18
de janeiro de 2015 | N° 18046
MARTHA MEDEIROS
Atemporal
Este
é o conflito da personagem de Juliette Binoche. Ela é uma atriz que voltará a
atuar na peça que lhe consagrou e onde há uma forte tensão sexual entre duas
mulheres: uma jovem audaciosa e irreverente que manipula uma mulher madura.
Pois agora a atriz que deslumbrou o mundo 20 anos antes, interpretando a jovem,
foi escalada para fazer a madura. Naturalmente, há uma relutância em se render
a esse novo papel, pois lhe parece a confirmação de sua decadência. Mas não há
decadência nenhuma, apenas medo de enfrentar as mudanças que a passagem do
tempo provoca.
É um
filme de pouca ação, porém de muitas nuances. O ritmo do filme é tranquilo, só
ganha certa agitação com a entrada em cena da jovem atriz que dividirá o palco
com a atriz consagrada, quando fica claro que já não se fazem mais divas como
antigamente. As duas jantam num restaurante com o diretor da peça, e este só dá
atenção para a garota que é perseguida por paparazzi, que está envolvida numa relação
de amor clandestina, que vive cercada por seguranças. É a parte atraente do seu
currículo: o alvoroço que provoca em volta. Enquanto isso, a atriz veterana
descobre que se tornou invisível.
Será
mesmo que estamos todos condenados a um final melancólico? É inegável que temos
que abrir passagem aos que vêm atrás. Eles chegam com um frescor que já não
temos, com um código de comunicação que não dominamos, com uma urgência que
para nós não faz mais sentido. Tornamo-nos seletivos e serenos com o passar dos
anos, mas ainda há estrada pela frente e temos que dividi-la com aqueles que
têm menos bagagem e que correm mais ligeiro. Inevitavelmente, seremos
ultrapassados por eles, mas não há razão para interrompermos nossa viagem e nos
exilarmos em nossas memórias.
Há
uma forma de resistir ileso às diversas etapas da vida: não nos restringindo a
nenhuma delas. Não nos catalogando como jovem ou como velho. Sendo atemporal.
O
atemporal não reproduz comportamentos padrão. Não coleciona slogans nem
certezas. Não vira as costas para o novo nem para o antigo. Não é assombrado
por datas e idades: ele plana pela vida sem referências limitadoras, portanto,
nunca é inadequado.
Sempre
haverá um papel para ele.
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