segunda-feira, 10 de abril de 2017


10 de abril de 2017 | N° 18815 
CÍNTIA MOSCOVICH

NOLL E A SOLIDÃO

Na segunda, 3 de abril, fui homenageada na abertura da Semana Cultural do Colégio Anchieta – é praxe que o patrono da Feira do Livro de Porto Alegre receba homenagem nesse tradicionalíssimo colégio, assim como também seja patrono da bela feira do livro do Hospital São Lucas da PUCRS. (Na mesma ocasião, conheci um pouco mais do documentário Espia Só, sobre o maestro Octávio Dutra, dirigido por Saturnino Rocha e produzido por Carlos Peralta.)

O evento no Anchieta foi emocionante e, para mim, providencial. Desde a semana anterior, quando fomos surpreendidos com a morte do escritor João Gilberto Noll, eu andava com um sentimento desiludido. Minha tristeza se devia a um texto do poeta Fabricio Carpinejar em que ele lamentava a absoluta ausência de representantes do poder público no enterro – exceto pelo secretário da Cultura de Porto Alegre Luciano Alabarse, que era amigo do Noll.

Tive de sair do velório antes do enterro e não estranhei que houvesse poucas pessoas além dos familiares: o Noll era de natureza reservada. Também pensei que ele não precisava de homenagens, uma vez que foi reconhecido e aplaudido em vida. Porém, saber que não houve um só político para estender a mão à família no enterro muito me chocou. Era como se a morte de um dos maiores autores do país tivesse passado batido pelos gaúchos. Pior: a suspeita de que a sociedade não fazia questão de ter escritores entre seus membros se confirmava.

Considerei que escritores encarnam o sonho de letramento que, num país brutalizado como o nosso, até parece pernóstico. Já ia me conformando com a ideia de que a literatura era supérflua, quando chegou a hora de atender o compromisso no Anchieta. Quando cheguei ao colégio, lembrei da alegria da Feira do Livro de Porto Alegre. Lá dentro, fui recebida com toda a deferência e respeito do mundo.

Quando, horas depois, cheguei em casa, toda a tristeza se havia ido. Entendi que os escritores escrevem para o tempo e para o depois – e que a solidão e o silêncio são dádivas. E que muita gente, inclusive vários políticos, jamais vão entender nada disso.

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