10 DE JANEIRO DE 2020
DAVID COIMBRA
A melhor bebida do mundo
Sexta-feira é dia de chopes cremosos. A melhor bebida do mundo. Melhor do que o Romanée Conti de US$ 45 mil. Melhor do que o mais borbulhante champanhe da viúva. Mas não haverá de ser qualquer chope a merecer esse título, óbvio. Em primeiríssimo lugar, o chope que se consagra como o verdadeiro néctar dos deuses tem de ser impreterivelmente gelado, tanto quanto uma noite de inverno de Yakutsk.
Pensando bem, talvez nem tanto. As noites de inverno de Yakutsk não raro desabam a 40ºC negativos, e a essa temperatura o nosso chope congelaria melancolicamente. Conheço bem o clima de Yakutsk porque tenho essa cidade registrada no aplicativo de tempo do meu celular. Quando faz frio aqui, sempre dou uma conferida na situação de Yakutsk, e isso me consola.
Então, o nosso chope perfeito pode ser gelado como uma tarde invernal, digamos, do Maine. E terá consistência densa como um parágrafo de Kant. Tipo:
"O espaço não representa nenhuma propriedade das coisas, já consideradas em si mesmas, ou em suas relações entre si, quer dizer, nenhuma determinação que dependa dos objetos mesmos e que permaneça neles se se faz abstração de todas as condições subjetivas da intuição; porque nem as determinações absolutas nem as relativas podem ser percebidas antes da existência das coisas a que pertencem, e por conseguinte ?a priori?".
Quanto à cor, o chope ideal precisa vir dourado como as pernas de Gisele Bündchen. Se Gisele estiver dentro de calças jeans, como sói acontecer, que seja da exata tonalidade dos ombros de Ellen Rocche na segunda semana de fevereiro, quando ela está se aprontando para os folguedos de Momo.
Aliás, Ellen Rocche contou, em uma entrevista, que, certo dia, foi fazer os pés em um instituto de beleza e, ao seu lado, sentou-se um senhor elegante que também esperava para ser atendido. Ela estranhou um pouco a presença masculina, mas logo se distraiu, relaxou, recostou-se na poltrona e sentiu um leve torpor de sonolência amolentar-lhe o corpo. Fechou os olhos, cochilou suavemente e, de repente, AAAAAAAH!, acordou com seu pé direito TODO dentro da boca do elegante senhor, que estava ajoelhado diante dela feito um servo trácio, segurando-lhe firmemente pelo calcanhar. Ellen tentou se desvencilhar, sacudiu a perna, gritou por socorro. Sem sucesso: o elegante senhor a havia abocanhado com a fúria mandibular de um pitbull. Até que a pedicure acudiu, batendo com a bacia de metal na cabeça do engolidor de pés, aos berros de:
- Pedófilo! Pedófilo!
Ellen safou-se com o pé intacto, o que é bom, mas são seus ombros que nos servem de referência. Ombros de luz.
O Grande Chope necessita ainda atender a outras duas premissas básicas, uma de forma, outra de conteúdo. Quanto à forma, aviso aos donos de bares que o chope fica mais saboroso quando servido em copos de fino cristal, como se dava no antigo Lilliput. Quanto ao conteúdo, prefiro o chope da Brahma. Tempos atrás, a propósito, pesquisei acerca das razões deste nome. Seria uma homenagem ao deus hindu? Fosse o caso, não seria mais apropriado batizar o chope de Gambrinus, o mítico rei belga patrono de todas as cervejas?
Mas não é nada disso. Há indícios de que assim se chamava o inventor da válvula que leva o chope do barril ao copo, um sábio inglês a quem devemos nossos preitos de gratidão.
Aqui, no frio do norte do mundo, não há chopes que tais. Mesmo assim, pedirei uma draft beer hoje à noite. E brindarei a vocês, meus compatriotas dos trópicos, que certamente estarão rindo com os amigos, felizes, com seus copos de chopes cremosos nas mãos.
DAVID COIMBRA
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