segunda-feira, 12 de maio de 2025



12 de Maio de 2025
CARPINEJAR

Meu filho Vicente chamou um Uber: Uber Black. É para ser a melhor categoria do aplicativo. Íamos do bairro Petrópolis ao Moinhos de Vento.

Estávamos em quatro pessoas: eu, a esposa e os dois filhos adultos, devidamente arrumados para um aniversário. Fiz menção de me sentar na frente, e a porta não abria. Fiquei segurando em vão a maçaneta. Achei que estivesse estragada.

Questionei o motorista: - Posso ir na frente? Ele respondeu: - Só atrás. Não entendi.

Éramos quatro. Não teria cinto atrás para todos.

Além disso, com o táxi, sempre vou na frente. Evito me sentir levado por um chofer. Não me cai bem a ideia de mordomia e realeza, de criar um fosso de formalidade e hierarquia no trajeto. Prefiro o contato direto, igualitário, humano. Assim também posso colaborar com o caminho, compartilhando o horizonte da direção.

Ele nos obrigou a ir sem a segurança do cinto, o quarteto apertado, com as pernas encolhidas, amassando os trajes - enquanto, na frente, não havia ninguém. Para piorar, o Vicente tem mais de 1,80m. Suas pernas, imensas, não eram dobráveis como cadeira de praia.

Na época da covid, eu atendia à restrição. Hoje, ela não se justifica. Não existe nenhuma norma da Uber. É uma escolha só do condutor.

Será resultado da violência? Medo de assalto? Ou de assédio? É um desdobramento de algo que desconheço? Eu realmente gostaria de saber. Não parece ser um trauma ocasional. Aquele motorista, em questão, apenas explicou que tinha seus pertences ao lado. Não foi uma desculpa convincente.

Espiei o que ocupava o banco: térmica e chimarrão. Poderia guardar a mateira no porta-malas sem complicações, convenhamos. Aliás, os azuizinhos sequer permitem dirigir tomando mate. Ficou um climão, um mal-estar generalizado. Qualquer pergunta geraria conflito. O prestador de serviço simplesmente tirou um assento do seu sedan, que virou uma carruagem.

Você seleciona Uber Black para desfrutar de comodidade, gasta mais pelo conforto, para não se ver espremido como numa lata de sardinha.

Eu estava ideologicamente encurralado como pai. Na hipótese de comprar briga, meus filhos se mostrariam chateados. Já imaginava a queixa: "é sair com o pai que ele arma escândalo". Na hipótese de silenciar, eles me considerariam omisso. Também fantasiei a reprimenda: "na hora do enfrentamento, você some".

Perdi a credibilidade na viagem, pois me defini pela segunda opção e não fiz nada, covardemente. Aguentei no osso o deslocamento, suportando a pequena e provisória injustiça. Aconteceu essa primeira vez, deixei passar. Aconteceu uma segunda vez, perdoei. Mas, na terceira ocorrência, já notei uma tendência inadequada.

Num dos casos, o motorista mantinha uma Bíblia na carona. Será que Deus não cederia seu lugar? Não bastaria guardar a Palavra Sagrada no porta-luvas?

Foram exceções de um grupo de profissionais que não medem esforços para agradar, mesmo não sendo tratados como merecem, rodando o dia inteiro para suprir a cota do mês, compensando o valor baixo das corridas pela quantidade.

Bem compreendemos que a plataforma retém grande parte do percentual - até cerca de 25%, dependendo das variáveis, como promoções e tarifas dinâmicas. Se contarmos taxas adicionais, como custos fixos e de reserva, é capaz de faturar metade do total pago pelo passageiro.

Ser motorista não é uma vocação fácil. Exige empatia, conversa, discernimento das diferenças e das mais diversas necessidades. Abrir a porta do carro é o equivalente a receber o outro em sua casa.

É lidar com os inconvenientes de quem não quer seguir o Waze, de quem se incomoda com a estação do rádio ou com a música, com ar ligado ou desligado, de quem pede para esperar em locais proibidos.

Não protestei por compaixão: preocupa-me alguém trabalhar sob sol e chuva com esse receio de quem entra no veículo. É atuar sob o jugo do terrorismo psicológico. É temer o próprio público. É uma desconfiança que não ajuda ninguém. 

CARPINEJAR

12 de Maio de 2025
CLÁUDIA LAITANO

Rubicão eclesiástico

Levei um susto quando um certo Pierbattista Pizzaballa apareceu nas bolsas de apostas para a sucessão do papa Francisco. O motivo do espanto não era o sobrenome que lembra uma telentrega de pizzaria (como bem observou um amigo gaiato), mas o fato de o cardeal de Jerusalém ter nascido em 1965, ou seja, um ano antes de mim.

Teríamos sido colegas de colégio, se por acaso ele tivesse estudado no Rosário, e talvez até bebido nos mesmos bares da Oswaldo, se, vai saber, ele costumasse frequentar a noite porto-alegrense antes da ordenação. A escolha de Robert Prevost, nascido em 1955, adiou um pouco este notável marco histórico - um papa da minha idade - mas não muito. Mesmo sem Pizzaballa, nossa geração acaba de atravessar o Rubicão eclesiástico.

À medida que os anos passam, vamos nos dando conta de que os aniversários, os nossos e os dos outros, são apenas os marcadores mais previsíveis da passagem do tempo. A partir de certa idade, percebemos o adiantado da hora a cada minuto do baile sem precisar olhar para o relógio ou ouvir o galo cantar. 

Vemos o tempo passando no repertório cada vez mais alentado de dramas e comédias de que fomos e somos testemunhas e na complexa matemática dos projetos para o futuro que cabem numa expectativa realista de longevidade, mas também nas diferentes versões da cidade que se acumulam na nossa memória, nos artistas que vão e que vêm (para a glória ou para o esquecimento), nas mobílias das casas, nos humores da moda, no mercado das ideias, nos maneirismos da linguagem. Para onde se olhe, há um Carbono 14 anunciando nossa data de fabricação.

As honrarias que costumamos associar com a última cereja sobre o merengue da existência fazem parte dessa lista de sinais. É uma novidade tão velha quanto a Humanidade, mas sempre nos pega de surpresa. Como assim um papa que nasceu com o rock? Como assim uma Nobel de Literatura que não era nascida quando o homem pisou na Lua?

Não é só uma questão de ficar mais velho, o que, no plano miudinho da vida de cada um, já é uma enormidade, mas de começar a projetar, como geração, as marcas da nossa passagem pela História. Agora somos nós os adultos na sala, e a responsabilidade de fazer algo para diminuir a bagunça da casa nunca pareceu tão pesada - e tão inalienável. 

CLÁUDIA LAITANO


12 de Maio de 2025
OPINIÃO RBS

Opinião RBS

Esta série de editoriais contempla temas apontados como prioridade para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul por entidades da indústria, do comércio, do agronegócio e pelas bancadas estadual e federal de deputados em reuniões com o Conselho Editorial do Grupo RBS. Os temas abordados serão:

 Fundo constitucional do Sul

 Formação profissional e recuperação da Educação Básica

 Falta de mão de obra e impacto de benefícios sociais

 Inovação e expansão de centros de tecnologia

 Infraestrutura logística e contenção de cheias

 Valorização e consumo dos produtos gaúchos

 Relevância do agronegócio

 Bancada federal no Congresso

Educação, pilar do desenvolvimento

Não há base mais firme para erigir o desenvolvimento do que a educação. É dever insistir neste princípio. Ainda mais para o caso gaúcho, que pelo rápido envelhecimento da população tem jovens chegando ao mercado de trabalho. A demografia impõe um ensino de maior qualidade para forjar capital humano mais produtivo no trabalho e capaz de acompanhar as transformações tecnológicas.

