CEM DIAS DE OBAMA
Obviamente que as previsões negativas não se confirmaram. Obama não fez grande coisa. Os tempos são duros. Mas já é muito mais e melhor do que todo o período Bush. O reacionarismo medieval ficou para trás. Obama vale, antes de tudo, pelo símbolo.
E é nos símbolos que ele tem arrasado. De cara, ordenou o fechamento da prisão de Guantánamo. A execução será lenta. O primeiro passo, contudo, foi dado. Com esse gesto limitado, devolveu os Estados Unidos à democracia plena, acabando com a era dos tribunais de exceção.
A medida mais importante, porém, foi outra, pelos seus aspectos práticos e simbólicos: o Ato Lilly Ledbetter. É a lei que iguala os salários de homens e mulheres em mesmas funções. Os conservadores não queriam. Achavam normal que mulher ganhasse menos pelo mesmo trabalho. Afinal, pelo que se podia entender dos seus argumentos pífios e machistas, as mulheres existem para secundar os grandes e até os pequenos homens.
Lilly Ledbetter trabalhou na fábrica de pneus da Goodyear Tire & Rubber, em Gadsden, Alabama. Depois de 19 anos de serviço remunerado indevidamente, ela processou a empresa por discriminação. A Suprema Corte americana rejeitou o pedido de indenização, alegando prescrição. A Justiça costuma encontrar boas razões para perpetrar o mal.
O republicano John McCain era contra a equiparação por uma razão tida pelos conservadores como de extremo bom senso: o aumento no número de processos de mulheres contra seus empregadores. Na mesma linha, os senadores republicanos chegaram a vetar o projeto de lei. A farra acabou. Ufa!
Obama de bobo não tem nada. Sabe que, para avançar, precisa, em primeiro lugar, não recuar. Parece muito pouco. Pode ser muito. Certamente por isso liberou o financiamento público para entidades que defendem o aborto. Na política internacional, está disposto a tirar os Estados Unidos do atoleiro do Iraque.
O forte de Obama é a sua capacidade de fazer o óbvio: governar para o mundo atual. Nem a violência da crise econômica conseguiu derrubá-lo até agora. Está salvando o capitalismo americano das mãos sujas de alguns capitalistas americanos. Em praticamente tudo, com elegância e prudência, Obama tem sido o contrário de Bush. O caubói texano passava uma imagem de bronco e de radical.
Era a sua melhor expressão de coerência: a imagem correspondia plenamente ao homem. Obama representa o equilíbrio e a sofisticação. Mesmo assim, visto que há louco para tudo, não faltam viúvas para Bush. No Brasil, a revista Veja chora de saudades dos bons tempos do neoliberalismo sem constrangimentos em que podia insultar qualquer oponente.
A farra acabou. A principal contribuição de Obama para a humanidade é ser ele mesmo. A sua presença no cenário político internacional sinaliza a cada instante uma vitória contra o preconceito. Obama é como um totem. Em torno dele, a democracia atualiza a igualdade entre os homens.
Um país rico absorve os símbolos mais facilmente. A tragédia dos pobres, como a Bolívia, é que seus símbolos não possuem margem de manobra. Brasil, Bolívia e Estados Unidos provaram com presidentes atípicos que a era dos doutores, dos coronéis, dos caubóis e dos caciques pode estar com os dias contados.
juremir@correiodopovo.com.br
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