terça-feira, 2 de março de 2010



02 de março de 2010 | N° 16262
PAULO SANT’ANA


Cavalo é veículo

Eu escrevi ontem contra a Cavalgada do Mar, mas fiquei com um remorso: afinal, sou gaúcho, respeito o culto às tradições e posso tê-lo agredido com meu texto.

Então, quero contemporizar. Admito a Cavalgada do Mar, desde que ela seja organizada.

Alguém tem de se responsabilizar pelo trânsito dos animais e dos cavaleiros no longo percurso.

Sem exame dos veículos, sem inspeção dos veículos, no caso os cavalos, não vai dar para continuar.

O próprio Vilmar Romera, índio velho macanudo que incluo entre meus amigos, como presidente da Fundação Cavalgada do Mar, declarou que ele não vai estar cuidando de quem monta cavalo gordo ou doente. Desfila quem quer.

É um “vai quem quer”. Assim não pode prosseguir.

Algum órgão tem de assumir a fiscalização da cavalgada para que se evite a morte dos cavalos e para que os animais não sejam maltratados pela maratona.

Pode ser o Ministério da Agricultura o órgão fiscalizador. Ou o Ibama, até mesmo a Polícia Rodoviária.

Alguém tem de inspecionar os cavalos e dar-lhes um certificado, após uma inspeção veicular, de que podem transitar varando vários municípios, tipo as licenças do Daer.

O que não pode acontecer é um deslocamento de um comboio imenso como esse pelas praias – cavalos, cavaleiros, arreios, serviço de intendência com água, alimentos, carne para churrasco e sal grosso – sem o controle de um órgão fiscalizador.
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E até mesmo pelas declarações do presidente da Cavalgada do Mar, que diz eximir-se totalmente da questão do estado de saúde atlética dos cavalos, a responsabilidade sobre a questão deve deslocar-se até o cavaleiro: ele é que tem de verificar se o estado geral do cavalo é bom, se o animal não está gordo demais para o esforço da cavalgada, se vai resistir aos dias seguidos sob o sol escaldante etc.

Para tanto, têm de ser criados Centros de Formação de Condutores. Um CFC, ou melhor, um CFCC, Centro de Formação de Condutores de Cavalos, que receberiam a sua habilitação depois de testados por peritos em tratamento com equinos. Só depois de verificado que o cavaleiro tem condição de discernir sobre o estado dos animais é que se concederia ao cavaleiro a carteira de habilitação.

Já sei que vão me condenar por querer burocratizar a cavalgada, mas o meu propósito é o mesmo das associações protetoras dos animais, preservar os cavalos dos maus-tratos.

Do jeito como vai a coisa, não está acontecendo uma cavalgada, e sim uma cavalhada, uma manada de cavalos circulando na praia num folguedo em que ninguém se responsabiliza pela integridade física dos animais. Nem os cavaleiros.

Não vão querer cobrar pela carteira de habilitação o preço que se cobra hoje pelo mesmo documento para dirigir carro ou caminhão. Este preço está pelos olhos da cara.

Mas tem de haver fiscalização. Afinal, a Cavalgada do Mar, quando sai de Porto Alegre e ruma para o Litoral, está nesse instante se integrando ao Sistema Nacional de Trânsito e tem de obedecer a regras, sendo que a principal delas deve ser o bom trato dos animais com cuidados com a saúde dos bichos.

Organizada, pode prosseguir a cavalgada. Mas matando e esfalfando cavalos pelo caminho é que não pode mais prosperar.

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