segunda-feira, 30 de julho de 2018



30 DE JULHO DE 2018
CÍNTIA MOSCOVICH

O gato passa bem, obrigada


Nos últimos dias, me impressionou a imagem de um cavalo todo colorido por canetinhas e tinta guache, resultado da, digamos, "intervenção" de crianças de uma colônia de férias na Sociedade Hípica de Brasília. Segundo os responsáveis, tratava-se de uma "atividade pedagógica" para que os pequenos se aproximassem do bicho, fazendo "carinho" ao mesmo tempo em que utilizavam o corpo do animal como tela ou papel. Ou seja: um objeto sem ânimo.

Em tempos de justiceiros sociais e politicamente corretos, carradas de cinismo e aquela generosidade compulsória duma gente que se acha tão boa, o único ganho genuíno, creio, é a noção de piedade. Por isso, a pergunta que resta é: onde, naquele estábulo, estava a compaixão? O cavalinho não tinha nada que ficar sendo tocado, espetado ou molhado por sei lá quantas mãozinhas. O animal podia ter sido acariciado, penteado, mimado - como sabemos, os gaúchos, é o que se faz quando se quer que os piás aprendam a conviver com bichos.

Eu não deveria me surpreender. Pertinho de casa, numa creche particular que funciona num prédio sem habite-se já há quatro anos, numa segunda-feira foi encontrado um gatinho muito ferido e que, presumivelmente, havia ali se abrigado durante o fim de semana. A dona da creche, que tem jeito de vovó boa-gente, ao ver que o gatinho não reunia sequer condições de fugir, mandou que uma funcionária o descartasse no jardim do prédio ao lado. 

Que o jogasse fora, melhor dizendo, como se lixo fosse. A funcionária, penalizada, recusou-se a desampará-lo e procurou uma vizinha nossa que cuida de animais abandonados. Essa vizinha reuniu toda a quadra numa vaquinha para pagar veterinário para o gato - que havia fugido da casa de seu dono - e foi assim, bancando minha parte na clínica do bichano, que fiquei sabendo dessa história toda.

Quero dizer: anda bem em moda mostrar aos pequenos que animais são trastes, já em desuso os antigos exemplos de zelo e cuidado com a matéria viva. Me apavoro ao imaginar os valores ensinados e me aferro à certeza que quem desrespeita a vida indefesa não merece um pingo de respeito.

CÍNTIA MOSCOVICH

Um comentário:

nana disse...

só um aparte : nunca se viu -tambem - tanta frescura no tratamento de pets muito mais bem cuidados confortados agasalhados do que GENTE