sábado, 19 de março de 2022


18 DE MARÇO DE 2022
EDUARDO BUENO

Viva a vodca

Com o advento da covid, cancelaram os restaurantes chineses. Agora, estão proibindo a vodca. Só espero que a Jamaica não faça nada errado...

Recebi essa piada pelo WhatsApp, e achei deliciosa. Pena que no caso da vodca não seja piada: tem restaurantes não só deixando de servi-la como vertendo esse líquido sagrado à sarjeta. E dizem que o coquetel Moscow Mule passará a se chamar Snake Island Mule, em homenagem aos bravos soldados ucranianos dessa ilha que mandaram um navio russo longe, antes de serem pulverizados por ele, pois chumbo mata mais que palavrões.

Mas os sujeitos que querem proibir a vodca e mudar o nome do coquetel não devem saber nada nem de uma nem de outro. Chamada de "aguinha" pelos russos, vodca sempre foi uma mistura de água e álcool. Só que em vez de ser simples assim, era complexo assim: a combinação dos dois líquidos dependia das propriedades moleculares de ambos, mais especificamente dos pesos relativos. Nos primórdios, a vodca era usada como anestésico e desinfetante, nos tempos em que nenhum dos dois existia. De início, a porcentagem de álcool chegava a 90% e quem ingeria vodca para afogar as mágoas, em geral afogava o resto todo também.

Foi o genial Dmitri Ivanovich Mendeleev quem descobriu em 1893 a fórmula ideal para a vodca, a mesma usada até hoje. Após mais de um ano misturando água e álcool (e provando), Mendeleev concluiu que a composição ideal era 40% de álcool e 60% de água. Aprendi isso no Museu da Vodca em Moscou. Lá descobri também que entre as façanhas de Mendeleev está a criação da Tabela Periódica: ele foi o primeiro a relacionar a massa atômica às propriedades dos elementos. Conclui que o tormento das aulas de química no colégio foi, ao menos em parte, recompensado pelos prazeres do Blood Mary.

Acontece que a história do americaníssimo coquetel Moscow Mule também é sensacional. Em 1939, John Martin obteve a exclusividade da venda da vodca Smirnoff nos EUA. A princípio, tudo desceu redondo. Mas com a Guerra Fria, os lucros se congelaram. Para esquentar o negócio, Martin foi de bar em bar e quando chegou ao pub Cock?n? Bull, em Hollywood, encontrou o proprietário, Jack Morgan, às voltas com um estoque encalhado de ginger beer (cerveja de gengibre). Como Mendeleev, eles se puseram a misturar. Mas a receita só ficou completa quando a russa Sophie Berezinski bateu-lhes à porta querendo se livrar de uma montanha de canecas de cobre, vindas de Moscou, com a imagem de uma mula impressa nelas, e que ninguém queria comprar. A alquimia daqueles elementos faz tabelinha - e o resto é história. Inebriante história.

Isso posto, proponho um brinde à Otan, contanto que seja com Cuba Libre, é claro. Já para Putin, recomendo um coice de mula e uma caneca furada com haraquiri. Ops, daiquiri, claro.

EDUARDO BUENO

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