sábado, 28 de setembro de 2013


28 de setembro de 2013 | N° 17567
EDITORIAL

CIDADES ENGARRAFADAS

Tem saída? Estudo divulgado nesta semana pelo Sindicato da Arquitetura e da Engenharia do Rio Grande do Sul afirma que, em menos de três décadas, a Grande Porto Alegre terá quase o dobro de carros da frota atual, com praticamente um veículo por habitante ou seja, cerca de 3 milhões de automóveis.

No mesmo dia, a população de São Francisco do Sul, no extremo norte de Santa Catarina, passou momentos de angústia e pânico num engarrafamento de trânsito na saída da cidade, quando tentava fugir da fumaça causada por um incêndio de produtos químicos na área portuária. A cidade tem apenas 43 mil habitantes, mas o engarrafamento de veículos em fuga atingiu a extensão de 10 quilômetros.

Se tiver saída, certamente não será de carro.

Metrópoles brasileiras, cidades médias e até pequenas vivem hoje um verdadeiro caos, provocado pelo excesso de veículos. E a tendência é piorar, pois as frotas urbanas aumentam em proporção maior do que o crescimento populacional e não há qualquer possibilidade de que obras viárias solucionem o problema.

O alargamento de estradas, a construção de rodovias, viadutos e túneis, a instalação de equipamentos de sinalização e controle, o estímulo ao transporte coletivo e a criação de corredores exclusivos são políticas públicas que até podem atenuar os atuais transtornos, mas dificilmente os extinguirão. A questão maior, irresolvível no momento, é a cultura do automóvel, baseada em valores que nem sempre se materializam: conforto, status, segurança e agilidade.

Não é exclusividade brasileira nem sul-americana. Na Europa, na Ásia e na América do Norte, o culto ao automóvel também provoca polêmicas intermináveis e situações desconcertantes.

Uma pesquisa norte-americana sobre estresse mostrou que, de cada 12 ataques car- díacos masculinos, um tem relação com engarrafamentos, incomodação no trânsito e contato com a poluição. Reportagem da revista The Economist registrou que os engarrafamentos na capital da Tailândia são tão demorados, que os motoristas costumam carregar garrafas plásticas para urinar quando estão presos no trânsito. Tem saída?

Ampla, geral e irrestrita talvez não tenha, mas tem escapes – que é o que se busca na hora do engarrafamento.

O modelo europeu de atenuar o problema consiste em investir no transporte público e dificultar a vida dos indivíduos que optam por carro próprio. O modelo americano contempla a engenharia de trânsito e soluções inovadoras de tecnologia para fazer o tráfego fluir melhor. Nenhum dos dois resolve completamente o problema.

É verdade que os sistemas de transporte público funcionam bem nas principais cidades europeias, especialmente o metrô. Nas cidades mais organizadas, os ônibus são pontuais, limpos e confortáveis, além de operarem com tarifas acessíveis. Além disso, em alguns locais, metrôs, bondes e ônibus não só oferecem tarifas promocionais como também as conjugam com ingressos para eventos culturais.

E o estímulo à bicicleta também ajuda muito, especialmente em localidades com ciclovias modernas. Ainda assim, para aliviar os congestionamentos, os governantes veem-se obrigados a penalizar os condutores, elevando os impostos sobre combustíveis, cobrando pedágio em áreas centrais e aumentando o preço dos estacionamentos.

Há cidades alemãs em que as prefeituras só autorizam a construção de prédios sem garagem, para desestimular o uso do carro. Punir quem anda de carro e premiar quem opta pelo transporte coletivo não resolve tudo, mas está ajudando os europeus a se estressar menos.

Nos Estados Unidos, tais restrições são impensáveis. Os norte-americanos são apaixonados por carros e desfrutam de condições econômicas para consumi-los. Então, optam por estradas amplas, rodovias de alta velocidade e muita tecnologia, especialmente em sistemas de monitoramento de tráfego e de sinalização.

No Brasil, infelizmente, não temos soluções tecnológicas de vanguarda como os norte-americanos nem o espírito comunitário que leva os europeus a aceitarem regras no limite do arbítrio. Aqui, o transporte coletivo é ruim, os metrôs são raros e até mesmo obras viárias necessárias parecem complicar mais o trânsito do que desafogá-lo. Com o aumento do poder aquisitivo da população, a busca por carros se intensificou e as cidades se transformaram em verdadeiros bretes. Tem saída?

Tem, mas precisa conjugar mudança de mentalidade por parte dos cidadãos, ousadia administrativa por parte dos governantes e rigor por parte das autoridades.

O modelo europeu de atenuar o problema consiste em investir no transporte público e dificultar a vida dos indivíduos que optam por carro próprio.


O modelo americano contempla a engenharia de trânsito e soluções inovadoras de tecnologia para fazer o tráfego fluir melhor.

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