21 de novembro de 2016 | N° 18693
ARTIGO - CLÁUDIO BRITO*
ENTÃO TÁ, CONTA OUTRA
Uma das fragilidades que aponto como nocivas aos processos judiciais é a das colaborações premiadas, tão festejadas, desde o tempo em que eram chamadas de delações.
O delator é erigido à condição de herói, salvador da pátria e da verdade, até que resolva retratar-se.
Pois não é que o decisivo depoimento de Otávio Azevedo, ex-presidente da empreiteira Andrade Gutierrez, base da acusação a Dilma e Temer na Justiça Eleitoral, esfarelou-se? Por desconstrução do próprio delator, que resolveu explicar que se enganara quanto à origem do dinheiro que sua empresa doou à campanha eleitoral da presidente e de seu vice.
Agora, que ninguém mais duvida que os recursos doados à candidata presidencial são os mesmos que o candidato à Vice-Presidência também recebeu, seu Otávio resolve contar uma história diferente, para isentar igualmente quem já caiu do poder e quem está em seu pleno exercício. Conveniente para todos, até para a Justiça, que deixará as coisas como estão, intocadas.
Ninguém cogita apontar o empresário como autor de falso testemunho, pois a retratação ocorreu em tempo hábil. E se não fosse assim? Em qual depoimento a verdade verdadeira apareceu? Faz com que eu pense no festival de delações com as quais temos convivido e que alimentam inquéritos, denúncias e sentenças.
E um grande corruptor sai pela janela ou pela porta dos fundos, beneficiando-se com penas mínimas e ainda um razoável patrimônio. Mais ainda, sua empresa recebe o favor da leniência e continua a exibir suas placas diante de obras públicas, pois a vida continua e uma empreiteira não pode parar, ainda que tenha se sustentado na corrupção que promovia.
Não estou pretendendo eximir de responsabilidade qualquer servidor ou agente político que tenha permitido corromper-se, mas quero ver punidos e afastados de suas atividades os corruptores. Não passam a ser anjos inocentes pelas delações e nem podem comandar o espetáculo processual para que tudo lhes fique favorável. Seu Otávio falou a verdade? Então tá, seu Otávio, conta outra.
*Jornalista claudio.brito@rdgaucha.com.br
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