01 de novembro de 2016 | N° 18675
EDITORIAL
O VOTO EM NINGUÉM
Somados, os eleitores que não votaram, os que votaram em branco e os que anularam o voto tinham força política para eleger qualquer candidato no pleito municipal concluído no último domingo. Na maioria das capitais e cidades que tiveram um segundo turno eleitoral, os votos em ninguém foram mais numerosos do que os apurados para os candidatos eleitos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 10,7 milhões de pessoas optaram por não chancelar a escolha dos candidatos que governarão seus municípios pelos próximos quatro anos. As razões são variadas, mas convergem para uma evidência inequívoca: o desencanto dos cidadãos com a classe política.
Evidentemente, muitos desencantados também votaram, talvez mais por acreditar na democracia representativa do que propriamente nos partidos políticos e nos postulantes a cargos públicos. Mas o contingente de não votantes, somado aos eleitores que foram às urnas e renunciaram à escolha, assumiu proporções estarrecedoras. E deixou uma silenciosa, mas eloquente, mensagem de rejeição aos políticos.
Motivos para isso não faltam: os escândalos de corrupção, a Lava-Jato, os conluios pelo poder, a frágil identi- dade programática dos partidos, as negociatas e a pouca eficiência das administrações públicas, que arrecadam muito, gastam demais e dão retorno insuficiente aos cidadãos. Até mesmo na escolha dos novos prefeitos essa insatisfação ficou clara, pois prevaleceram o discurso apolítico e a opção pelo novo.
Vitoriosos e derrotados, portanto, têm um mesmo desafio: recuperar a confiança da população. Cabe debater prioritariamente, neste momento, como os eleitos superarão a descrença e governarão com legitimidade, sem ter apoio da maioria de suas populações. O voto em ninguém não pode ser interpretado apenas como manifestação de ressentimento das correntes que não tinham candidatos. É mais do que isso: é um clamor do país por mudança no modo de se fazer política.
O que não se pode ignorar é que esse voto de desapontamento não deixa de ser um voto pelo Brasil. Ao manifestar com clareza sua frustração, os eleitores estão exigindo novas posturas, ideias mais arejadas, comprometimento com a ética e com o interesse público. Com mais legitimidade ainda, é o que também devem exigir os brasileiros que votaram e elegeram seus candidatos, pois o exercício da cidadania não se esgota no processo eleitoral. Se o voto em ninguém é um alerta, o voto consciente e endereçado é uma credencial irrenunciável de participação.
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