segunda-feira, 1 de março de 2010



01 de março de 2010 | N° 16261
L. F. VERISSIMO


A posteridade não é um lugar seguro

Não faz muito, saiu o livro de memórias de uma atriz que viveu com James Dean quando os dois eram jovens à procura de emprego na Broadway.

A ligação durou até Dean ir para Hollywood, onde – como sabe quem tem mais de 50 anos – ele fez três filmes, se transformou numa legenda e morreu num acidente de carro, não nesta ordem.

James Dean foi o rebelde sem causa original, um ídolo da adolescência incompreendida que os mais velhos, porque não a compreendiam, chamavam de juventude transviada. Cumpriu o ideal romântico de viver em velocidade, morrer cedo e ser um cadáver bonito, que é ainda mais atraente quando o cadáver não é o nosso.

Pela resenha que li, o livro trata seu assunto com carinho e não traz nenhuma grande revelação retardada – mesmo porque a bissexualidade de James Dean era conhecida há tempo.

Já outro livro recente sobre Saul Bellow, de James Atlas, uma biografia não autorizada mas tolerada, dá todos os podres do autor – misoginia, homofobia, racismo, arrogância intelectual, péssimo marido – enfim, tudo que você tem o direito de ser, se você é o melhor escritor da sua geração. A posteridade não é mais um lugar seguro, e ela não está mais nem esperando você morrer para fazer sua autópsia moral.

A História com “H” majestático tem sido revisada quase que mensalmente. Hoje, por exemplo, se aceita que as invasões da Polônia e da Escandinávia e a ocupação da França por Hitler foram menos atos de força do que pantomimas consentidas, o que os próprios alemães chamavam de “Sitzkrieg”, ou guerra falsa. Já que muita gente na Europa concordava com o objetivo maior dos nazistas, que era deter o comunismo.

Os ingleses e os americanos, ironicamente, ajudaram os russos a derrotar o que os outros viam como a última defesa do capitalismo ameaçado – mas não sem uma boa dose de “realpolitik” também. Há um discurso de Harry Truman quando ainda era senador e a Alemanha tinha recém invadido a Rússia em que ele propõe que se ajude a Rússia se os alemães estiverem ganhando, e a Alemanha se a Rússia começar a levar a melhor. O discurso foi desenterrado há pouco.

Razão tinha aquele general que instruía as suas tropas quando invadiam um país: “Matem os historiadores! Matem os historiadores!”

Tradição

Um pai diz para o filho que o pai do pai do seu pai tinha ensinado ao filho como pegar uma enxada para lavrar a terra, e o pai do seu pai tinha ensinado o filho a usar um torno e uma prensa, e o seu pai tinha ensinado o filho a preencher um fatura e dirigir um carro, e que ele só pedia ao filho que continuasse a tradição. Aí o filho suspirou e disse:

– Tá bem, pai.

E começou:

– Isto aqui é o mouse. Você dá um clique, assim, e...

Prazer secreto

Está bem. Eu sucumbi ao inevitável, aderi ao computador, me filiei à religião da informática, hoje sou um eletrônico convicto. Mas confesso que ainda sinto um perverso prazer ao ouvir a frase “Caiu o sistema”...

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