terça-feira, 31 de agosto de 2021


31 DE AGOSTO DE 2021
DAVID COIMBRA

O melhor bar da história de Porto Alegre

Para que serve o bar? Os mais conservadores responderão, não sem certo tom de censura, que serve para beber. Trata-se de uma redução. Na verdade, as pessoas vão ao bar para se encontrar. Elas querem ver outras pessoas, conversar com outras pessoas, talvez até, se tudo der certo, amar outras pessoas.

Então, o bar é basicamente um lugar de confraternização, um lugar para o exercício da amizade, do amor, do companheirismo. Em resumo, um lugar do bem. É claro que podem ocorrer desavenças no bar, brigas sérias e casos de polícia. Claro. Os seres humanos são assim, quando se reúnem, porque estão sempre disputando espaço. No entanto, a ideia do bar é o congraçamento, e não a disputa.

Talvez o melhor filme já feito sobre o bar tenha sido Bar Esperança, o Último que Fecha, do começo dos anos 1980, com Hugo Carvana, Marília Pêra, Betty Faria, Paulo César Pereio, entre outros craques. A alegre anarquia que se procura em um bar foi capturada por esse filme. Um bar tem de ser como o Esperança: libertário e, ao mesmo tempo, aconchegante.

Qual foi o melhor bar da história de Porto Alegre?

O jornalista Paulo César Teixeira, o "Foguinho", está lançando um livro acerca de um dos candidatos, o antigo Bar Escaler, que ficava nas franjas da Redenção. O livro é o depoimento que Foguinho colheu do fundador do bar, o Toninho do Escaler. Toninho narra, em primeira pessoa, tudo o que aconteceu naquele pedaço de Porto Alegre nos feéricos anos 1980, quando o Escaler chegou a conquistar o título de maior vendedor de cerveja do Brasil.

Fui poucas vezes ao Escaler. Naquela época, estava morando em Santa Catarina e frequentava outros bares. Mas tenho a impressão de que o espírito do Escaler era o mesmo em diversas partes do país, um espírito de liberdade, de crença no futuro e até de alguma ingenuidade nas relações humanas. Tudo isso foi muito típico dos anos 1980.

Não estou fazendo essa afirmação por nostalgia, aquela coisa de "no meu tempo era muito melhor". Não. Os anos 1980, no Brasil, foram diferentes devido às circunstâncias históricas. O Brasil estava se redescobrindo, saindo da ditadura, recebendo de volta os exilados, na expectativa de enfim votar para presidente. Havia novidades palpitantes na literatura e no jornalismo, e na música estouravam Chico, Caetano, Roberto, Belchior, Paulinho da Viola, Milton, Gil, João Bosco, além do novíssimo rock brasileiro. Quer mais?

Assim, os bons bares incorporaram esse espírito. Havia muitos bares Esperança no Brasil. Um deles, o Escaler. Um livro como esse do Foguinho é fundamental, porque registra um naco da história afetiva da cidade. Deveríamos produzir mais narrativas como essa. Deveríamos tentar responder, afinal: qual foi o melhor bar da história de Porto Alegre?

DAVID COIMBRA

31 DE AGOSTO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

O 7 DE SETEMBRO É DE TODOS

Crescem as apreensões, nos últimos dias, com a escalada de tensões e possíveis desdobramentos das mobilizações convocadas para daqui a uma semana, no 7 de Setembro, data cívica que marca a independência do Brasil. O direito à manifestação e à reunião é uma garantia constitucional e fundamental nas sociedades democráticas e, portanto, pode e deve ser livremente exercido. Mas há limites, como a possibilidade de outras prerrogativas de indivíduos e instituições previstas na Carta serem violadas.

É dever dos poderes e das lideranças responsáveis, portanto, calibrar declarações e unir esforços para evitar qualquer risco de os protestos que se avizinham em meio à crise institucional atravessada pela nação descambarem para atos que fujam à normalidade. Haverá, no mesmo dia, atos convocados por opositores do governo federal, ao menos em São Paulo, e da mesma maneira é primordial a busca por serenar ânimos.

