sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Jaime Cimenti

Freud foi responsável pela morte da irmã?

A irmã de Freud, romance do professor, dramaturgo e escritor macedônio Goce Smilevski, nascido em 1975, foi vencedor do Prêmio da União Europeia para a Literatura e marca a estreia do autor no Brasil. O romance já foi publicado em mais de 30 idiomas.

Quando foi lançado, chocou os leitores, que se perguntavam se Sigmund Freud, o famoso criador da psicanálise e uma das maiores personalidades do século XX, teria sido responsável pela morte de sua irmã em um campo de concentração nazista. O relato de Goce é ficcional, mas, apesar do caráter de fantasia, a premissa da obra é verdadeira: Freud fugiu da Áustria em plena ascensão nazista deixando quatro irmãs para trás. Todas morreram em campos de concentração.

Na Viena ocupada pelos nazistas, Freud recebeu o direito de fugir para o exterior levando consigo alguns entes queridos. Na lista, entram a mulher, os filhos, a cunhada, duas assistentes, o médico pessoal com sua família e até o cachorro, mas não as quatro irmãs idosas: Marie, Rosa, Pauline e Adolfine. Adolfine, deportada para o campo de concentração de Terezin, é quem relembra o episódio com dolorosa mágoa.

Smilevski descreve, com maestria e detalhes, a trajetória de Sigmund Freud, com destaque, obviamente, no romance, à narradora, Adolfine. Pelas palavras da irmã, os leitores vão entrar em contato com a intimidade do famoso psiquiatra, suas fraquezas e como ele se relacionava com os parentes.

Desde a infância, Adolfine foi próxima do irmão, seu mentor. Depois, na fase adulta, veio o distanciamento e a sombra trágica da separação final. A narrativa trata da cosmopolita Viena na virada do século XIX para o século XX, descrita por Adolfine, sem marido, sem filhos, e cuja mãe a considerava uma inútil.

Adolfine era apenas a irmã de um gênio totalmente absorto na construção do próprio mito de novo profeta, destinado a libertar a humanidade das falsas crenças de que se alimentou durante séculos. Esquecida nas sombras da história, a irmã de Freud revive relações familiares gélidas, um amor trágico, o sonho não realizado da maternidade e a aceitação de encontrar a paz apenas no esquecimento tranquilizador de uma loucura autoimposta.

No romance, há também um intenso debate sobre teorias psicanalíticas, mostrando como elas não eram seguidas pelo próprio criador. Loucura, felicidade e sentido da vida estão enfocados na narrativa, especialmente numa inteligente discussão entre os protagonistas. Ousado, imaginativo, profundo e provocante são alguns dos adjetivos que a crítica usou para caracterizar a obra. Bertrand Brasil, 334 páginas,

mdireto@record.com.br


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