Sabe-se há bastante tempo que o Rio Grande do Sul desgarrou das posições de liderança na aprendizagem no país. Chegou o momento de a sociedade gaúcha passar a uma reivindicação enérgica para que as promessas de melhoria nos indicadores da Educação Básica se materializem.

O Estado, por ter a maior rede, deve ser o primeiro a ser cobrado. Programas apresentados com pompa não faltam. Mas carecem de resultados. Convém acompanhar a evolução da agenda apresentada pelo governador Eduardo Leite em fevereiro, com estratégias pedagógicas e de gestão para os próximos 10 anos. A intenção é ter uma das três melhores notas do Brasil no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em todas as etapas. Em 2023, o Estado ficou entre a 9ª e a 11ª posição, dependendo da fase de ensino. É promissor ter objetivos ousados. Mas não basta tê-los. É preciso alcançá-los.

Outro desafio é a evasão no Ensino Médio. A taxa de 8,9% é três vezes a média nacional. O Piratini, na semana passada, apresentou uma nova ferramenta que utiliza inteligência artificial para detectar alunos com risco de abandono da sala de aula e intervir a tempo. Tem méritos, mas precisa apresentar efeitos, assim como os programas Pé-de-Meia (federal) e Todo Jovem na Escola (estadual), de incentivo financeiro para estudantes concluírem o Médio.

Merece atenção, também, o quadro constrangedor do ensino público de Porto Alegre. Teve o segundo pior Ideb entre as capitais em 2023. Em estudo da ONG Todos pela Educação, surgiu em último em português e em matemática no 9º ano do Ensino Fundamental entre 26 capitais e outras 20 cidades com mais de 500 mil habitantes. É deprimente a performance em matemática. Apenas 5,1% dos estudantes daquela série tiveram um desempenho considerado adequado na matéria. Está aí uma área do conhecimento que requer cuidado especial.

O ensino profissionalizante é outra modalidade de extrema relevância. É uma ponte entre escola e empresas. Estudantes saem com uma profissão e habilidades bastante valorizadas no mercado. A rede vinculada ao Estado tem cerca de 28 mil alunos, mas o Plano Decenal da Educação Profissional e Tecnológica prevê chegar a 116 mil matrículas até 2032. Parece uma meta inexequível, mas convém empenho para se aproximar dela o máximo possível.

Novas fórmulas precisam ser mais testadas, como a proposta do Sesi/Senai, detentor de uma rede de excelência, de receber estudantes do ensino público no contraturno. Os problemas de infraestrutura nas escolas, da mesma forma, podem ser solucionados com parcerias público-privadas. Resta claro que, insistindo nos mesmos métodos, os resultados não serão diferentes. _

OPINIÃO RBS


12 de Maio de 2025
COMÉRCIO INTERNACIONAL

COMÉRCIO INTERNACIONAL

Lula chega à China para ampliar trocas comerciais após tarifaço de Trump

Comércio internacional

Após a visita à Rússia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou no sábado na China, onde cumpre agenda até quarta-feira. A comitiva busca intensificar as trocas comerciais com o país asiático após o tarifaço dos Estados Unidos.

A avaliação é de que a guerra comercial deflagrada pelo governo de Donald Trump - que impôs tarifas de até 145% sobre exportações chinesas - é uma oportunidade para ampliar os embarques de produtos brasileiros, sobretudo no setor de agronegócio. Cerca de 40 acordos bilaterais estão em negociação e podem ser assinados.

Anúncios de empresas

A agenda de Lula inclui um seminário com empresários promovido pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), previsto para hoje. Amanhã, Lula deve se reunir com o presidente chinês, Xi Jinping, e participar do Fórum China-Celac (Comunidade de Estados Latino-americanos e do Caribe).

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, são aguardados diversos anúncios de investimentos de empresas chinesas no Brasil, incluindo a fabricante de semicondutores Longsys, o aplicativo de entrega Meituan e a rede de fast-food de sorvetes, chás e sucos Mixue. Outra que deve confirmar aportes no país é a Envision, especializada em energias renováveis.

Os investimentos podem somar US$ 17 bilhões. 


Papa já veio do Peru ao Brasil de ônibus

Estima-se que Robert Prevost já esteve ao menos quatro vezes no Brasil antes de se tornar papa Leão XIV, mas esse número pode ser ainda maior, pois neste cálculo não estão incluídas as viagens realizadas por ele ainda quando missionário da Ordem dos Agostinianos.

A visita mais antiga de que se tem registro de Prevost ao Brasil remonta ao início de 1992. Frei Márcio Antônio Vidal de Negreiros, atual secretário-geral da Organização dos Agostinianos da América Latina e Caribe (OALA), teve o primeiro contato com o Papa naquela ocasião.

- Aqui em Bragança Paulista, tínhamos a etapa de formação do noviciado. Em 1990, ele (o Papa) recebia estudantes em formação para a vida religiosa e para o sacerdócio, de vários países. E, em 1992, foi a primeira vez que ele esteve aqui, acompanhando um desses estudantes. Na época, eu morava em São Paulo e foi quando tive meu primeiro contato com ele, ao buscá-lo no aeroporto. É a primeira vez que temos registro dele no Brasil como frade agostiniano.

Depois disso, frei Márcio e frei Robert também trabalharam juntos em um encontro latino-americano de formadores da Ordem de Santo Agostinho, realizado em setembro de 1994.

Economias curtas e visitas oficiais

Frei Márcio relembra uma história curiosa: na década de 1990, um grupo de religiosos agostinianos do Peru precisava vir ao Brasil. Contudo, devido aos recursos financeiros limitados, saíram de ônibus do norte peruano rumo a Bragança Paulista, em uma viagem que durou cerca de três dias.

- São fatos que marcam a vida dele como religioso, missionário, e uma das experiências de sua vinda ao Brasil - contou à coluna.

Segundo o frei, há relatos daquela época de que, durante essa viagem, os "aventureiros" fizeram uma parada em Arequipa, onde, em um restaurante, o Papa comeu frango assado com batatas fritas.

Após seu trabalho missionário no Peru nos anos 1990, Robert Prevost retornou aos Estados Unidos e, posteriormente, seguiu para Roma, onde assumiu o cargo de prior-geral da Ordem dos Agostinianos, entre os anos de 2001 e 2013. Nessa função, veio ao Brasil em diversas "visitas de renovação".

- Em 2006, durante a beatificação do padre Mariano de la Mata, um frade agostiniano espanhol beatificado no Brasil, ele participou da celebração na Catedral da Sé, em São Paulo. Já em nossa província, em Belo Horizonte, em 2004, esteve na celebração dos 75 anos da nossa instituição, juntamente com os 70 anos do Colégio Santo Agostinho - relembra frei Márcio.

Há também registros de outras visitas, sendo as mais conhecidas em 2012 e 2013, durante a Jornada Mundial da Juventude. Frei Márcio lembra das noites culturais promovidas nesses encontros, nas quais frei Robert costumava participar:

- Já circulam vídeos nas redes sociais de uma noite de Natal em que ele canta Feliz Navidad, depois em inglês... Ou seja, são situações espontâneas, experiências muito humanas e fraternas.

