Essências do gigante Bertrand Russell
Jaime Cimenti
Bertrand Russell (1872-1970) foi um dos maiores pensadores do século XX. Filósofo, lógico, matemático e escritor de dezenas de obras, organizou, na década de 1960, o Tribunal Russel para julgar os crimes de guerra cometidos pelos americanos no Vietnã e, em 1950, recebeu o prêmio Nobel de Literatura.
Passados mais de cinquenta anos do falecimento do autor de obras seminais sobre paz, religião, casamento, desarmamento nuclear, razão, felicidade e ceticismo, suas ideias e suas lutas apresentam-se atuais e é oportuna a releitura de seus incontáveis, instigantes e polêmicos textos e o estudo de uma longa e movimentada existência pessoal nas áreas do pensamento, da escrita e do ativismo em várias frentes.
Bertrand Russell - 3 em 1 - No que acredito, Por que não sou cristão e Ensaios céticos (L&PM Editores, 488 páginas, R$ 99,90, traduções de André de Godoy Vieira, Ana Ban e Marisa Motta) são volumes que, agora reunidos, representam a essência do pensamento do autor a respeito de temas como ética e religião.
Em No que acredito, Russell reflete sobre o papel e a influência da religião na vida das pessoas, movido por seu célebre ateísmo e escrito com ousadia, tom espirituoso e polêmico, provocou a ira dos religiosos, que consideraram a obra extremamente profana.
Por que não sou cristão é considerado um dos mais blasfemos documentos filosóficos escritos e diz, com bom humor, que se a religião não dá repostas às perguntas que sempre atormentaram a humanidade, é preciso sair da zona de conforto e pensar em responsabilidade, autonomia e consciência do que fazemos.
Em Ensaios céticos, Russell diz que, para ele, não era uma contradição se declarar cético e, ao mesmo tempo, acreditar que a razão pudesse transformar a vida humana. Na coletânea de ensaios o autor discute o perigo das guerras doutrinárias, a busca pela felicidade, a questão "liberdade versus autoridade na educação" e outros temas relevantes.
Nestes tempos pós-modernos de poucas referências sólidas e necessidade de entender o que ocorre no mundo, a obra de Russell segue muito válida.
Saudades de um Brasil mais afinado
A gente sabe que o Brasil não têm muitos fatos históricos e heróis realmente grandes e verdadeiros. Temos alguns nomes na economia, na política, nas artes e nos esportes e não os cito para não cometer injustiças e causar polêmicas. Mas quero lembrar do Plano Real, do saudoso e correto governo Itamar Franco, talvez a maior vitória da sociedade e o maior fato histórico de nosso Brasil. Itamar merece mais lembrança. Nada há contra ele e seu governo, coisa rara em nossa história republicana.
Quero lembrar também o gigante Tom Jobim, os tempos da bossa nova do JK, os "anos dourados". São lembranças que nos levam para frente, depois de comemorarmos os duzentos anos da Independência. Precisamos de exemplos, heróis e referências para deixarmos de ser um país e tornarmo-nos uma nação.
O final da década de 50 não foi um período perfeito, não chegamos a viver 50 anos em 5 e a construção de Brasília, tão rápida e tão cara, nos deixou alegrias e problemas. Eram tempos de Brasil mais otimista e afinado, buscando crescer em economia e democracia, com PIB crescendo em média 7% ao ano.
Não podemos, é claro, ficar apenas no saudosismo. É preciso lembrar do passado, tirar lições preciosas dele e construir o futuro como merecemos. Num momento tão turbulento e cacofônico, com tanta polarização deletéria, tanta violência, tantos crimes e grandes problemas, é preciso lembrar de nossas melhores qualidades.
Tom Jobim, anos dourados, Itamar, Plano Real são referências que fazem bem e merecem recordação, especialmente nesses tempos pós-modernos, de pessoas, referências e ideias de pouca duração e de critérios éticos e morais "elastecidos" demais.
Precisamos entender que, se o coletivo não estiver bem, o individual também não vai estar bem. Mesmo nesses tempos sem fronteiras bem demarcadas, sem critérios consistentes e plenos de ficções e realidades distópicas, precisamos de união em torno dos verdadeitos interesses públicos nacionais e em torno da verdadeira democracia e da imprescindível liberdade.
Evidente que isso é difícil, que a democracia é uma construção constante e interminável e que desenvolver uma sociedade plural, igualitária, progressista e pacífica é tarefa gigante, complexa, que deve envolver a todos. Muitos perderam as esperanças, acham que o Brasil é um caso perdido e que ao invés de crer em utopias só podemos esperar por distopias, presentes em muitos estudos e obras de ficção. Muitos acreditam no futuro e nas possibilidades que ainda temos de ver dias melhores para filhos e netos.
Muitos já nem pensam em esperanças e desesperanças e vão sobrevivendo, tocando a vida em piloto automático e ficam só rezando e pedindo a Deus que se manifeste brasileiro e dê uma ajuda.
Lançamentos
• O fator de atração (Cultrix, 288 páginas, R$ 59,90), de Joe Vitale, estrela de O Segredo e chamado de "Buda da Internet", combina espiritualidade e lições de marketing e revela os cinco passos para criar riqueza e prosperidade em todas as áreas da vida. O sucesso não depende do que você faz, depende do que você é, ensina.
• Do espírito das leis (Editora Unesp , 927 páginas, R$ 178,00), clássico de Montesquieu, diz que a garantia do exercício da liberdade depende de uma mistura composta por sólidas leis, boas instituições políticas, governo moderado, corpos intermediários organizados e respeito à tranquilidade, segurança e aos bens dos indivíduos.
• Confrontando o Leviatã (Todavia, 320 páginas, R$ 89,90), de David Runciman, professor de política em Cambridge, editor do London Review of Books e autor de Como a democracia chega ao fim, apresenta uma história do pensamento político moderno, de Thomas Hobbes a Hanna Arendt e da pandemia à crise climática.
A propósito
Mais uma vez, e sempre, o Brasil que a gente quer para a semana que vem é uma pátria com menos divisões, com menos polarização e com toda a união possível em torno do que realmente interessa ao coletivo. Sem diálogo, grandeza, humildade, paz e entendimento, sabemos no que vai dar e não será coisa boa. Já conhecemos os velhos filmes e torcemos por algo novo. Extremismos, radicalização, destruição e desprezo ao bem e aos bens públicos é tudo que devemos evitar. Ninguém é eterno, ninguém pode tudo e para sempre, ninguém deve estar acima das leis. A grande orquestra brasileira - todos nós tocando - precisa estar afinada e aí não precisaremos ter saudades.
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