sexta-feira, 4 de outubro de 2024


Sindicato dos desastrados

As pessoas mais interessantes que eu conheço derrubam tudo que pegam na mão, deixam escapar a perfeição e se divertem nos imprevistos da vida. Eu gosto de gente desastrada.

O desastrado é habilidoso em rir da própria desgraça. Ele também, normalmente, não cobra dos outros um comportamento chato e elegante. Sabe o que realmente importa. Desastrados são ótimos em resolver problemas porque focam na solução e não na culpa pelo erro.

Almoçar com um desastrado é certeza de copo virado, camisa suja, talher no chão. Fazer qualquer coisa com alguém inábil é trabalhoso, mas feliz e divertido. Dois desastrados juntos é outra história.

Eu era uma criança desastrosa (era assim que minha avó definia alguém desajeitado). Passei a infância ouvindo isso. Certa vez, de férias no interior de Santo Expedito do Sul, eu e minha prima Kelen colocamos tecido nos pés para "patinar" na varanda. Não deu outra: eu atravessei uma janela de vidro e fiquei com o rosto cravejado de cacos de vidro que foram retirados um a um com uma pinça. Nunca esqueci aquele dia.

Na semana seguinte, fui brincar com uns amigos na rua de casa e ganhei uma tala no braço esquerdo. Fato é que o tempo foi passando e segui sendo conhecido na família por ter mão boba, por não ter jeito pra fazer as coisas, por sempre acabar machucado. Ah, lembrei de outra história: na tentativa de instalar uma antena de TV em casa (e na pressa de não esperar chegar alguém pra me ajudar) subi sozinho no forro da casa e despenquei! Terminei com o braço direito em carne viva. Meus tios ficaram anos fazendo a piada do "chama o Marquinho pra instalar uma antena lá em casa".

Eu nunca me importei com isso e, bem na verdade, sempre curti esse lance de não fazer nada 100% certo. Eu me divirto quando estou de camisa branca manchada de café ou quando quebro alguma coisa em casa por estar com pressa.

Uma das grandes vantagens de ser desastrado é que as pessoas que convivem com você sabem disso, vão fazer piadas, mas com o tempo elas passam a compreender esse "jeitinho desajeitado de ser". E como é gostoso não esperar que tudo dê certo na vida.

Eu não me incomodo em errar fazendo qualquer coisa ou de deixar a elegância e a etiqueta de lado. A autenticidade de um desastrado está nos detalhes imprecisos. E é nesse espaço de erro e pequenos desastres da rotina que está a graça em ser assim. _

MARCO MATOS 

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