o samba perene do Nelson Cavaquinho. Então é Natal, não podemos deixar o samba morrer. Espírito natalino vem bem. 

A propósito... 

Concordo com um dos meus ídolos, o escritor israelense Amos Oz: na vida podemos amar poucas pessoas, a família, amigos mais próximos. É complicado, talvez impossível, amar e abraçar todo mundo, como Jesus Cristo. 

Mas é preciso, nesse planeta cheio de indivíduos solitários, egoístas, tecladictos e preocupados em excesso com seus egos, suas tribos, suas identidades e seus gêneros, procurar solidariedade, compaixão, respeito democrático ao outro e ideias diferentes. É pensar em direitos humanos, direitos das pessoas, dos cidadãos e buscar o melhor possível em termos do coletivo. É difícil, a gente sabe, mas no Natal o mínimo a fazer e pensar nisso. E fazer o melhor. (Jaime Cimenti) - 

Jornal do Comércio (https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/colunas/livros/2018/12/660998-resgate-realidade-e-ficcao.html)

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