07 DE FEVEREIRO DE 2018
DAVID COIMBRA
Pequenas diferenças
Por que, afinal de contas, o pessoal lá de Mianmar está matando o povo rohingya?
Meu filho veio me perguntar isso, esses dias, e não soube responder. Na escola, ele tem contato com colegas de vários países diferentes, e aí acaba se interessando por questões internacionais e eu é que sou obrigado a estudar, para não passar vergonha.
Povo rohingya. Confesso a você (não vá contar para o meu filho) que não sabia nada dessas pessoas, até que elas começaram a ser perseguidas em Mianmar, o que foi noticiado pelos jornais. De Mianmar, inclusive, pouco sei além de que o país antes se chamava Birmânia e era uma possessão inglesa e fica perto da Tailândia. Não é o suficiente para satisfazer a curiosidade de um menino de 10 anos.
Tem mais: essa história dos rohingyas fez com que ele se metesse YouTube adentro para se informar a respeito de povos perseguidos. Então, preciso discorrer sobre conflitos clássicos, como a secular luta entre sunitas e xiitas ou a dos tutsis contra os hutus, mas o que exatamente está acontecendo com os naxalitas da Índia e com os houthis do Iêmen? E as razões de todas essas disputas, como são difíceis de explicar!
Por que muçulmanos não gostam de judeus? Por que judeus e palestinos não podem viver juntos e em paz? Por que Trump teima em levantar um muro para apartar os americanos dos mexicanos?
Por que os sírios estão em debandada pela Terra?
Por que afegãos trocaram tiros com eritreus na França, enquanto aguardam para rumar para a Inglaterra, que não quer mais fazer parte da Europa, que enfrenta movimentos separatistas como o da Catalunha?
Por quê? Por quê?
A verdade é que sempre encontramos razões para brigar uns com os outros.
Pol Pot, ditador do Camboja, não gostava de intelectuais, embora ele próprio fosse um: havia estudado na França, onde entrara numa organização comunista, e voltara ao seu país para ser professor de história.
Mesmo assim, talvez em autocrítica subconsciente, ele decidiu eliminar todos os intelectuais quando assumiu o poder. Caçou professores, jornalistas, escritores e artistas e matou-os todos ou os atirou em campos de trabalhos forçados. Transformou cinemas, bibliotecas e teatros em chiqueiros. Para assegurar que não sobrasse ninguém vagamente relacionado a alguma atividade que não fosse braçal, mandou que seus esbirros prendessem... quem usava óculos!
Imagine: o sujeito podia ser o maior iletrado do Oriente, mas, se sofresse de miopia ou astigmatismo, seria preso e, provavelmente, morto. Então, usar óculos tornou-se maldição no Camboja, como é maldição ser tutsi em meio aos hutus ou sunita entre os xiitas. Mas o fato é que, se você estiver caminhando pela Rua da Praia e lá do outro lado vier um rohingya, você nem notará. Ele é apenas um ser humano como os milhares que o cercam. Da mesma forma, se ele for um judeu ou um muçulmano ou um zulu ou um xhosa. Somos todos Sapiens partilhando o mesmo planeta. Não temos de nos odiar por pequenas diferenças. Ou mesmo por grandes diferenças. Paz. Precisamos de paz. Pense nisso, nesta eleição de 2018.
DAVID COIMBRA
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