"Vai ser difícil chamá-lo de Papa"

Frei Márcio esteve presente no Consistório de 2023 no Vaticano, quando Robert Prevost foi criado cardeal.

- Vai ser difícil chamá-lo de Papa, né? (risos). O frei Robert sempre foi uma pessoa um pouco mais reservada, é parte do seu caráter. Mas sempre foi alguém acessível, comunicativo, aberto ao diálogo. Um homem que aprendeu a viver em comunidade.

E guarda com carinho as experiências que viveu ao lado do, agora, Pontífice.

- Sempre foi muito próximo, sempre disposto a colaborar, participar e dar o seu melhor. E é isso que ele fará na Igreja nesta nova fase da vida, com a idade, a capacidade, o conhecimento, a sabedoria e a experiência de fé que adquiriu. O que importa para ele como Papa, e para nós como cristãos católicos, é ter um homem cheio de Deus, capaz de dar testemunho de sua experiência e conduzir os fiéis com sabedoria. Será um papa para o nosso tempo, alguém que saberá dialogar, promover a unidade e a comunhão. _

A escolha do nome

O novo papa explicou, no sábado, o motivo da escolha do nome: Leão XIV. Como já se suspeitava, a opção por esse título lembra o legado de Leão XIII, pontífice entre 1878 e 1903.

- O Papa Leão XIII, de fato, com a histórica Encíclica Rerum novarum, enfrentou a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial; e hoje a Igreja oferece a todos o seu patrimônio de doutrina social para responder a uma nova revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho - afirmou.

A declaração foi feita durante a sua primeira reunião com os cardeais:

- Vocês são os colaboradores mais próximos do Papa, e é um grande conforto para mim aceitar um jugo (desafio) que está claramente muito além das minhas forças.

Também destacou o legado de seu antecessor, Francisco. _

Biografia inédita do santo millennial

Nos últimos dias antes da morte do papa Francisco, Roma e o Vaticano estavam repletos de fiéis - principalmente jovens - preparados para a canonização de Carlo Acutis, beato italiano conhecido como o "padroeiro da internet". O evento, previsto para 27 de abril, foi adiado.

Agora, chega ao Brasil uma biografia inédita do santo millennial. Intitulada Carlo Acutis: sua Vida, seu Exemplo e seus Milagres (Minha Biblioteca Católica), a obra traz meditações do próprio beato, materiais encontrados em seu computador durante o processo de beatificação, além de relatos inéditos e um prefácio escrito por Antonia Salzano, mãe de Carlo. O texto original é de autoria de Marie & Jean-Baptiste Maillard.

O posfácio inédito do livro dedica-se ao milagre ocorrido no Brasil, que levou à sua beatificação: a cura de um menino em Campo Grande (MS). _

INFORME ESPECIAL 

sábado, 10 de maio de 2025



11/05/2025 - 15h35min
Martha Medeiros 

As mães mantêm o instinto que não as deixa esquecer que, no fundo, ainda somos suas garotinhas

Hoje darei voz às filhas de 50+, 60+, que há muito tempo cuidam sozinhas de si mesmas e agora têm que assumir a maternidade da própria mãe

Nós, que penteamos seu cabelo, que propomos um jogo de cartas e que fingimos escutar pela primeira vez uma história mil vezes repetida.

Semanas atrás, escrevi sobre um assunto de interesse de milhões de mulheres. Mergulhada nele também, o elegi como a nova questão a invadir as redes (menopausa, abra um espacinho aí). Trata-se de quando os papéis se invertem e os filhos passam a cuidar dos pais. Em tese, é a oportunidade para extrair mais amor da relação, mas a realidade não costuma dar essa colher para teses. O lado prático é que se impõe.

Hoje é dia delas, das nossas mães e das mães que também somos. É muita mãe para um domingo só. Escrevo colunas há décadas e já esgotei meu repertório de homenagens, então hoje darei voz às filhas de 50+, 60+, que há muito tempo cuidam sozinhas de si mesmas e agora têm que assumir a maternidade da própria mãe – também é muita filha para um único domingo. Sei que os pais deveriam entrar nessa equação, mas sendo um dia tão feminino, é para elas – nós – que escrevo.

Nós e nosso pânico quando surge “Mãe” escrito no visor do celular: é ela chamando, desconfiada de que tomou duas vezes o mesmo medicamento. É ela avisando que a janela está emperrada e é preciso chamar alguém para consertar (já foi consertada semana passada). 

É ela dizendo que não encontra o casaco azul que tanto gosta (um dia encasquetou que azul não lhe caía bem e passou o agasalho adiante). É ela certa de que tem gente estranha no quarto ao lado (é a cuidadora).

Todos no lucro: ela não levou nenhum tombo no banheiro, que é a notícia que nós não queremos escutar. Nós, que temos que lembrá-la de que as mensagens publicitárias do WhatsApp não precisam ser respondidas. De que nhoque sempre foi seu prato preferido, por que a implicância agora? De que sábado foi ontem, e hoje não tem novela.

Nós, que a incentivamos a passar um batonzinho, a velhice não precisa cancelar a vaidade. Que temos que dar o braço para ela caminhar do sofá até a cozinha. Que a levamos ao cinema e nos emocionamos ao ver seus olhos brilharem diante da tela, mesmo ela tendo reclamado, ao final, que o filme foi muito longo.

Nós, que tentamos fazê-la desistir de usar um tricô já manchado pelo tempo (ela quer poupar os novos). Nós, que penteamos seu cabelo, que propomos um jogo de cartas e que fingimos escutar pela primeira vez uma história mil vezes repetida. 

Nós, que nos afligimos quando temos que viajar, que nos culpamos a cada afastamento e que torcemos para que ela não nos ligue no exato momento em que o avião estiver aterrissando – mas é bem nessa hora que ela liga, ela pressente que estamos voltando. 

Apesar de nossa atenção estar 99% voltada para o bem-estar dela, como se ela fosse uma garotinha, nem tudo está perdido: ela mantém ao menos 1% do instinto que não a deixa esquecer que sua garotinha ainda somos nós. 


10 de Maio de 2025
CARPINEJAR

O amor de colher

Mães não são todas iguais - mas são parecidas no excesso de proteção. Na minha infância, a mãe tinha obsessão por fortificantes.

Eu era franzino, um bambu, sustentado à base de fotossíntese particular. Comia pouco. Era o rei das bainhas e das dobras nas roupas.

Ela vivia me dando Emulsão de Scott para estimular o apetite e prevenir o raquitismo: um xarope feito de óleo de fígado de bacalhau, com gosto forte e marcante de peixe adormecido e ferrugem. Nem o dulçor da fragrância de laranja disfarçava o seu ranço.

No rótulo da garrafa de vidro âmbar escuro, num fundo amarelo-claro, havia o desenho de um homem de suíças, terno e chapéu, carregando nas costas, mediante cordas, um bacalhau enorme, quase do seu tamanho.

Eu achava que Dona Maria queria que eu me transformasse no Scott. Não compreendia bem o que ele significava: um pescador executivo? Um entregador de peixe do Mercado Público?

Como ele sorria com aquele peso? Ele bebia a Emulsão que levava seu nome?

