quinta-feira, 15 de janeiro de 2009



15 de janeiro de 2009
N° 15849 - RICARDO SILVESTRIN


Não confunda

Ampliando aquela série conhecida de “não-confundas”, trago mais dois. Primeiro: não confunda mercado com sociedade. Segundo: não confunda consumidor com cidadão. Há, é claro, a esfera do mercado. Trata-se das transações de compra e venda e de valor percebido. A tal da lei da oferta e da procura. Mas sociedade é algo mais amplo. Não se reduz às questões numéricas.

O valor é relativo aos costumes, à cultura, à história. Alguém há de dizer, olhando só para o presente, “por que existe uma faculdade de filosofia?”, por exemplo. Se não há um grande valor de mercado hoje para isso. Mas não esqueça que aprendemos a nos pensar como indivíduos pela filosofia. O valor dela já foi dado há séculos. Tem um valor humano.

E pode continuar hoje sua trajetória, enquanto coisas com muito menos valor, nascidas ontem, têm que se virar para conseguir algum. Há a esfera do consumidor e seus direitos. Mas é menor do que a do cidadão. Pode alguém estar alijado do mercado de consumo, mas ainda assim tem que ter seus direitos de cidadão respeitados.

Fui ver a apresentação dos documentários dos alunos de uma cadeira do Curso de Realização Audiovisual da Unisinos, vulgo curso de cinema.

A gurizada de cerca de 20 anos mostra que ainda tem gente que sabe exatamente as distinções que fiz acima. Os temas escolhidos para os trabalhos estavam recheados de conteúdo humano. Um grupo expôs o ponto de vista de um morador de rua. Vimos sua história, suas questões, a fala de uma pessoa como qualquer outra.

Mas que não é vista como qualquer outra. Aliás, fazemos que não a vemos. Mas o cinema nos mostrou e nos fez enxergar, sobretudo, a nós mesmos.

Outro trabalho lançou um novo olhar sobre essa lenda urbana chamada Toniolo. Aquele das pichações. Outro debateu o Aeromóvel. E, por fim, um mostrou as ações do projeto Odomodê para as questões da cultura negra.

– Tem mercado para esse tipo de filme? – seria a pergunta usual. Tem. Não é grande. É formado pelas pessoas que acabam dando o perfil humano da sociedade. É a elas que, de tempos em tempos, até o mercado pede ajuda.

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