sábado, 18 de maio de 2013



18 de maio de 2013 | N° 17436
NILSON SOUZA

Proteína com perninhas

Nunca acordei pensando que era um inseto, como o célebre personagem de Kafka, mas tenho tanto respeito pelas formigas, que nem me atrevo a investigar minhas vidas passadas. Chego mesmo a desviar de meu percurso nas caminhadas matinais quando vejo uma carreira de bichinhos na calçada. Aprecio-as pela disciplina e pela determinação, especialmente aquelas que carregam pedaços de vegetais bem maiores do que elas próprias.

Também me despertam compaixão outros insetos, como aquele que parece um rinoceronte em miniatura e está sempre virado com as patas para cima, sem conseguir se aprumar. Quando deparo com um desses, procuro desvirá-lo para que retome o seu rumo. Também tenho um crédito de bom-mocismo com os voadores: já fui severamente advertido por um companheiro de viagem por reduzir abruptamente a marcha do carro na estrada, apenas para não atropelar uma borboleta.

Sinto-me, portanto, moralmente impedido de seguir a recomendação que a ONU deu na semana passada para combater a fome no mundo: comer insetos. Muitas espécies têm mais proteína do que a carne, garantem os especialistas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. E lembram que grilos, gafanhotos e larvas de diversas espécies já são consumidos em mais de 120 países, sendo apreciados inclusive nos sofisticados restaurantes europeus que vendem comidas exóticas. Com todo o respeito, argh!

Como nunca passei fome de verdade, não posso dizer que jamais comerei qualquer coisa. Mas enquanto houver um pacotinho de miojo disponível no mundo, os insetos que se preocupem apenas com seus predadores naturais – como uma lagartixa que habita os recantos escuros da minha sala de trabalho em casa. Chamo-a, carinhosamente, de Tixa. Ela, sim, tem um verdadeiro fascínio pelos bichinhos que se deixam atrair pela luz. De vez em quando, sai da sombra e faz um rápido lanche, antes de retornar ao seu esconderijo. Segue a orientação da FAO e parece mesmo forte e saudável.

Se alguma vez estive perto de provar alimento de lagartixa, foi quando prestei serviço militar. Muitas vezes, comi comida fria porque perdia um tempão enorme separando os gorgulhos do feijão.

E tinha colega de farda que nem olhava para o prato. Haja estômago! Já ouvi dizer que alguns cearenses comem tanajuras, aquelas formigas gigantes que aparecem na época das chuvas. Não é o pior: tem gente pelo mundo que come aranha caranguejeira, escorpião, larva do bicho-da-seda e outras criaturas tão indefesas quanto repelentes.

Mas nem só de insetos vive o homem. Li que na Tailândia um chefe de cozinha ficou famoso por preparar um prato exótico que garante ser muito saboroso: lagartixas fritas.

Má notícia para a minha companheira de serão.

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