Na minha fantasia, cumpria o papel moderno de um herói grego mitológico, a exemplo de Hércules. Seu conteúdo correspondia a um castigo líquido, um pesadelo para o paladar, a certeza do nó górdio no estômago.

Por mais que eu fugisse para o pátio, a mãe me localizava. Cessava a perseguição unicamente diante da minha careta ao sorver tudinho sem cuspir. Experimentei, nos anos 1970 e início dos 1980, uma época efervescente dessas poções miraculosas. Lembro-me de algumas:

Biotônico Fontoura - Tônico de ferro com sabor adocicado. Virou jingle popular na televisão:

A de Abre o apetite

B de Bom de tomar

C de Comer, de crescer, fortalecer

E de Entender

D de Decorar

T de Tá na hora de tomar

B A BÁ

B E BÉ

B I Biotônico Fontoura!

Sadol - Indicado para recuperação após gripes ou fadiga. Tinha fórmula com vitaminas do Complexo B e ferro. O slogan grudava: "Sadol dá força!".

Capivarol - Um tônico também à base de extrato de fígado. O nome, que lembra "capivara", desencadeou uma confusão entre os usuários que supunham que ele funcionava como antiparasitário.

Ferrograd - Suplemento de ferro prescrito para combater a anemia infantil, geralmente em comprimidos ou gotas. Sustagen - Suplemento alimentar em pó, misturado com leite, muito usado para reforçar a nutrição das crianças.

Karo - Um xarope de milho dado como fonte de energia e calorias. Hemolitan - Suplemento vitamínico líquido, com ferro, muito receitado por pediatras.

Citoneurim - Vitaminas do Complexo B, para casos de fraqueza ou convalescença.

A mãe sempre acreditou que poderia me salvar da imundície do pátio e da minha compulsão pela várzea de futebol. A colher de sopa era extensão de sua mão, materialização do seu afeto.

Eu me distraía e ela surgia com o antídoto, jurando que eu tinha engolido terra ou posto os dedos sujos na boca. Os remédios pararam quando entrei na adolescência e encorpei.

Mas Dona Maria só trocou a obsessão antiga por uma nova: a vitamina C.

Tornou-se, pelo jeito, sua prescrição eterna. O curioso é que ela não se detém nos primeiros sintomas de resfriado - espirros e coriza.

É todo santo dia. Ela defende que a vitamina é um escudo. Uma muralha contra a gripe. Quando me telefona, antes de desligar com seu típico "até logo" - ela não diz "tchau", mas "até logo", assim como não diz "alô", mas "pronto" -, ela já emenda:

- Já tomou a sua vitamina C hoje? Será que ela trabalha secretamente para a indústria farmacêutica? Ou será só amor escancarado?

A mãe não cansa de me cuidar. Mesmo distante, continua tentando me curar do mundo. _

CARPINEJAR

10 DE MAIO DE 2025
MARCELO RECH

O muro dos estereótipos

Narva, Estônia - De um lado do rio, a Estônia e a União Europeia, com suas democracias, liberdade de expressão, livre mercado e apoio à Ucrânia. A 150 metros, na outra margem, separada pelo Rio Narva, está a russa Ivangorod. As duas cidades se ligam por uma ponte, ora fechada para veículos, mas na prática estão separadas pela ameaça russa de retomar as Repúblicas Bálticas, independentes da União Soviética desde 1991.

Se houver um lugar em que a Rússia testará a capacidade de resposta da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), será aqui, onde a língua franca é o russo e grande parte da população local se sente ligada por origem a Moscou. A Estônia e seus aliados sabem disso e não brincam em serviço. Para se entrar e sair da cidade, na extremidade nordeste da Estônia, para-se em barreiras do exército. Nas estradas, são corriqueiros os comboios de viaturas e blindados da Otan.

Desde a invasão da Ucrânia, Narva e arredores se transformaram em zonas militares, em tensão permanente. Na cidade, patrulhas do Exército circulam pelas ruas quase desertas. Em termos bélicos, é o ponto mais quente da União Europeia. Nos mastros às margens do rio tremulam bandeiras da Otan - algo que não se vê todo dia na Europa - e uma vistosa bandeira da Ucrânia, bem na frente dos russos.

A separação dos dois mundos, tão longe e tão perto, me remeteu ao Muro de Berlim, que conheci adolescente, em 1975, quando ainda se subia em plataformas para espiar o lado comunista. Na época, alemães ocidentais e orientais pareciam viver em universos paralelos. A queda do muro, em 1989, revelou que a política produziu diferenças, mas os estereótipos eram mais fortes do que a realidade.

Estereótipos são a mais preguiçosa forma de julgamento de sociedades, povos, religiões, profissões e assim por diante. Porque se limitam à superfície, eles impedem que se conheça de fato os indivíduos. Os EUA, por exemplo, não podem ser reduzidos ao trogloditismo de um Donald Trump. O americano médio é uma figura gentil, simpática com estrangeiros e sempre prestes a ajudar desconhecidos. Idem os russos. É muita injustiça transformar a complexa sociedade russa em apêndice criminoso de Vladimir Putin. Em geral, os russos são cultos, amantes das artes e ávidos por se relacionarem com outras culturas e sociedades. Já viajei extensivamente pelos EUA e pela Rússia. Nada é perfeito, nada é tão ruim, e as necessidades e os anseios são os mesmos em toda parte.

Nunca se deve confundir, portanto, países e sociedade com seus governos. Não gostaríamos que os estrangeiros resumissem o Brasil e os brasileiros a Lula ou Bolsonaro, porque somos muito mais do que isso. Nós sabemos disso. Seria bom que todos soubessem sobre os outros povos também. 

MARCELO RECH

10 de Maio de 2025
OPINIÃO RBS

Opinião RBS

Esta série de editoriais contempla temas apontados como prioridade para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul por entidades da indústria, do comércio, do agronegócio e pelas bancadas estadual e federal de deputados em reuniões com o Conselho Editorial do Grupo RBS. Os temas abordados serão:

Fundo constitucional do Sul

Formação profissional e recuperação da Educação Básica

Falta de mão de obra e impacto de benefícios sociais

Inovação e expansão de centros de tecnologia

Infraestrutura logística e contenção de cheias

Valorização e consumo dos produtos gaúchos

Relevância do agronegócio

Bancada federal no Congresso

Um fundo constitucional para o Sul

O momento decisivo atravessado pelo Rio Grande do Sul após a enchente de maio exige dos gaúchos a postura de enfrentar de forma resoluta os gargalos que, nas últimas décadas, atravancam o desenvolvimento local. São obstáculos que se tornaram ainda mais inadiáveis de serem encarados pela constatação de que as mudanças climáticas se precipitaram como um desafio adicional que põe em risco o futuro do Estado e o bem-estar nas próximas gerações de rio-grandenses. É hora de agir e reforçar o engajamento em torno das grandes demandas do RS.

Uma dessas frentes de batalha é a criação de um fundo constitucional para a região Sul, a exemplo do de que dispõem o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste. É um instrumento essencial para assegurar financiamentos em condições mais competitivas para atrair, manter e expandir investimentos produtivos. Trata-se de uma questão de isonomia e justiça. Embora Paraná e Santa Catarina somem-se à reivindicação, não há por que negar: o RS, que nos últimos anos cresce a taxas inferiores à média nacional e também abaixo dos vizinhos, é neste momento o Estado que mais precisa de apoio em crédito com condições diferenciadas.

