07 DE AGOSTO DE 2018
CARPINEJAR
Empoderada Carla
Minha irmã já era empoderada nos anos 70. Sempre foi empoderada.
Ela sobreviveu a um mundo masculino de três irmãos. Foi a nossa guia, a nossa Joana D?Arc. Abriu os caminhos para que cada um pudesse expressar as suas opiniões.
Com 14 anos, já dirigia. Com 15 anos, viajou para a Europa sozinha, na fé e na coragem de uma mochila. Com 16 anos, entrou em Direito na UFRGS. Com 18 anos, foi morar sozinha. Com 21 anos, foi laureada na universidade. Com 22 anos, alcançou a aprovação em primeiro lugar no Ministério Público. Ela quebrou todos os recordes, lá na família, de independência de pensamento e convicções.
Quando discutia, ela não gritava: explicava os seus argumentos com um sorriso. Ninguém ganhava dela com aquele riso demolidor ao final. Sorriso de quem tinha razão e, ainda de sobra, demonstrava ternura. Por uma injustiça, ela ia até o inferno e voltava. Só trocava de roupa, como se não houvesse acontecido nada.
É superdotada, é comovida, é atenta.
Eu tenho orgulho de minha irmã Carla. Ela não tem ideia de como é amada pelos pais e irmãos. Talvez porque sempre esteve à frente de nosso tempo, o que dificultava um abraço. Nunca a vi parar. Para conversar, ela dizia: - Vem junto? E tinha que ir atrás, não importava o destino, e voltar de ônibus depois.
Foi uma segunda mãe e um exemplo de mulher bem resolvida.
Ela me ensinou geometria e física e me salvou das recuperações. Ela organizou a minha primeira festa da turma e proibiu que a mãe pisasse na garagem, para não me constranger. Ela me deu aulas de direção. Ela me ensinou a dançar colado, com George Michael. Ela me esclareceu que beijo não era liquidificador. Ela me explicou como se fazia uma massa para não passar fome. Ela me convenceu a nunca mentir, mas a contar a verdade por antecipação, para que o outro pudesse desfrutar de tempo para aceitar. Ela pagava o aluguel dos filmes para mim, o que me tornou um cinéfilo apaixonado. Ela me inspirou a ser poeta, não se cansava de elogiar os meus textos para os seus amigos mais velhos.
Apenas não pude sonhar em ter uma irmãzinha porque ela nasceu antes de mim. Quando vim ao mundo, já contava com os seus cabelos cheirosos pela casa e aquele riso - que riso demolidor! - como a me avisar que seria difícil viver, mas tudo daria certo.
carpinejar@terra.com.br - CARPINEJAR
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