02
de novembro de 2013 | N° 17602
PAMPIANAS
| LUIZ CORONEL*
A genética
Que
cobra te mordeu, tão agachado na tristeza?
Como
diz Toninho Sória, árvore genealógica não dá para sacudir que cai uma melancia
na cabeça da gente.
Na
região da campanha, terra de pelo duro, caras tisnadas e melenas chucras, vivia
Seu Eraldo Konrath.
Olhos
claros como água de cacimba, e o cabelo da cor do sol.
Nos
ofícios de levar couros para os curtumes do Vale, o homem foi pegando gosto,
comprou fazenda e adotou as tradições do pampa.
Desde
o amanhecer, a cuia na mão. Temprano percorria os campos, invariavelmente.
Já
bem perto do meio-dia, Seu Konrath passou perto da velha figueira e se deparou
com o Dorvalino, sentado nos calcanhares, tomando, só e silencioso, o seu mate,
em demorados goles de acabrunhamento.
Apoiado
nos estribos, se reclinando numa atenção ao peão, indagou:
–
Que te passa vivente? Que cobra te mordeu, tão agachado na tristeza, olhando
para o chão?
Dorvalino
roncou o mate, mirou Seu Konrath e foi dando o troco num falar de trote manso:
–
Como é que não vou estar abichornado, patrão? Eu, retinto. A patroa, retinta,
da cor da noite escura. Nasce um piá com os cabelos que até parecem paia de
trigo. E os oios, me desculpe, tais quais da cor dos seus.
Seu
Konrath parou, pensou e desenrolou o novelo:
–
Dorvalino, espicha a vista sobre estes campos. Não há, homem campeiro, no meio
das ovelhas brancas, de vez em quando, uma ovelha preta?
–
Que há, há – concordou o peão.
–
Pois é a genética, Dorvalino. É a genética, homem.
Olhando
para o patrão, sem arrogância, mas deixando arreglada a questão, Dorvalino foi
taxativo:
–
Olha, Seu Konrath, então vamos fazer um trato. Em nome dessa tal de genética,
eu não como mais as suas ovelhas, e o senhor não come mais minha patroa. E não
se carece mais de explicação. Feito?
*Escritor
e publicitário
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