quinta-feira, 27 de dezembro de 2018



27 DE DEZEMBRO DE 2018
NÍLSON SOUZA

O NÚMERO DA PIA

Somos ruins em matemática, como mostram os testes de avaliação escolar, mas levamos fé na numerologia. Tanto que de vez em quando um artista brasileiro acrescenta outras letras ao próprio nome, ou suprime alguma sílaba, acreditando que assim passará a contar com vibrações mais favoráveis. Quando se trata de investir na sorte, como nessa Mega Sena da Virada que a cada ano nos acende o desejo e a cobiça, o que não falta é imaginação e criatividade na busca das dezenas certeiras. Vale tudo, da data de nascimento ao número da sepultura da bisavó, passando por telefone, placa de carro, endereço antigo e até boleto de conta. O sujeito paga contrariado, mas anota o número para dar o troco no destino.

Outro dia chamei um encanador para consertar o vazamento da pia da minha casa. O homem ficou meia hora embaixo do balcão e, quando saiu de lá, abriu um sorriso de satisfação.

- Parou de pingar? - perguntei.

Respondeu com outra pergunta:

- O senhor me consegue uma caneta?

Pensei que ia improvisar uma ferramenta ou riscar a parte do cano a ser substituída. Que nada! Ele simplesmente anotou uns algarismos na palma da mão e só então me explicou:

- Encontrei um número escrito embaixo da pia. Vou jogar na loteria.

O vazamento não cessou totalmente, mas já desisti de ligar para o número do telefone que o prestador de serviço me deixou. Dá sempre na caixa. Espero que não se tenha tornado milionário por conta de um trabalho malfeito.

O mais estressante do hábito de apostar em números é a repetição. Se o apostador cai na armadilha da teimosinha, nunca mais se livra. Ou passa a viver sobressaltado:

- Bah, esqueci de jogar. E se der os meus números?

É melhor nem conferir no dia seguinte. Também não deixa de ser peculiar essa apropriação de números que, afinal, são de todos. Mesmo os nossos registros mais pessoais expressos em números acabam sendo de domínio público. Qualquer um pode jogar nosso aniversário, nosso endereço e até aquela única lembrança da nossa bisavó. Por isso, talvez, essa busca constante de um número original por parte de jogadores inveterados.

O número achado ao acaso sob uma pia, por exemplo. E já que usei esse exemplo, tratei de conferir, para poder compartilhar com meus leitores que ainda não apostaram na Mega: 0389. Misturando, invertendo e fazendo combinações, podemos extrair daí as seis dezenas sonhadas.

Cáspite!, como diz Dom Sabino. Agora terei que jogar esses números também. Menos mal que ainda dá tempo.

NÍLSON SOUZA

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