O setor de energia eólica é um exemplo escancarado das distorções hoje vigentes. O RS foi pioneiro e liderou setor com a instalação dos primeiros parques, mas perdeu protagonismo a partir da maior competitividade do Nordeste, que por meio de seu fundo constitucional conseguia oferecer financiamento mais atrativo aos empreendedores. O Estado e a ampla maioria dos seus municípios, ademais, não conta com a farta distribuição de royalties do petróleo e da mineração, caso do Sudeste.

Essa é uma pretensão voltada a reequilibrar regionalmente o desenvolvimento nacional. Mesmo no Sul há regiões deprimidas e outras em processo de estagnação. Os eventos climáticos extremos, como secas e enchentes, vêm espalhando prejuízos e reduzindo o avanço do PIB gaúcho. A perda de dinamismo é patente. Uma das estratégias para reverter esse quadro é diversificar a economia, com o incentivo a setores florescentes, como os vinculados à transição energética. Será mais árduo sem um novo instrumento que eleve a atratividade do Estado.

A boa notícia é que essa é uma luta com etapas vencidas. Tramita na Câmara dos Deputados a proposta de emenda à Constituição (PEC) 27/2023, que prevê a criação de fundos constitucionais para o Sul e o Sudeste. É o texto legislativo mais adiantado. No ano passado, teve parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Os fundos têm como fonte de recursos parte da arrecadação com Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda. 

A Federação das Indústrias do Estado do RS (Fiergs) apoia a PEC, assim como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que incorporou a pauta a sua Agenda Legislativa 2025, que reúne os temas defendidos pela entidade no Congresso. Ainda que o texto precise de ajustes, é nesta proposta que o Estado, seus representantes políticos e entidades devem se concentrar neste momento para ter êxito em uma demanda vital para o Rio Grande do Sul. _

OPINIÃO RBS

10 DE MAIO DE 2025
TRAMA GOLPISTA

TRAMA GOLPISTA

Supremo forma maioria para manter ação penal contra Alexandre Ramagem

Trama golpista

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para derrubar parcialmente a resolução aprovada pela Câmara dos Deputados, que anulou a ação penal a que o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) responde pela tentativa de golpe em 2022.

Os ministros votaram para suspender a acusação por apenas dois crimes: dano qualificado e deterioração contra o patrimônio da União.

Essas duas acusações são relacionadas aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 - ou seja, ocorreram após a diplomação de Ramagem como deputado.

Em seu voto, o relator Alexandre de Moraes afirmou que "não há dúvidas" de que a Constituição só permite à Câmara suspender ações sobre crimes cometidos após a diplomação.

Assim, Ramagem seguirá respondendo pelos crimes de abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado e organização criminosa.

Moraes também deixou claro que a suspensão só se aplica ao parlamentar e não a outros réus da ação - entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo ele, os requisitos da Constituição são "claros e expressos, no sentido da impossibilidade de aplicação dessa imunidade a corréus não parlamentares e a infrações penais praticadas antes da diplomação".

"Indevida ingerência"

O voto de Moraes foi seguido pelos ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino.

O voto mais duro foi o de Dino, que afirmou que a Câmara, ao aprovar a resolução, tentou promover "indevida ingerência em processo judicial de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal".

"Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisá-los arbitrariamente - tudo isso supostamente sem nenhum tipo de controle jurídico", escreveu o ministro.

Até o fechamento desta edição, ainda faltavam votar os ministros Cármen Lúcia e Luiz Fux. Eles têm até a próxima terça-feira, dia 13, para registrar os votos.


10 DE MAIO DE 2025
DESVIOS BILIONÁRIOS

DESVIOS BILIONÁRIOS

INSS vai devolver R$ 292 milhões para vítimas de fraude até o dia 6 de junho

Valores foram deduzidos dos contracheques em abril, mas não chegaram a ser repassados para associações devido ao bloqueio, que ocorreu após revelação do esquema. Presidente do órgão afirma que venda de bens de investigados vai garantir o ressarcimento de todo o dinheiro que foi desviado

O INSS informou na sexta-feira que vai devolver R$ 292,7 milhões referentes aos descontos indevidos na folha de pagamento de aposentados e pensionistas. Segundo o órgão, essa devolução será feita entre os dias 26 de maio e 6 de junho.

Os valores referem-se a descontos ocorridos nas mensalidades de abril. O valor já havia sido descontado do pagamento de aposentados e pensionistas, mas foi bloqueado antes de ser repassado para as associações e sindicatos.

A devolução ocorre na esteira da operação da Polícia Federal (PF) e Controladoria-Geral da União (CGU) que revelou esquema que pode ter desviado até R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024 por meio de descontos não autorizados em benefícios a título de mensalidades associativas.

Na próxima terça-feira, 9 milhões de pessoas serão notificadas, por meio da plataforma Meu INSS, sobre a ocorrência de descontos associativos nos últimos cinco anos. A partir disso, os beneficiários poderão informar se reconhecem ou não os descontos e, caso não tenham autorizado, será gerada uma cobrança à entidade responsável (leia mais ao lado).

R$ 2 bilhões recuperados

Em entrevista ao Gaúcha Atualidade na sexta-feira, o presidente do INSS, Gilberto Waller Júnior, afirmou que parte do valor para ressarcir as vítimas do esquema poderá ser obtida com a venda de bens dos investigados.

Até agora, segundo ele, foram recuperados cerca de R$ 2 bilhões. Ao todo, 12 entidades são investigadas.

- Nós entramos, via Advocacia- Geral da União, com outras medidas para bloquear não só os bens das instituições, mas os bens dos sócios. Então, é deles que a gente tem de tirar primeiramente - alegou.

Waller, porém, não estabeleceu um prazo para que todos os segurados que foram afetados sejam ressarcidos. _

Como será a notificação?

O INSS vai notificar, na terça-feira, 9 milhões de pessoas que tiveram descontos associativos desde março de 2020. A notificação será pelo Meu INSS.

Como saber se houve desconto indevido no benefício?

A partir do dia seguinte, quarta-feira, será possível consultar o valor que foi descontado e a entidade. Os canais para isso serão o Meu INSS e a central de atendimento 135.

Como informar que o desconto foi indevido?

Após a consulta, o beneficiário poderá informar se reconhece ou não o desconto. Segundo o INSS, bastará dar um clique. Como as entidades serão cobradas?

Caso o desconto não seja reconhecido, será gerada uma cobrança para a entidade, que terá prazo de 15 dias úteis para comprovar a filiação do segurado ou ressarcir o valor.

Como será feito o pagamento ao segurado?

O INSS creditará o valor ressarcido na mesma conta onde o segurado recebe o benefício. Não haverá transação por Pix ou qualquer outro método.

O que acontece se o valor não for devolvido pela entidade?

Caso a entidade não faça a devolução do valor, a Advocacia-geral da União (AGU) afirma que ajuizará ações judiciais para fazer a cobrança.


10 de Maio de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Inflação desacelera, mas está resiliente

Apesar de desacelerar - o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de abril subiu 0,43%, depois de haver aumentado 0,56% em março -, a inflação ainda faz economistas verem resiliência de preços altos ante a altitude do juro no Brasil. E boa parte avalia que isso pode significar que o viés de parada na trajetória do juro básico fica sob risco.

- A abertura do índice (análise de itens que indicam tendência) ainda mostra resiliência na inflação, principalmente nos serviços subjacentes, componentes mais sensíveis à política monetária - observa Sara Paixão, analista de macroeconomia da InvestSmart XP.

