quarta-feira, 9 de novembro de 2016



09 de novembro de 2016 | N° 18682 
PEDRO GONZAGA

TIOZINHO

Isto foi numa noite na época de eu menino, na sala da casa de minha mãe. Deitado no tapete pardo com seus arabescos atenuados pelo tempo, vi surgir um tipo estranho na TV, magro, em vias de ficar careca, portando apenas um violão, quando mais útil lhe seria uma guitarra naquele festival. Não sei se então eu gostava de rock, mas gostava de ver as bandas. Acho ainda hoje a ideia de uma banda uma das grandes invenções artísticas do século 20: há sempre o componente genial, o obscuro, o incompreendido, o azarão. 

Por isso, quando aquele tiozinho entrou solitário em cena, lembro de me ter revoltado. Sua música era chata como eram chatas as conversas dos adultos. Feito muitas crianças, eu não entendia por que pessoas se reuniam para ficar falando por horas. E onde estavam as brincadeiras? Não demorou muito para eu saber o nome daquele sujeito, para guardá-lo, para nunca mais ser maçado à morte: James Taylor.

Pelos 30 anos seguintes, carreguei comigo a impressão de sua infinita chatice. Talvez levasse ao túmulo tal certeza, não fossem os serviços de música, com seus algoritmos piores que as bruxas do Macbeth, colocarem-me insciente no caminho do sr. Taylor, mais especificamente no do disco Sweet baby James. 

Após dias seguidos ouvindo canções como Fire and rain, Sunny skies e Blossom, tive de admitir, aturdido, sem precisar de espelho, que eu tinha ficado velho. E talvez chato. E talvez tiozinho. Não que a essa altura isso me importe tanto. Confesso que desde jovem qualquer coisa para jovens me aborrece. É só que tiozinho é danado. E tiozão tem um lado pegador que é ainda pior.

Por sorte, há, no entanto, outra possibilidade. Não ter sido exposto às excelentes canções de James Taylor antes de conhecê-lo nos perigosos anos 1980, que foram fatais para quase todas as carreiras dos astros dos 1960 e 70. Um bom exemplo disso é Stevie Wonder. Tomá-lo por I just call to say I love you, como muitos fizeram, é perder discos antológicos como Songs in the key of life ou Innervisions.

Hora de respirar aliviado. Taylor só era um tiozinho ao olhar da criança oitentista, que, naquele tempo agora, bem podia levar uns cascudos corretivos.

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