27 DE FEVEREIRO DE 2018
CAPA
Marfa, um oásis no deserto
A melhor palavra que tenho para descrever Marfa é peculiar. Em pleno deserto de Chihuahua, em uma região árida cheia de caubóis, na intersecção das rodovias US 90 e 67, a cidade de apenas 2 mil habitantes é um destino dominado por arte contemporânea, cultura, estrelas e muita mística, no caminho ao Big Bend National Park.
Os prédios baixinhos, que parecem caixotes, estão aqui e ali, meio solitários nas grandes quadras cortadas por largas avenidas. Em toda Marfa, há somente um semáforo - com só quatro quilômetros quadrados de área, ela realmente não precisa mais do que isso.
Mas é a noite que começou a colocar esse lugar no mapa turístico. Desde o final do século 19, avistam-se as misteriosas "luzes de Marfa", descritas no site de turismo dos EUA como "uma iluminação estranha, aparentemente sem origem" que "dança pelo horizonte, resultando em um fenômeno inexplicável". Cogitou-se que elas fossem resultado de luzes automotivas e da iluminação elétrica, mas povos nativos as documentaram muito antes do surgimento dessas invenções.
Ajuda o fato de Marfa estar um tanto isolada, o que deixa a noite mais escura e facilita a observação das estrelas. Há, inclusive, uma espécie de mirante oficial, a Marfa Lights Viewing Area, a 145 quilômetros a leste da cidade, na Highway 90, que atrai muita gente todos os dias para simplesmente observar os astros em silêncio.
Se o turista quiser ir além, pode visitar o McDonald Observatory, a 48 quilômetros de Marfa, que conta com alguns dos maiores telescópios de pesquisa do mundo. Fomos a um evento de observação, bem comuns por lá, mas, infelizmente, o tempo não permitiu que víssemos grande coisa.
Essa mística pode ser vivida em um dos maiores ícones locais, o El Cosmico, um hotel/acampamento meio hippie, onde é possível se hospedar em trailers vintage coloridos e muito bem equipados. Se você curte decoração, vai enlouquecer com a loja de suvenires, que oferece produtos estilosos, especialmente pôsteres. Lugar que reúne artistas, o El Cosmico recebe todos os anos o Trans-Pecos Festival of Music + Love, em setembro. Se você preferir uma hospedagem mais tradicional, opte pelo Hotel Paisano, que recebeu o elenco de Assim Caminha a Humanidade, filme estrelado por Elizabeth Taylor e James Dean, rodado em Marfa nos anos 1950.
A cidade também é um destino de peregrinação para os apaixonados por arte minimalista graças à Judd Foundation. Em 1971, Donald Judd (1928-1994) abandonou Nova York para se instalar e abrigar suas grandes obras nas espaçosas e abandonadas terras de um antigo quartel-geral do Exército, hoje conhecida como La Mansana de Chinati, ou, informalmente, como The Block. Li em algum lugar que foi inspiração de Bernardo Paz na criação de Inhotim, em Minas Gerais.
Você pode fazer uma visita guiada que o levará a hangares com inúmeras estantes e vastos pátios cheios de esculturas de concreto. Confesso que não consegui apreciar o trabalho de Judd, mas um crítico de arte me disse que o artista é muito relevante em sua área. Vá e depois me diga o que achou.
Outro ícone da região é a Prada Marfa, que não é uma loja da famosa grife, mas uma instalação de pop-art às margens da US 90. Trata-se de uma pequena construção no meio do nada que remonta a uma vitrine da Prada, com bolsas e sapatos da marca à mostra. Interprete a obra como quiser; alguns na vizinhança acharam um tanto presunçoso: um tempo depois, surgiu outra pequena construção perto dali, entre as cidades de Marathon e Alpine, com o logo da Target, loja de artigos populares dos EUA. Essa eterna dúvida de entender ou não a arte, de não saber o que é genial ou apenas presunção, é bastante aparente na série I Love Dick (2017), comédia da Amazon Prime ambientada em Marfa.
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