quinta-feira, 25 de novembro de 2021


24 DE NOVEMBRO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

ENEM E INCLUSÃO

Todos os alertas emitidos desde o ano passado sobre os impactos negativos da pandemia especialmente na educação pública, com implicações sociais futuras preocupantes, começaram a se materializar na edição em curso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), cuja primeira prova foi aplicada no último domingo e, a segunda, está prevista para o próximo fim de semana. Foram, neste ano, apenas 3,1 milhões de inscritos, o menor número desde 2005. À época, é preciso sublinhar, a avaliação ainda não era usada para o ingresso em universidades públicas, o que depois viria a se tornar um atrativo ainda mais potente para o exame.

Foi inúmeras vezes reiterado que os alunos da rede pública, que atende em maior proporção crianças e adolescentes das classes mais baixas, enfrentaram maiores obstáculos de aprendizado ao longo do período de escolas fechadas devido à pandemia. As causas são conhecidas e foram repetidas à exaustão: dificuldade de acesso a internet de qualidade para as aulas remotas e a equipamentos adequados. Alguns, desmotivados, abandonaram os estudos. Outros, em um período de incerteza econômica e elevado desemprego, tiveram ainda de ajudar a família a obter a renda necessária para as primeiras necessidades e também quebraram os vínculos com as salas de aula.

A abstenção no Enem anterior já foi elevada pelo temor com a pandemia. Para a edição deste ano, surgiram adversidades adicionais, como a resistência do Ministério da Educação a isentar da taxa de R$ 85 os que faltaram mas não justificaram a ausência. A dificuldade em arcar com mais um custo, por óbvio, afeta os estudantes mais carentes e é um fator desencorajador. Os resultados não poderiam ser diferentes. O número de inscrições entre jovens negros caiu 53,4% e o de pardos recuou 52%. Entre estudantes brancos, o recuo foi de 36,1% mas, como foi menor, a participação no total de candidatos aumentou. Em relação à escolaridade, a maior redução foi entre os que tinham o Ensino Médio concluído (60%), aptos para ingressar em uma faculdade.

Associado a outras políticas públicas na área da educação, o Enem se tornou, nos últimos anos, um relevante instrumento para democratizar o acesso ao Ensino Superior no país. Não apenas em universidades públicas, por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), mas também em instituições privadas, através do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), que concede bolsas. Não é novidade que frequentar uma faculdade representa maiores chances de colocação no mercado de trabalho e a possibilidade de melhor remuneração. Para jovens de origem humilde, é a janela para ascensão profissional e para a construção de um futuro próspero e de oportunidades. Com isso, criam-se condições para uma mobilidade social mais significativa e a consequente redução da desigualdade que envergonha o Brasil.

Os números expostos acima, no entanto, indicam que esta política de inclusão pode sofrer um revés, cuja dimensão ainda não é conhecida. Seria, no entanto, um grave retrocesso. Todos os esforços devem ser direcionados para evitar uma tragédia geracional, como advertem desde o ano passado especialistas em educação, instituições da área e organismos internacionais. Não há saída fora do fortalecimento do ensino público que recupere os prejuízos no aprendizado e uma atenção ao Ensino Médio, com a criação de um 4º ano optativo, por exemplo, como vêm fazendo alguns Estados, entre eles o Rio Grande do Sul, além do combate à evasão escolar. É preciso combinar ações de curto e longo prazos. Ao fim, é o próprio potencial de desenvolvimento do país que está em jogo.

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