Entre os serviços subjacentes, estão comércio, alojamento e alimentação fora do domicílio. O índice de difusão - que mostra quanto a alta de preços está espalhada - aumentou de 65% para 67%. Por isso, na avaliação da economista, seria um sinal de que o juro ainda pode subir 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 18 de junho.

A avaliação é compartilhada por Igor Cadilhac, economista da PicPay, que - em razão de inflação, economia ainda aquecida e risco de alta do dólar - também prevê nova alta de 0,25 p.p. À espera de desaceleração na atividade no segundo semestre, afirma não projetar cortes de juro neste ano, mas admite que "a probabilidade tem aumentado". _

o nome do papa

Nomes de papa significam. O apóstolo Simão mudou de nome para Pedro para ser a pedra sobre a qual a Igreja Católica seria edificada. Não foi por falta de opção que Jorge Bergoglio se fez chamar Francisco. Ao escolher Leão XIV, Robert Prevost aponta o tom que vai dar a seu pontificado. Quer se identificar com a doutrina social de Leão XIII, mas também com sua diplomacia e conciliação.

Uma tarifa de 80% sobre a China parece correta. Depende do Scott B.

Donald Trump

Presidente dos EUA, mencionando o secretário do Tesouro, Scott Bessent, para sugerir início de negociações.

Coca-Cola refeita no Rio Grande

Resultado de investimento de R$ 675 milhões, a fábrica de Coca-Cola Femsa de Porto Alegre alagada no dilúvio de maio de 2024 teve cerimônia de reabertura na sexta-feira.

A água invadiu a unidade no bairro Sarandi no dia 2 de maio e chegou quase a cobrir o primeiro pavimento, comprometendo insumos e equipamentos.

- A retomada total da operação em Porto Alegre é resultado da união de esforços e reforça a nossa confiança no potencial do RS - afirmou Luciana Batista, presidente Brasil e Cone Sul na The Coca-Cola Company. _

Lucro da Renner salta 58,7% e ajuda em plano de R$ 850 milhões

Com lucro líquido de R$ 221 milhões no primeiro trimestre, a Lojas Renner teve salto de 58,7% nesse resultado em relação a igual período de 2024. O bom início de ano, conforme o CEO da empresa, Fabio Faccio, deve-se ao aumento da base de clientes e da satisfação e da lealdade medida pelo NPS (net promoter score).

- É um salto importante no ano em que temos datas relevantes, fechamos 20 anos como a primeira corporation (empresa sem controlador definido) brasileira e completamos 60 anos de história - disse Faccio à coluna.

Os bons resultados e o cenário que, se não é o ideal ao menos permite a manutenção dos planos, confirmam o plano de expansão de R$ 850 milhões.

- Boa parte será destinada à abertura de novas lojas e a reformas em já existentes. Vamos melhorar as da Avenida Otávio Rocha e do BarraShoppingSul, em Porto Alegre, e a do Park Shopping em Canoas - detalhou.

É bom também, admite o executivo, começar bem um ano marcado pelo desembarque de uma concorrente de peso no Brasil. A sueca H&M pretende abrir quatro lojas no país até dezembro - nenhuma no RS.

- Competição sempre é boa, principalmente quando tem as mesmas leis, impostos e regras. Já competimos com a H&M no Uruguai e temos o maior desempenho - observa Faccio. 

GPS DA ECONOMIA

10 de Maio de 2025
EM FOCO

EM FOCO

Na primeira missa como Pontífice, Leão XIV lamentou o que chama de redução da imagem de Jesus, como se fosse um "super-homem". Apresentação oficial aos fiéis ocorrerá no domingo do dia 18 de maio, na Basílica de São Pedro. Milhares de pessoas são esperadas, incluindo autoridades mundiais

Novo Papa

Críticas contra culto ao dinheiro e ao poder

Um dia após ser escolhido como o novo líder da Igreja Católica, o papa Leão XIV celebrou a primeira missa do seu pontificado na sexta-feira. O Pontífice conduziu a celebração na Capela Sistina, com a presença dos cardeais que o elegeram no conclave encerrado quinta-feira.

Leão XIV conduziu a missa em inglês, italiano e alguns trechos em latim. O americano homenageou São Pedro, considerado o primeiro papa e discípulo de Jesus, e pediu a bênção do santo para o seu pontificado.

Durante a homilia, Leão XIV alertou sobre a ideia de reduzir a figura de Jesus a um "líder carismático ou a super-homem". A celebração começou por volta das 6h (horário de Brasília) e terminou pouco antes das 7h30min.

- Ainda hoje, Jesus, embora apreciado como homem, é simplesmente reduzido a uma espécie de líder carismático ou super-homem e isso não apenas entre os não crentes, mas também entre muitos batizados, que acabam por viver, a este nível, num ateísmo prático - afirmou o Pontífice.

Ainda lamentou o declínio da fé em favor do "dinheiro", do "poder ou do prazer":

- Hoje, não faltam contextos em que a fé cristã é considerada uma coisa absurda, para pessoas fracas e pouco inteligentes; contextos em que, em vez dela, preferem outras seguranças, como a tecnologia, o dinheiro, o sucesso, o poder e o prazer.

A Igreja deve ser "arca de salvação que navega sobre as ondas da história, farol que ilumina as noites do mundo", acrescentou o líder espiritual de 1,4 bilhão de católicos no mundo.

Embora sua eleição seja considerada um sinal de continuidade com o papado de Francisco, também se espera que ele seja um papa mais formal nas questões litúrgicas.

- Buscávamos alguém que seguisse os passos de Francisco, mas acho que o papa Leão XIV não será uma fotocópia (do antecessor) - disse o cardeal americano Robert W. McElroy.

Ao contrário de Francisco, Leão XIV vestiu durante sua apresentação aos fiéis na Basílica de São Pedro a estola papal, mas calçou, como o jesuíta argentino, sapatos pretos - e não os tradicionais vermelhos papais.

Apresentação oficial

No mesmo dia, o Vaticano informou que a missa de entronização de Leão XIV será em 18 de maio na Basílica de São Pedro. A celebração vai empossar oficialmente o Papa aos fiéis. Há expectativa de que líderes mundiais e religiosos estejam presentes.

A Santa Sé também informou que Leão XIV ainda não indicou nomes para os cargos da Cúria Romana - Secretaria de Estado do Vaticano. O Pontífice pediu um tempo para refletir, orar e dialogar. Por enquanto, seguem nos cargos os secretários e autoridades nomeados por Francisco. _

Chiclayo, no Peru, celebra com fervor popular

"O Papa é chiclayano. Viva o Papa!", repetiam em coro dezenas de fiéis, tomados pela emoção, em frente à catedral de Chiclayo, no norte do Peru, onde Leão XIV foi bispo durante oito anos. Entre cânticos, orações e aplausos, todos expressavam, na noite de quinta-feira, a "emoção" e o "orgulho" por terem convivido com o monsenhor Robert Francis Prevost, que passou mais de 20 anos no Peru, país do qual também se tornou cidadão.

- Todos os chiclayanos, os peruanos estamos muito emocionados por ter tido o monsenhor Robert tão perto - disse Lula Botey, gerente de agência imobiliária.

A cidade tem 600 mil habitantes e fica a 15 quilômetros da costa norte do Peru.

