terça-feira, 9 de outubro de 2007



Os ratos seguem no barco

Gazeta Mercantil
9/10/2007


A tropa de choque que marcha à frente dos 45 comparsas de Renan Calheiros achou insuficiente revogar a decência e transformar o Senado no primeiro clube de cafajestes da terceira idade.

Além do enterro da moral e dos bons costumes, seus componentes também providenciaram a desmoralização de duas crenças promovidas a verdades incontestáveis pelo critério da longevidade. Foram reduzidas a crendices tão verossímeis quanto o Saci-Pererê ou a mula-sem-cabeça.

A primeira sustentava que, para qualquer político profissional, o instinto de sobrevivência eleitoral sempre prevaleceria sobre tudo o mais - amizades de infância, alianças históricas, convicções ideológica; tudo. Engano, informou a absolvição de Renan.

Para livrá-lo da guilhotina, os parceiros do pecador escalaram espontaneamente o cadafalso. Uns poucos tentaram camuflar a abjeção com minuetos patéticos. Os outros optaram pelo suicídio com o peito estufado de mussolini de hospício.

A segunda teoria desintegrada pelo bando garantia que, diante do naufrágio iminente, os ratos são sempre os primeiros a abandonar o barco.

O comportamento dos roedores a serviço de Renan sugere que alguma mutação genética resultou no surgimento de uma subespécie perturbadoramente audaciosa. Seus integrantes não tentam escapar da morte. Preferem esperar a bordo a consumação da tragédia.

Pior: confrontados com a ameaça letal, os ratos-do-senado fazem qualquer negócio para precipitar o desastre. O pelotão de sabotadores continua nos porões, agindo nas sombras.

Os demais sobem dos porões para combater no tombadilho, divididos em dois grupos. O primeiro trata de abortar tentativas de salvamento. O segundo cuida de manter a embarcação na rota que conduz ao afogamento coletivo.

No momento, tentam agarrar-se ao leme quatro espécimes que atrairiam multidões de visitantes ao mais mambembe dos zoológicos. Almeida Lima só ruge. Leomar Quintanilha só mia.

Wellington Salgado só berra. Gilvan Borges se expressa num dialeto ainda indecifrável. Miando, Quintanilha conseguiu fazer de Almeida Lima o relator de outro processo contra Renan. Rugindo, Almeida Lima anunciou que vai admitir críticas ao seu desempenho: promete revidar com "um sapatão na cara".

Caso se desencadeie a guerra dos sapatos, não convém contar com Welllington Salgado: essa versão devassa de Rapunzel estará usando o chinelinho novo que ganhou de Lula. Também Gilvan Borges estará desarmado. Ele só calça sandálias de couro cru (sem meias).

Combinam com os ternos de Gilvan: todos estimulam a suspeita de que o defunto era mais baixo e mais magro. O senador pelo Amapá explica que nunca foi de dar muito valor a trajes. A valores morais, sabe o país inteiro, ele nunca deu valor nenhum.

Se Deus poupou JK do sentimento do medo, algum anjo caído parece ter poupado a subespécie de remorsos e culpas.

Confiantes na indulgência das urnas e na lentidão da Justiça, os ratos-do-senado aparentemente não se deram conta do afastamento dos eleitores e da aproximação da polícia.

Logo descobrirão que, mesmo no Brasil, é possível passar um longo tempo fora da realidade, mas não viver uma vida inteira como os fora-da-lei dos velhos faroestes.

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