terça-feira, 16 de outubro de 2018



16 DE OUTUBRO DE 2018
DAVID COIMBRA

O erro das esquerdas

A maioria dos meus amigos é de esquerda. São pessoas bem-intencionadas, que estão perplexas com o que está acontecendo no país. Para muitos deles, há "uma onda fascista no país", a democracia brasileira "está em perigo", as eleições são "a luta da civilização contra a barbárie".

Eles estão errados. Mas não é por mal. Sei por que meus amigos pensam assim. As esquerdas são doutrinadas no pensamento binário da luta de classes. É o trabalho contra o capital, a elite contra o povo, a esquerda contra a direita. Por ironia, uma reprodução da crença cristã da eterna luta entre o Bem e o Mal, só que no terreno ideológico.

A sociedade moderna é mais complexa. Ao mesmo tempo, o sentimento do homem médio é mais simples: ele quer o melhor para si e para os seus, sem questionamentos ideológicos. Ponto.

É esse homem mediano que provavelmente dará a vitória a Bolsonaro no dia 28 e que, antes disso, em outras eleições, deu a vitória ao PT.

O homem médio não mudou de uma eleição para outra. Ele não se transformou, subitamente, em racista, misógino e homofóbico. O que mudou foi o Brasil.

É certo que o povo brasileiro é conservador. E é certo que existe preconceito entre os brasileiros. Muito natural: todos os povos do mundo são conservadores e em todos viceja certa dose de preconceito. As pessoas temem o diferente. Por conforto e por segurança, elas gostariam que tudo fosse sempre igual. Por isso, mudanças culturais são mais ou menos lentas e, em geral, não acontecem quando se usa a agressividade como meio de convencimento. Acontecem quando se usa o bom senso.

Vou tomar para ilustração dois dos maiores campeões da humanidade, dois derrubadores de preconceitos: Martin Luther King e Mandela.

Luther King era o contrário de Malcolm X. Luther King era pacífico, Malcolm X era belicoso. Luther King pregava a integração, Malcolm X defendia a separação - ele queria fundar uma América Negra, apartada dos brancos. Pouco antes de morrer, Malcolm X reconheceu que estava errado e aproximou-se de King, este, sim, o rei, o homem que mais fez pelos negros no Novo Mundo, talvez em todo o mundo.

Mandela experimentou essa luta dentro de si mesmo. Era terrorista, transformou-se em pacifista. Como pacifista, apenas pela força da palavra, transformou uma nação em quatro anos como presidente. Um gênio.

Há outros exemplos. A liberdade sorridente, leve e linda de Leila Diniz fez mais pelas mulheres brasileiras do que todos os discursos pelo empoderamento e contra o patriarcado já feitos no Facebook. A naturalidade na assunção de relacionamentos homoafetivos, como no caso da colega jornalista Fernanda Gentil e da minha amiga Priscila Montandon, faz mais pelos gays do que todas as cusparadas de Jean Wyllys.

É muito mais fácil convencer as pessoas pelo exemplo do que pelo insulto. Ou conversando.

Ou, simplesmente, ouvindo-as.

Mas as esquerdas não ouvem. As esquerdas falam.

O que o homem da rua está dizendo e que não é ouvido?

Que ele não quer mais esse sistema. Que não suporta mais a corrupção e o jogo de interesses. Que ele está com medo. Que ele teme por sua família. Que a liberdade vale pouco se não houver segurança.

O homem da rua acredita que Bolsonaro vai atender a essas demandas. Foi mérito de Bolsonaro conseguir convencê-lo disso. O eleitor de Bolsonaro, portanto, não é mau-caráter e nem quer que o Brasil recue para as sombras da barbárie. O eleitor de Bolsonaro é igualzinho ao do PT. Ele pode até já ter votado no PT.

O homem da rua, que hoje vota em massa em Bolsonaro, não raro cultiva seus preconceitos, mas também é capaz de ver a beleza no amor de duas pessoas do mesmo sexo, é capaz de desenvolver amizade sincera por quem tem cor de pele diferente da sua, é capaz de se mobilizar para ajudar quem possui menos do que ele.

Se Bolsonaro vencer, tomara que ele não decepcione o homem da rua. Tomara que pelo menos parte do que se espera dele se cumpra. Quanto às esquerdas, tomara que a derrota lhes sirva de aprendizado. Não para que aprendam a vencer de novo. Para que aprendam a ouvir.

DAVID COIMBRA

Um comentário:

Deivid Vincent Rezer Alves disse...

Embora eu discorde da maior parte do texto, uma parte está correta: "Ele não se transformou, subitamente, em racista, homofóbico", mas sim tinha esses sentimentos guardados, não alimentados, por acha-los errados. Mas agora ele tem um representante fiel, que pensa que nem ele, e vai fazer com que seus desejos mais ocultos sejam realizados. Mas não são todos. Ainda tem uma parcela dos apoiadores do Mussolini brasileiro que é parte da população que é executada, mas não se deu conta que está do lado errado da corda. Esses, os que concordam com tais absurdos, nunca leram, e talvez nem tenham ouvido falar, da República de Platão, do Príncipe de Maquiavel, do Leviatã de Hobbes, dos Tratados de Locke, Rousseau, Tocqueville, os federalistas. Então, por óbvio, não tem nem ideia do porquê de suas posições. Não é questão de direita e esquerda. É questão de qualquer coisa é melhor que um cidadão desqualificado, sem expressão em sua vida política, um deselegante, ignorante, sem propostas, sem propósito. Nem meu quase xará, David, tem noção de que o tal candidato não está nem à direita, nem a esquerda. Está em um patamar híbrido, onde está mais perto de um Frankenstein, que pegou tudo o que é mais nocivo do neoliberalismo e juntou com o que foi o que afastou o comunismo do poder. Menos direitos ao povo, repressão, abandono total dos trabalhadores em prol do lucro máximo para o empresariado. E o coitado do pequeno empresário, pensa que o lucro é pra ele. E pior, aqueles que tem benefícios conquistados pelas esquerdas, como aposentadoria, 13 salário, licença maternidade, tem ódio da esquerda. Vejam só, o camarada é tão desqualificado que nem precisei citar que ele é homofóbico, racista, misógino, antipobre e antitrabalhador. Para finalizar, até o momento, os seus apoiadores não conseguiram citar sequer um bom motivo para votar nele sem falar no PT. É uma paixão louca e desenfreada.