sábado, 26 de outubro de 2013


26 de outubro de 2013 | N° 17595
PAULO SANT’ANA

A indumentária

Fiquei analisando o desenvolvimento da minha indumentária durante esses meus 74 anos de vida.

Comecei guri andando de pés descalços por todas as partes em que ia. Sofrendo muito nos campos da Chácara das Bananeiras, havia rosetas nos campos, feriam as solas dos pés e os dedos.

Lembro-me agora que, como guri, usei durante muitos anos calças curtas e suspensórios. E também calçava tamancos, pesados, machucadores implacáveis das unhas encravadas.

Um dia, trabalhando como contínuo nas Casas Krahe, na Rua da Praia, então com 18 anos, vibrei com a minha grande conquista na vestimenta: consegui comprar um paletó usado, marrom, lindo. E me olhava sempre no espelho do elevador, me achava mais bonito dentro daquele casaco. Foi o primeiro paletó que vesti em minha vida, senti-me elegante, mas acima de tudo senti-me homem adulto.

Dali por diante, a minha indumentária, sob o ponto de vista econômico e da elegância, deu um salto de qualidade espetacular.

Tanto que, à medida que o tempo foi passando, consegui até o triunfo de um dia vestir um smoking e comparecer a uma festa de gala. Eu me olhava no espelho e ficava perplexo que um guri de tamancos tivesse agora atingido a glória de estar vestido de casaca preta com faixa de seda lilás na cintura. Que façanha!

Houve um tempo, entre os 20 e os 30 anos de idade, em que tive dois alfaiates, ambos estabelecidos na Azenha, o Ari e o Fantasma.

Dois ternos por ano pelo menos eles me faziam: que luxo tirar as medidas e vestir um terno não comprado em loja!

Depois, viajei pelos Estados Unidos, pela Europa, pelo Japão, como jornalista na Rádio Gaúcha. E comprei malas e malas de roupas, numa das viagens cheguei a trazer 30 pares de sapatos, além das botas espetaculares, de alpinismo, que até hoje envergo e que foram compradas na Irlanda. Como duraram até hoje essas botas! Eu as adquiri em 1974 e, ainda nesse inverno que terminou há pouco, eu as calcei com muita dignidade.

Evoluí dos ternos de tussor

para os de veludo, assim como dos tamancos e de sapatos baratos para calçados de trissê feitos à mão.

Foram centenas de calças e camisas que usei nessas várias décadas, quem iria imaginar que aquele garoto pobre de tamancos teria um dia um guarda-roupa com 160 peças?

Sem falar nos sobretudos com que enfrentei 50 invernos.

E um casaco célebre de pele e lã de cordeiro, que ainda tenho e sempre que o ponho sinto-me aquecido até certa ânsia, e que só pode ser usado quando a temperatura está próxima do zero.


As roupas e os calçados sem dúvida são as peças da indumentária que mais marcaram a evolução da minha moda nesses 74 anos de existência.

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