Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
domingo, 10 de agosto de 2008
10 de agosto de 2008
N° 15690 - MOACYR SCLIAR
Deus como pai, o pai como Deus
As grandes religiões monoteístas, o judaísmo, o cristianismo, o islamismo, introduziram a idéia de um Deus único. Isto, na politeísta antigüidade, era algo novo.
E mais, tratava-se de um Deus homem, representado no quadro dos grandes pintores (mas não no judaísmo e islamismo, que proíbem imagens) como um ancião de expressão severa, cabelos e barba brancos. Isto contradizia muitas crenças do Oriente Médio, que cultuavam uma Deusa-Mãe, mas estava de acordo com o regime patriarcal que caracterizava vários povos da região, os hebreus inclusive.
Deus é o Supremo Patriarca. Mas, diferente dos patriarcas, que tinham família, e às vezes várias mulheres, e diferente também dos deuses gregos que – perguntem para o Cláudio Moreno – viviam numa alegre promiscuidade, deuses traçando deusas e vice-versa, Deus é único.
E Deus é só. No cristianismo ainda temos a idéia da Trindade, e temos também Maria, a mãe de Jesus. Mas no judaísmo antigo é Jeová, só Jeová, e estamos conversados.
Jeová fala. Fala com o humanos, e falava antes de existirem os humanos. Leiam a Bíblia: “Deus disse: faça-se a luz”. Deus falou, está falado: a luz se faz, sem qualquer risco de apagão.
Mas então aparece, no Gênesis, uma frase intrigante: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”. Por que “façamos”? A quem alude esse plural? Quem é que forma, junto com Jeová, o “nós” implícito na frase?
Quem quer que seja este “nós”, de uma coisa podemos ter certeza: não é o pai de Deus. O Todo-Poderoso do Antigo Testamento não tem pai, pela simples razão de que é Eterno: sempre existiu, não foi criado, não foi gerado, não nasceu. Isto é pré-condição para a onipotência. Deus pode tudo. Deus não precisa de pai.
Esta é uma noção que muito cedo surge em nossa cabeça. Sem ser Deus, nosso pai também pode tudo. Nosso pai é perfeito, nosso pai sabe tudo, nosso pai resiste a qualquer embate. Nosso pai trabalha, nosso pai provê as necessidades da família.
Claro, nosso pai tem um pai, mas o avô em geral (sobretudo o avô-coruja) é uma figura amável, gentil, que não prima pela energia, pela capacidade de lutar, ao contrário de nosso pai que é imbatível, é indestrutível. Nosso pai é Deus.
Ficar adulto é, entre outras coisas, dar-se conta da limitação desse pensamento. Aos poucos vamos descobrindo, para nossa dolorosa surpresa, que os pais têm fraquezas, têm limitações. Nossos pais cometem erros, nossos pais fazem bobagens, nossos pais muitas vezes fracassam nos seus empreendimentos.
Nossos pais às vezes são transgressores, nossos pais às vezes são corruptos. Já imaginaram o que é ser filho de um corrupto? Já imaginaram ver o pai de vocês algemado, numa foto ou na tela da televisão?
Os pais dão-se conta da imensa tarefa que cai sobre eles. É um fardo pesado, um fardo que os faz cambalear. E que resulta não raro em desespero porque eles sabem que, no fundo, não têm a quem pedir socorro. Claro, existem os amigos, os parentes, os protetores. Mas não é este tipo de ajuda que os pais querem.
O que eles querem é corresponder à imagem onipotente que os filhos têm deles. Mas quem pode auxiliar nisso? Assim como Deus não teve pai, assim como Deus não pode olhar para o Céu em busca de apoio (porque já está no Céu) os pais, no fundo, no fundo, não têm a quem recorrer. Apesar da frase bíblica, Deus não é “nós”.
Deus, como os pais, está sozinho. Mas, e isto é um consolo, há glória e heroísmo nestes momentos de solidão. É a amarga grandeza da paternidade.
Homenagens neste dia: a José Scliar, que deve estar contando a Jeová as mesmas histórias que contava no Bar João, no Bom Fim; a Judith e Beto, que fizeram de mim um pai.
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