sábado, 16 de julho de 2016


16 de julho de 2016 | N° 18583 
DAVID COIMBRA

Não desligue!

Tinha uma reclamação a fazer sobre meu celular. Não recordo qual era a operadora, só sei que estava brabo. Liguei para a central de atendimento. A moça do outro lado da linha deu lá uma satisfação insatisfatória. Resolvi ser durão. Ela ia ver só.

– Então quero que você cancele esse meu número. E quero que cancele agora mesmo!

Já estava sorrindo de maldade, esperando que a moça rastejasse e implorasse pela minha permanência: não!, não se vá!, tudo menos isso, nós precisamos do senhor, tome aqui 60% de desconto!

Mas não foi o que aconteceu. Ela simplesmente suspirou e disse:

– Está bem. Sua linha está cancelada.

E desligou!

Maldição! Eu precisava daquele telefone. O que ia fazer sem celular? Teria de ligar de novo para a central de atendimento e pedir reativação? E se a mesma mulher me atendesse? Como era o nome dela mesmo? Judite? Eu não lembrava... E se ligasse e outro me atendesse e já soubesse do caso? Imaginei dezenas de atendentes, lá na grande sala deles, às gargalhadas, ouvindo as duas gravações, primeiro eu mandando cancelar e depois dando uma desculpa rota para reativar. Que vergonha...

Contei essa história, aliás verídica, para os funcionários da central de atendimento da Zero Hora, num encontro que tive com eles.

Nunca sou arrogante com o pessoal do telemarketing, juro, com exceção dessa vez que relatei. Até dou conversa, se tenho tempo. Afinal, eles estão cumprindo com sua obrigação, sustentando os filhos e tudo mais. Imagino o quanto de grosseria devem ouvir durante o dia. Porque, quando alguém de telemarketing liga, ele quer algo de você. Ou seja: ele é que precisa de você, você não precisa dele, e muitas pessoas são prepotentes com gente de quem não precisam.

Outra vez, muito tempo atrás, uma moça de um cartão de crédito me ligou:

– O senhor quer o nosso cartão de crédito?

Fiquei feliz:

– Quero, sim! Acho legal esse cartão de crédito! – Então, por favor, responda a algumas perguntas.

E fez ali um questionário comigo. Antes de desligar, avisou: – Em quinze dias, procuro o senhor.

Beleza. Trá-lá-lá. Segui minha vida feliz com a perspectiva de ter um novo cartão de crédito.

Quinze dias depois, ela cumpriu a promessa: – Alô. Era o senhor que queria o nosso cartão de crédito?

– Isso! Eu mesmo! Quando vocês vão me mandar?

– Ah, infelizmente não será possível. O senhor não preenche as condições para ter o nosso cartão de crédito. Fiquei não só pasmado como aparvalhado e estupefato.

– Pô – gemi –, eu estava quieto no meu canto, foi você quem me ligou. Por que você foi fazer isso? Para me humilhar?

Pois me humilhou. Hoje, sou uma pessoa melhor, devido àquela experiência.

O meu problema com o pessoal do telemarketing é que eles sempre me convencem. O cara está ligando para me dar um desconto, vou ganhar um monte de dinheiro se aceitar o que ele me propõe. Aí aceito tudo, concordo com novos planos, a ideia dele parece maravilhosa. Mas, no mês seguinte, a minha conta aumenta. Como pode? Então, ligo para a empresa, eles analisam o caso e, de alguma forma, provam que a culpa foi minha, eu é que fiz a coisa errada. Aí peço desculpas. E o atendente aproveita para me vender outro serviço. Sou a alegria dos serviços de telemarketing.

De toda maneira, insisto: as pessoas deviam tratar com mais candura o funcionário de telemarketing. Ele está só fazendo o trabalho dele. E, às vezes, pode ser um sujeito perigoso.

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