sexta-feira, 26 de outubro de 2018



Silêncio, palavras, brigas, diálogo? 


Alguns acham que tudo isso que está aí, esse mundão todo, que precisa sempre ser mudado, começou há apenas 13,5 bilhões de anos com o tal Big Bang. O Big Ben não existia naquele tempo para marcar a hora certa. A matéria, a energia, o tempo e o espaço surgiram do Big Bang e, a partir daí, "evoluímos" até sermos estes macacos de terno e gravata, portando iPhones e dotados da maluquice beleza que andam por aí. Como sou democrático, plural, transparente e humano e como não quero encrenca, cedo espaço nesta crônica aos ilustres criacionistas.

Pois segundo o Gênesis, primeiríssimo livro da Bíblia, no começo Deus criou o céu e a terra. A terra era um grande vazio, sem nenhum ser vivente e um mar profundo a cobria. A escuridão cobria o mar e o espírito de Deus se movia por cima da água. Bom, aí Deus começou a falar, apareceu o verbo. A verba veio bem depois, mas não botem a culpa nele. Deus disse: que haja luz! Separou a luz e a escuridão e criou o dia e noite. Deus seguiu falando, dividiu as águas, criou os seres vivos, os "pets", os humanos e no sétimo dia descansou.

Depois que Deus quebrou aquele maravilhoso silêncio da natureza, deu no que deu. Não quero discutir, cada um acredite no que quiser. Uns dizem até que foi Deus que criou o Big Bang e pronto. Boto fé na ciência, ciência na fé e vou adiante, não sei bem por quê e nem para onde. A resposta é a procura pela resposta. Eu não digo nada, estou em tempo de silêncio, depois desse período eleitoral babélico. Muitos quebraram o silêncio para ficar quebrando a cara e a paciência dos outros. A linguagem pode ser a fonte de mil mal-entendidos.

Ou não. Dizem os orientais que temos duas orelhas e uma boca, que é melhor ouvir duas vezes mais do que falar. As palavras são de prata, o silêncio é de ouro, diziam os antigos. Meu pai era italiano e de vez em quando, meio zen, me dizia que, muitas vezes, a melhor maneira de ganhar uma discussão era não começá-la. Silêncio, palavras, uns dizem que as melhores partes dos psicoterapeutas e mesmo dos humanos são os ouvidos.

Quando os psis ou nós falamos, o outro se dá conta de que todos andamos meio perdidos. Palavras nos aproximam e nos afastam. Na velocidade leporina destes tempos barulhentos, ouvidos e silêncios estão em baixa.

As pessoas querem mais dançar do que ouvir música. Os sons das aporrinholas eletrônicas e as "composições" dos DJs servem para isso, para anestesiar os ouvidos e botar a galera para sacudir o esqueleto. Escutar, então, parece ter ficado em algum lugar do passado, parece um verbo que se enclausurou num velho dicionário de papel, desses que quase ninguém mais abre. Em boca fechada não entra mosca, dizia-se.

Mas quem está interessado em ficar de boca fechada? De mais a mais, na Tailândia comem moscas e tudo o que se mexe, como gafanhotos, cupins e formigas. Qual o problema? Abra a boca, coma mosca, seja um ser globalizado.

A propósito... 

Passada a eleição tipo plebiscito muito louco, do terrível Fla-Flu de várzea profunda, com os times Arranca Toco e Quebra Canela batendo acima e abaixo da linha de cintura, quem sabe a gente toma tento, vergonha, paciência e conversa decentemente.

Quando um burro fala, o outro deve murchar as orelhas. Passou a etapa da regra sem regra: "do pescoço para baixo é canela", ainda bem. Um ciclo se fechou. Novas esperanças, planos e prazos para o parto do Brasil, que segue mais demorado que atendimento no SUS, finalmente aconteça. Palavras agregadoras, silêncios eloquentes, escutas caninas e diálogos produtivos, quem sabe?

O mundo ainda não acabou, parece. A História é uma criança e a democracia é a própria democracia, se renovando feito fênix, mais comprida que esperança de pobre e bombacha de alemão.
Jaime Cimenti

Jornal do Comércio (https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/colunas/livros/2018/10/653857-velhos-medos-novos-caminhos.html

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