domingo, 10 de agosto de 2008



10 de agosto de 2008
N° 15690 - VERISSIMO


O marido da contorcionista

Durante anos, o Carlão foi alvo de especulações e inveja. Tinha se casado com uma contorcionista, Flamínia, que nos seus tempos de circo era chamada de A Mulher sem Espinha.

Flamínia conseguia morder o próprio tornozelo sem tirar os pés do chão. Especulava-se sobre o que Flamínia seria capaz de fazer no leito nupcial. E invejava-se o Carlão, beneficiário de tantas loucuras presumidas. Logo o Carlão!

“Logo o Carlão!” foi, durante anos, o bordão de todas as conversas sobre o casal e o que eles fariam na cama. Logo o pacato Carlão, que, na opinião geral dos amigos, tinha o apelo sexual de um rabanete.

E as especulações sobre o que a contorcionista faria no seu parceiro sexual ganhavam um tom de espanto maior com a lembrança de que o parceiro era o Carlão, logo o Carlão.

Que até se casar com a contorcionista suspeitava-se que fosse virgem. Que até se tornar o assunto preferido do grupo só era conhecido pela sua extrema sovinice. Logo o Carlão!

Ninguém chegou a pedir ao Carlão que satisfizesse a curiosidade dos amigos e contasse como era sua vida sexual com Flamínia. Ou, para não esquecer o respeito, dona Flamínia. E, diante do silêncio do Carlão, as especulações se multiplicavam.

As possibilidades eram infinitas, a variedade de posições inacreditável. Para quem não recordasse ou não conhecesse o número da Mulher sem Espinha no circo, bastava lembrar que ela entrava no picadeiro carregada numa sacola de supermercado.

Era tão flexível e dobrável que cabia dentro de uma sacola! E fora vendo-a morder o próprio tornozelo sem tirar os pés do chão que o Carlão decidira casar-se com ela, certamente pensando nas possibilidades e na variedade. Quem diria. Logo o Carlão, um gourmet sexual!

A imaginação dos amigos funcionava: – Ela pode botar uma perna por aqui, a outra por aqui, segurar aqui, e com a língua...

– Ele pode dobrar ela assim, puxar uma perna pra cá, e...

Mas um dia o Carlão apareceu, sozinho e desconsolado, e sentou-se com o grupo. Tinha recém chegado de viagem. Viajava muito. Tinha uma boa renda mas só voava de classe econômica, e quando havia promoção. E um dos amigos não se conteve.

– Carlão, não leva a mal. Mas você sabe que a gente vive especulando sobre a vida sexual, sua e da dona Flamínia. Nós...

– Eu não tenho vida sexual. A Flamínia tem. Abriu-se uma clareira de espanto. – O quê?

– Ela faz tudo sozinha. Não precisa de ninguém. E já que estava disposto a contar tudo, Carlão contou que escolhera a contorcionista porque precisava de uma companheira portátil.

Quando viajavam ela ia dobrada dentro de uma mala, e ainda sobrava espaço para acondicioná-la bem e protegê-la do frio do compartimento de bagagem dos aviões. Depois só precisavam cuidar para os hotéis não descobrirem que eram dois num quarto simples.

E por que ele estava tão desconcolado? Onde estava dona Flamínia?

– Em Cingapura. – Como? – A bagagem extraviou. Quer dizer: as coisas nem sempre são o que parecem.

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