terça-feira, 25 de setembro de 2007



25 de setembro de 2007
N° 15377 - Moacyr Scliar


Fazer e não fazer

Entre fazer e não fazer, os seres humanos preferem a primeira possibilidade.

Há para isto uma série de razões, a começar pelo fato de que a ação, seja ela qual for, ajuda a descarregar a nossa ansiedade. Claro, temos nossos instantes de contemplação e mesmo de preguiça, mas de uma maneira geral preferimos fazer alguma coisa a ficar imóveis, parados, inermes.

O último sábado foi o Dia Sem Carro, o dia em que as pessoas deveriam deixar de lado o automóvel. Ninguém pode ter dúvidas sobre o mérito dessa iniciativa, sobretudo num mundo ameaçado pelo aquecimento global.

O escapamento dos motores é responsável pela terrível poluição da atmosfera, que está acabando com a camada de ozônio e comprometendo a vida no planeta. Nessa insana corrida, o Brasil, infelizmente, é vanguarda: de acordo com as pesquisas, São Paulo é uma cidade mais poluída do que Los Angeles e Paris. Portanto, dizer não ao carro é uma boa.

Mas aí começam os problemas. Afinal, o carro não existe só para poluir, ele transporta pessoas. E como transportá-las sem veículos? A campanha dá uma resposta parcial: bicicletas. Ótimo:

bicicleta custa muitíssimo menos que carro, não polui e ainda proporciona uma oportunidade de exercício físico. O Brasil já tem 60 milhões de bicicletas, uma para cada três habitantes. Só que andar de bicicleta nas ruas brasileiras é, como todo mundo sabe, uma aventura arriscadíssima.

A solução seria a ciclovia, que já está sendo adotada em vários países. A pequenina Holanda tem 34 mil quilômetros de ciclovias. O gigantesco Brasil tem 2,5 mil quilômetros de ciclovias, 14 vezes menos.

E aí voltamos ao ponto inicial do comentário: do ponto de vista motivacional, seria muito melhor uma campanha que dissesse sim à bicicleta do que uma que dissesse não ao automóvel, ainda que a primeira implicasse automaticamente a segunda.

Mas é que dizer sim à bicicleta significa agir: comprar uma bicicleta, ir ao trabalho de bicicleta, passear de bicicleta. Falta, porém, a importante precondição que é a ciclovia.

Isto vale para outras situações relacionadas à saúde pessoal e à saúde ambiental. Todos sabem dos riscos do fumo. Mas o fumante tem pelo menos duas razões para fumar.

A primeira é a dependência química. A segunda é o fato de que fumar significa fazer coisas: comprar cigarros, tirar o cigarro do maço, acendê-lo, dar baforadas. Um ritual que, como todos os rituais, descarrega a ansiedade.

Lembro-me de uma pessoa a quem recomendei deixar de fumar e que me perguntou, angustiada: "E aí eu vou fazer o quê?" Deixar de fumar não deve ser uma medida isolada, mas sim parte de um estilo de vida que começa pelo exercício físico. Exercitar-se torna mais fácil deixar o cigarro.

A pessoa está fazendo alguma coisa e está se motivando para deixar de lado hábitos prejudiciais. Dia Sem Carro? Fantástico. Mas não seria melhor Dia Com Bicicleta, e, melhor ainda, Dia Com Bicicleta na Ciclovia? Chegaremos lá.

Pedalando, claro.

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