quinta-feira, 6 de agosto de 2009



06 de agosto de 2009
N° 16054 - PAULO SANT’ANA | MOISÉS MENDES - INTERINO

Sem moleza

Dia desses, sentei diante de um dos personagens dessa rede de escândalos que envergonha o Estado. Uma figura graúda, das que mais metem medo nos que conviveram com ele. Cruzei a perna com segurança e fixei o olhar na voz do personagem, porque nesses momentos se enxerga até a voz de quem fala o que todos gostariam de ouvir.

O homem me disse que não daria entrevista. Eu respondi que não queria entrevistá-lo. Queria só fazer um pedido. E então pedi, como quem pede algo banal, que pode estar ao alcance da mão: me deixe ver ou ouvir uma das fitas com as gravações mais quentes desse rolo todo de Detrans e caixa 2 de campanha.

A voz do homem saiu com uma nota só, segura, com linhas perfeitas como eletrocardiograma de atleta. E ele me disse: cabe à Justiça divulgá-las ou não.

Saí dali com as mãos abanando. Por que eu iria conseguir o que nem a repórter Adriana Irion conseguiu? Adriana já divulgou gravações com conversas assustadoras em ZH. Mas se sabe que há mais, que os grampos conhecidos são apenas a degustação. Falta o banquete.

O que os procuradores federais fizeram ontem atiça a curiosidade de quem aguarda o prato principal. Há um mar de saliva à espera do que ainda não foi divulgado.

Que conversas são essas? Quem fala com quem? Há mais do que diálogos de decoradores e paisagistas amadores sobre flores e bonsais? O homem me disse que sim, que as conversas são límpidas e diretas. Com cifras. Modalidades de pagamento. Partilhas. O Rio Grande que emerge dessa gritaria seria horripilante até para um maranhense.

A iniciativa do MP desfaz as suspeitas de que as provas seriam lendas, de que a mitologia criada em torno de todos os rolos teria amplificado o que há de real e desfigurado o que é verdadeiro, o que de fato existe. Os procuradores pediram o fim do sigilo das provas.

A Justiça nos dará acesso à parte que interessa dessa falação de 20 mil ligações telefônicas?

Desde a fuga do banqueiro Cacciola, em 2000, procurei conversar com promotores e procuradores envolvidos em grandes caçadas. O procurador Artur Gueiros não deixou o banqueiro em paz e conseguiu trazê-lo preso de volta ao Brasil oito anos depois. Gueiros posou, com justo orgulho, ao lado de Cacciola no aeroporto.

O promotor Sílvio Marques vasculhou e conseguiu localizar as contas de Maluf no Exterior e até levou o ex-governador para a cadeia – por alguns dias. O procurador Rodrigo de Grandis empenha-se agora na tentativa de incriminar Daniel Dantas e suas conexões na Operação Satiagraha.

Falei com todos eles, em momentos decisivos de suas ações, e todos me passaram com sinceridade o sentimento de que suas tarefas são incompletas, inconclusas. Porque não conseguem recambiar os recursos desviados (caso de Cacciola) ou por que os réus continuam soltos (Maluf).

O valente MP se protege então em algumas compensações paralelas de suas iniciativas, como o cerco da Receita Federal, a morte política dos acusados e a transformação de celebridades em zumbis.

Ontem, na apresentação da ação, o procurador Adriano dos Santos Raldi disse: – Não haverá moleza para esses réus assim como não há moleza para outros acusados.

Ouvi a frase e cheguei a cair em tentação. Trocaria a divulgação de provas e de gravações com diálogos repulsivos pela certeza de que não seremos frustrados. Mas agora quero ouvir as conversas. Já estou com as pernas cruzadas à espera do sim da juíza Maria Simone Barbisan Fortes.

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