sexta-feira, 29 de março de 2013


ROBERTO RODRIGUES

Meu porto, minha vida

A medida provisória dos portos tem boa chance de obter avanços. Espera-se que logo as filas de caminhões sejam coisa do passado

Chega a ser espantosa a reação geral quanto ao recorrente fenômeno do congestionamento de caminhões no porto de Santos. Afinal, todo ano isso acontece, e não só em Santos, mas também em Paranaguá.

Há anos, os mais diversos especialistas comentam que o principal gargalo do agronegócio brasileiro é infraestrutura e logística. E vêm pedindo rapidez na implementação das obras do PAC ligadas ao tema.

E neste ano, com uma safra recorde de grãos (especialmente da soja, uma vez que colheremos 85 milhões de toneladas, superando pela primeira vez a safra americana), era superevidente que teríamos esse triste espetáculo das filas quilométricas para descarregar nos portos.

Além disso, ao largo do porto, dezenas de navios ancorados esperam para carregar os grãos oriundos das competitivas zonas produtoras, ou para descarregar os fertilizantes que os mesmos caminhões levarão de volta àquelas regiões, para que seus agricultores já se preparem para a safra do ano que vem.

Com isso, os produtores perdem duas vezes: como os caminhões demoram para descarregar a soja -ou o milho-, acabam servindo de armazém. Mas um armazém caríssimo, evidentemente, sem falar na irritação que toma os motoristas que perdem tempo, dinheiro e ficam mais dias longe de casa.

Mas também perdem pela demora do descarregamento de fertilizantes dos navios, pois cada dia parado ao largo tem um custo, chamado "demurrage", que vai a dezenas de milhares de reais por dia. Ora, quem paga isso? O produtor, é lógico, uma vez que esse custo adicional lhe é repassado no preço do fertilizante.

É claríssima, então, a perda dos agricultores em geral, representada pelos custos inflados e em função de um problema sobre o qual eles não têm nenhuma responsabilidade. Os mais prejudicados são os produtores de regiões distantes, uma vez que as cargas vêm por caminhão, muito mais caro do que trem, que também não há suficientemente.

Pelo menos parte do custo também é repassada aos consumidores, de modo que todo mundo perde.

Mas há algo ainda mais grave. No ano passado, o agronegócio brasileiro teve um saldo de US$ 79 bilhões em sua balança comercial externa: essa é a diferença positiva entre o que o setor exportou e importou. E o saldo comercial total do Brasil foi de US$ 19 bilhões, incluído o agronegócio. Ou seja, o desempenho do agro salvou o saldo do país e, de quebra, garantiu as reservas cambiais.

Portanto, quanto mais o agronegócio exportar, melhor será para o país. Não apenas para o agricultor, mas para todos os brasileiros, que se beneficiam do fato.

Outro dado: há dez anos, em 2002, o agronegócio exportou US$ 24,8 bilhões. No ano passado, US$ 95,8 bilhões, quase quatro vezes mais. Ora, de novo todo o país e seus cidadãos ganham com esse crescimento, que cria riquezas, renda e empregos diretos e indiretos.

E, se deixarmos de exportar, sofrem todos os brasileiros.

As dificuldades de logística já fizeram a China cancelar dez navios de soja encomendadas ao Brasil, ameaçando fazer o mesmo com outros tantos ou mais. E se a moda pega?

Bem, depois de anos de incisivas reclamações de técnicos e exportadores, o governo finalmente tomou decisões importantes quanto às concessões na área de rodovias e ferrovias, abrindo ao setor privado uma oportunidade de investir com lucro. Isso vai acontecer, mas demora, não só pelo fato em si (projeto e execução), mas também pela burocracia, especialmente das licenças ambientais.

E, por último, o governo e o Congresso estão trabalhando vigorosamente em uma medida provisória que busca equacionar o problema dos portos, com boa chance de obter avanços notáveis. Aliás, nos últimos dias as filas até melhoraram com essa perspectiva.

Esperamos que, em três ou quatro anos, as filas intermináveis sejam coisa do passado. E todos os brasileiros possam se beneficiar do aumento das exportações e, com orgulho, dizer: "Meu porto, minha vida"...

ROBERTO RODRIGUES, 70, engenheiro agrônomo, é coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas.

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