quarta-feira, 1 de maio de 2024


01 DE MAIO DE 2024
CARPINEJAR

Rodrigo e Bibiana barrados no Municipal

Eu já tirei várias fotografias na escadaria interna do Theatro Municipal de São Paulo, um dos postais da capital paulista. É um costume de todos os turistas que passam pelo templo arquitetônico inspirado na Ópera de Paris, inaugurado em 1911, encravado na Praça Ramos de Azevedo. Aquele lugar exala história e cultura. Lá eclodiu a Semana de Arte Moderna, o marco inicial do modernismo no Brasil. Lá lendas se apresentaram, como o tenor italiano Enrico Caruso, o bailarino russo Rudolf Nureyev e a diva do jazz americano Ella Fitzgerald.

Mas um casal de Camaquã foi barrado e constrangido a não fazer selfies no local por "usar fantasia". Na verdade, Wendell Coelho e Pati Viegas vestiam a pilcha, a nossa roupa tradicional. O episódio ocorreu no último sábado.

Eles não portavam equipamento profissional que pudesse depender de autorização, como câmera, refletores e rebatedores, somente seus celulares.

Para entrar no recinto, suportaram a fila pacientemente, entre ingleses, americanos e brasileiros, muitos com camisetas de futebol. Quando se dirigiam para a aguardada pose no tapete vermelho, estendido em glamourosos degraus, receberam a interceptação de funcionária:

- Não pode fazer fotografia com fantasia. Wendell tentou argumentar: - Não é fantasia. Você não viu o BBB? O vice-campeão Matteus Amaral circulava na casa com a vestimenta. - Aqui é uma fantasia! - ela rebateu.

A questão é que o casal formado pela prenda típica e o bagual de bombacha, para o desconhecimento regional dos funcionários do saguão, não estava produzindo um book fantasiado. Registrava simplesmente a sua passagem por São Paulo, na condição de gaúcho, assim como fez em Salvador, Rio de Janeiro e Ouro Preto, lugares que visitou antes sem nenhuma censura ou estranhamento.

A indumentária não era um figurino de época, com peças do cabide da minissérie O Tempo e o Vento. A dupla não reencarnava o capitão Rodrigo Cambará e Bibiana Terra, célebres personagens de Erico Verissimo.

Exibia roupas praticadas no Estado, comuns em qualquer cidade da Campanha, roupas que até viraram decreto de lei, alçadas ao patamar de "traje de honra e de uso preferencial no Rio Grande do Sul" pela Lei 8.813, de 1989, da Assembleia Legislativa do Estado. Um dos artigos, inclusive, admite o seu emprego em substituição aos ternos escuros e vestidos longos de festa em atos oficiais.

A restrição intempestiva e desinformada não faz jus a uma abordagem oficial na capital mundial do multiculturalismo. Wendell e Pati são um orgulho de nossas raízes. Ficaram em segundo lugar no Festival Internacional de Folclore, Rimini Fest, na Itália, em junho de 2023 (somente atrás de um dueto da Ucrânia), com uma coreografia que reunia vários ritmos gaudérios: xote, chico sapateado, milonga, chamamé.

Tanto que aproveitaram o giro pelo mundo para dançar em pontos turísticos de nove países da Europa e divulgar o tradicionalismo.

Enquanto realizavam a versão nacional de suas andanças de bota e sapatilha, houve esse sobressalto. Eu fico imaginando: e se o par começasse a dançar chula no Theatro Municipal? Seria preso?

CARPINEJAR

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