- Ele te cumprimentava na rua - recordou Luis Cherco, de 57 anos.

Perto da catedral, o restaurante Las Américas exibia cartaz com a inscrição: "O papa comeu aqui". Rodrigo Vásquez, gerente, disse que Prevost adorava chicharrón (frango frito) com molho Las Américas. 

sexta-feira, 9 de maio de 2025



09 de Maio de 2025
CARPINEJAR

Um leão para reaver as ovelhas

Nunca um conclave foi tão esperado, teve tanta cobertura, recebeu tamanha visibilidade. Isso porque seu antecessor era o carismático papa Francisco. Sua ausência se fez radiante presença. Criou expectativas sobre quem o sucederia e abraçaria o desafio de seguir seu legado.

As gaivotas-de-patas-amarelas que vivem no telhado da Capela Sistina mostraram-se mais discretas. Talvez pelo luto do argentino Jorge Mario Bergoglio. Quando saiu a aguardada fumaça branca, às 18h8min (horário de Roma) de ontem, nenhuma delas subiu ao topo da chaminé como nas outras vezes.

A fumaceira alva não atiçou as aves, mas enlouqueceu o público na Praça São Pedro. Era o sinal do consenso. Os 133 cardeais, o maior número de votantes até hoje, haviam alcançado os dois terços necessários para a eleição do pontífice.

O cardeal Robert Francis Prevost, nascido em 14 de setembro de 1955, em Chicago, assume como o 267º pontífice da Igreja Católica, adotando o nome de Leão XIV.

Temos um novo líder religioso, eleito num dos conclaves mais rápidos da história, com quatro votações em dois dias - só perde para a conclamação do papa João Paulo I, em 1978, também com quatro votações, mas num só dia.

Assim como Francisco, Prevost rompe tabus e faz muitas estreias: o primeiro americano a ocupar o trono de Pedro, o primeiro peruano (naturalizado) e o primeiro papa agostiniano em quase oito séculos.

Ele traz para o manto papal bons presságios. É um cardeal recente, de 2023, já participando ativamente da renovação de nomes. É um missionário, com experiência na América Latina, fluente em português e espanhol, responsável por mais de três décadas de evangelização no Peru, onde exerceu a função de bispo de Chiclayo.

É uma resposta ecumênica à política isolacionista que caracteriza o governo de Trump, com tarifaços, fronteiras fechadas e deportações em massa. É da linha moderada, com uma aguçada visão pastoral e sensibilidade às questões sociais.

É um elo para a manutenção dos canais de diálogo com a sociedade, equilibrando tradição e abertura. Tanto que escolheu o nome de Leão, amplamente reconhecido por sua contribuição à Doutrina Social da Igreja - especialmente por meio da encíclica Rerum Novarum (1891), que abordou os direitos e deveres de capital e trabalho, marcando o início da sistematização do pensamento social católico.

É a investida mais poderosa da Igreja Católica para recuperar os fiéis dos Estados Unidos, depois das denúncias de abusos sexuais cometidos por membros do clero.

O escândalo veio à tona de forma explosiva em 2002, quando o jornal The Boston Globe publicou uma série de reportagens investigativas revelando décadas de abuso sexual por padres da Arquidiocese de Boston - e o encobrimento por parte da hierarquia eclesiástica. Esse dossiê foi retratado no filme Spotlight, vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2016.

Na ocasião, ficou evidente que os responsáveis eram transferidos de paróquia em paróquia para evitar exposição, em vez de serem denunciados ou punidos. As vítimas, na maioria crianças e adolescentes, foram silenciadas com acordos legais e compensações financeiras. Estima-se que a Igreja Católica dos EUA tenha gastado mais de 3 bilhões de dólares em indenizações desde os anos 1990.

O Relatório do Grande Júri da Pensilvânia, de 2018, identificou mais de 300 padres abusadores e mais de mil vítimas ao longo de sete décadas em seis dioceses do Estado.

Talvez a escolha de um estadunidense simbolize a plena conscientização da ferida e o enfrentamento da verdade, após 23 anos de constrangimento.

Era o que faltava para o Vaticano.

Prevost precisará se espelhar na resistência do último Leão para resgatar as ovelhas desgarradas do rebanho - com a credibilidade comprometida nos Estados Unidos, o número de católicos caiu de cerca de 25% para 19%.

Leão XIII, ungido em 20 de fevereiro de 1878, tornou-se o papa mais longevo, e permaneceu no pontificado até sua morte, em 20 de julho de 1903, aos 93 anos.

Que o próximo conclave demore. 

CARPINEJAR


09 de Maio de 2025
Lucas Abati

Ofensiva mira advogados que teriam lesado clientes e bancos

Polícia Civil afirma que escritório de Porto Alegre usaria procurações para tomar empréstimos e mover processos judiciais sem conhecimento das partes. Estima-se que seriam 10 mil vítimas, em sua maioria, professores, brigadianos e outros servidores públicos

A Polícia Civil deflagrou ontem a Operação Malus Doctor, que investiga um grupo de advogados suspeito de fraudar procurações judiciais para contratar empréstimos em nome de clientes e lesar instituições financeiras com processos fraudulentos. Estima-se que o grupo teria movimentado R$ 50 milhões e lesado mais de 10 mil pessoas.

A 2º DP da Capital cumpriu 74 mandados, 35 deles de busca, em Porto Alegre, Glorinha e Xangri-lá. Dos 14 alvos, nove são advogados e sofreram ordens de suspensão do exercício da advocacia. O escritório investigado é o Daniel Nardon Advogados Associados, com sede no Centro Histórico da Capital.

Segundo o delegado Vinícius Nahan, os alvos do esquema seriam clientes que buscavam renegociar juros de empréstimos bancários. Com os dados destas pessoas, os advogados teriam contraído novos empréstimos sem o consentimento das vítimas e, ao mesmo tempo, ajuizado ações revisionais contra os bancos.

- As vítimas são aposentados, servidores públicos, professores estaduais e PMs, pois esse escritório faz a captação junto a associações de professores e de PMs. Além de não repassar o dinheiro aos clientes, as pessoas acabam não sabendo que têm ações no nome delas - relata o delegado.

Conforme a Polícia Civil, o escritório teria registrado mais de 145 mil ações judiciais "potencialmente fraudulentas", 112 mil delas no RS e mais de 30 mil em São Paulo. O principal alvo da investigação seria responsável por 47% de todas as ações contra instituições financeiras registradas no Tribunal de Justiça (TJ) do RS e o quinto maior litigante na mesma Corte.

Ações em série

Várias das ações teriam sido movidas em nome das mesmas pessoas. Dono da firma investigada, o advogado Daniel Nardon moveu 132 processos em nome de um único cliente. A informação consta em documento encaminhado ao Núcleo de Monitoramento do Perfil de Demandas, órgão ligado à Corregedoria-Geral do TJ, em 2024. O mesmo documento mostra o caso de uma cliente com 110 ações movidas.

Zero Hora também apurou que, em fevereiro, um juiz negou pedido feito pelo advogado ao identificar 60 ações movidas por ele em nome de uma mesma pessoa.

Na ofensiva de ontem, a esposa e a cunhada de Nardon foram detidas com munições de uso restrito e R$ 16 mil em espécie. Ainda não há confirmação sobre a participação delas no esquema, segundo o delegado. A polícia decidiu formalizar o flagrante da esposa por porte de munição de uso restrito.

* Colaborou Lucas de Oliveira

Investimentos em condomínio e carros de luxo

Entre os endereços onde a Polícia Civil cumpriu um dos 35 mandados de busca e apreensão da Operação Malus Doctor está um condomínio de casas na zona sul de Porto Alegre. A investigação aponta que o residencial foi construído com financiamento de Daniel Nardon, advogado apontado como líder do grupo investigado.

- Ele construiu um condomínio na zona sul de Porto Alegre. São 17 casas, cada uma está à venda por R$ 850 mil. Lá, a gente também cumpriu (um mandado de busca e apreensão), porque era um dos endereços dele e uma das investigadas mora lá - relata o delegado Vinícius Nahan.

Conforme Nahan, o grupo também tem ativos financeiros na bolsa de valores e tentava vender um prédio na Rua Coronel André Belo, no bairro Menino Deus, avaliado em R$ 10 milhões. Todos os 14 alvos da operação, inclusive os nove advogados, tiveram contas bancárias bloqueadas.

Maserati

Outra apreensão que chamou atenção foi a de um Maserati, carro avaliado em R$ 480 mil. O veículo estava registrado em nome de um filho de Nardon, segundo o delegado.

- São cerca de 30 veículos em nome do núcleo principal e das empresas, avaliados em R$ 2,8 milhões. Cinco foram apreendidos - revelou Nahan.

Além do esportivo italiano, também foram apreendidos um automóvel BMW e um Mercedes-Benz. 


09 de Maio de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Americano, "romano" com atuação no Peru, novo Papa é a própria "Via da Conciliação"

Foi uma surpresa dupla, tanto pela rapidez da escolha quanto pelo eleito. Mas a transformação do cardeal Robert Francis Prevost em Leão XIV representa a própria Via da Conciliação, larga avenida de Roma que dá acesso à Praça São Pedro. Não por acaso, suas primeiras palavras foram "que a paz esteja com vocês".

Se alguma dúvida restasse, Leão XIII, do qual Prevost ensaia ser um sucessor pela escolha do nome, foi conhecido por diplomacia e... conciliação. Também lançou as bases da doutrina social da Igreja Católica.

Nascido em Chicago há 69 anos, Prevost nacionalizou-se peruano e é identificado no Vaticano como "romano" por fazer parte da Cúria. E só virou cardeal porque o então papa Francisco o encontrou no Peru, onde fez carreira e chegou a ser próximo do padre Gustavo Gutierrez, pioneiro da teologia da libertação.

O nome de Prevost frequentava as listas de favoritos de forma tão discreta como ele costuma se comportar. E antes que se crie a lenda de que Donald Trump virou "pope maker", é bom destacar que Prevost se relaciona muito bem com o arcebispo de Chicago, Blaise Cupich, muito distante do presidente dos Estados Unidos. Por outro lado, o novo Papa vem da ordem sacerdotal dos agostinianos, da qual se diz não ser exatamente "ultraprogressista".

Depois de passar pelo "corredor da metamorfose" - referência à transformação de cardeal em papa -, caberá a Leão XIV concluir uma missão econômica iniciada por Francisco: cumprir a meta de déficit zero no Vaticano, que também enfrenta problemas fiscais, como muitos países. Pode enfrentar dificuldades: em entrevista recente, Prevost afirmou que bispos devem ser pastores próximos ao povo, não gestores. Agora, terá de encarar também esse papel. _

O que o primeiro anúncio de acordo pós-tarifaço sinaliza para o Brasil

Depois de colecionar fracassos - da esnobada da China à queda no PIB, passando pelo aumento no déficit comercial -, Donald Trump enfim colheu uma vitória com seu tarifaço. Ontem, EUA e Reino Unido anunciaram acordo.

Passados 40 dias de manicômio tarifário, é um sinal de que existe chance de desmanicomização. Claro, a relação de aliados históricos entre EUA e Reino Unido facilita, mas ainda assim os termos serão um farol para os outros 183 países tarifados - outra vez descontando a ilha habitada só por focas e pinguins.

É bom lembrar que os EUA tiveram sólido superávit com o Reino Unido em 2024, o que facilita o entendimento. Então, há dois pontos em comum com o Brasil: além de os dois países terem déficit na balança comercial com os americanos, a diplomacia nacional acertou ao não retaliar - os britânicos também mantiveram a lendária fleuma. Isso ajuda a manter as tratativas abertas.

Avanço modesto

O que foi anunciado parece pouco: os EUA vão reduzir as tarifas sobre carros dos atuais 27,5% para 10%, mas só para uma cota de 100 mil veículos. O imposto de importação de 25% sobre aço e alumínio seria revogado.

Em contrapartida, Londres ofereceu a Washington o aumento na importação de carne bovina americana e a simplificação do processo alfandegário para produtos americanos.

Conforme dados do USTR (United States Trade Representative, principal órgão de comércio dos EUA), em 2024 os dois países trocaram U$ 148 bilhões em produtos. Os americanos venderam US$ 79,9 bilhões e compraram US$ 68,1 bilhões na relação com os britânicos, o que significa superávit de US$ 11,9 bilhões, bem superior ao que os EUA tiveram com o Brasil no ano passado e 17,4% acima do obtido em 2023. _

Bloqueio de consignados mostra que o escândalo está longe do fim

Depois de medidas insuficientes e hesitantes, o INSS decidiu ontem bloquear novos pedidos de empréstimo consignado para aposentados e pensionistas. A providência atende à determinação feita na véspera pelo Tribunal de Contas da União (TCU), não antes de um bate-boca que expôs a cadeia de falhas que levou ao escândalo bilionário.

O ministro Walton Alencar cobrou do colega Aroldo Cedraz, relator do processo sobre o INSS, sua atuação para que o caso fosse retirado da pauta do TCU seis vezes no último ano. Não fosse isso, as fraudes poderiam ter cessado em junho de 2024.

No caso dos descontos, havia um levantamento por amostra da Controladoria-Geral da União (CGU) que apontava para 93% de casos irregulares. A suspensão se impunha. No caso dos consignados, não há estimativa do tamanho das irregularidades, embora existam casos fartamente comprovados.

O histórico

É preciso trilhar o caminho que levou ao escândalo. A possibilidade de descontos diretos na folha do INSS foi criada em 1991, no governo Collor. Em 2019, a Medida Provisória 871 criou o Programa Especial para Análise de Benefícios com Indícios de Irregularidade, com previsão de revalidar as autorizações a cada três anos.

No entanto, em agosto de 2022, no governo Bolsonaro, um programa sem relação com o assunto revogou essa necessidade. Foi um "jabuti" (tema alheio a uma legislação) embutido no Programa de Simplificação do Microcrédito Digital para Empreendedores.

Embora a cadeia de falhas precise ser exposta para colher aprendizados e corrigir erros, sua existência não reduz a responsabilidade do governo Lula. Ainda que a "oportunidade" para a fraude tenha sido gerada antes e contado com leniência do TCU, passaram-se dois anos e milhares de denúncias antes que houvesse consequência. _

O acordo entre EUA e Reino Unido gerou maior apetite ao risco ontem e ajudou o dólar a fechar em R$ 5,661, resultado de queda de 1,47%. A bolsa chegou a superar a máxima histórica durante o dia, mas fechou perto dos 136,2 mil pontos. O recorde é 137.343 pontos, de 28 de agosto de 2024.

GPS DA ECONOMIA