O 7 de Setembro pertence a todos os brasileiros e não deve ser reclamado ou usado por um grupo político ou ideológico específico que tente confundir o significado da data cívica com seus próprios objetivos egoístas. O Dia da Pátria, ao contrário da radicalização e da beligerância, deve ser a celebração pacífica e ordeira das melhores qualidades que marcam a formação da sociedade brasileira, como a pluralidade, a generosidade, a hospitalidade e, principalmente, a tolerância. Por seu simbolismo, seriam mais convenientes discursos e gestos que preguem a harmonia dos três poderes e o equilíbrio entre os entes de Estado, e não reações exaltadas ou interpretações equivocadas do texto constitucional.

É o momento de apaziguar. Não de alimentar delírios e, mesmo veladas, incitações a qualquer tipo de ruptura, violência institucional ou adesões de categorias como as ligadas à segurança, que por suas características, funções, legislações e regulamentos têm de ser fiéis ao Estado democrático de direito e à hierarquia e manter-se afastadas da disputa política. Tentativas reiteradas de demonstrar força muitas vezes apenas desnudam fraqueza.

Eventuais exacerbações indesejadas tendem a ter reflexos negativos em indicadores econômicos e degradar ainda mais as relações entre cidadãos e entre os poderes. Desperdiçam-se, neste momento, a energia e o foco que deveriam estar direcionados a combater e solucionar os problemas reais do país e que afligem a maioria silenciosa: vacinação, desemprego, inflação, crise hídrica e reformas, entre outras prioridades. A disputa pelo poder será resolvida na primavera de 2022, com o desejo dos eleitores sendo expressado nas urnas. Enquanto isso, o 7 de Setembro deve ser reverenciado como uma data de celebração do respeito e da convivência pacífica entre todos brasileiros. 


31 DE AGOSTO DE 2021
RISCO NO SISTEMA

Em crise, mas com potencial

O RS está no foco da escassez energética do país e demanda geração de outras regiões, mas tem projetos para virar o cenário

Com novos projetos de usinas que têm potencial de geração de energia superior aos 14 gigawatts (GW) de Itaipu, o Rio Grande do Sul está no centro da crise hídrica, que ameaça a disponibilidade de energia elétrica no país. Em diferentes estágios e regiões, o mapa dos investimentos previstos elevaria em 125% a capacidade de energia produzida no Estado, dos atuais 7,1 GW para 15,89 GW.

Os aportes superam R$ 80 bilhões em plantas hidrelétricas, termelétricas e eólicas. As usinas, segundo relatório da Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), estão localizadas na região da Serra e na fronteira com a Argentina e somam 15,5 GW de capacidade. Já os eólicos contemplam Litoral, Costa Doce e fronteira com o Uruguai, com capacidade de 390 megawatts (MW).

Para se ter ideia, a região sul do Brasil atualmente possui 30 GW de capacidade instalada, um quarto dos quais no RS (7,145 GW) . Isso equivale a 23% do total da geração de energia elétrica no país. As hidrelétricas representam 83% da matriz regional.

Os três Estados (RS, SC e PR) contam com 14% da população brasileira, mas utilizam 17% da energia disponível no país. O consumo total, per capita, também é 14% superior à média nacional. Quando a análise é o uso residencial da Região Sul, percebe-se que a demanda supera em 12% a média do Brasil, de acordo com dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Segundo a mesma base de dados, desde 2013, no lançamento do Plano Decenal de Energia, já havia previsão de aumento na demanda em 40%, até 2022.

- Temos uma Itaipu, bem aqui dentro (no RS), em pequenos projetos. Se tivermos mais celeridade poderemos avançar, não só em energia, mas em geração de renda e no preparo para futuras crises que virão - afirma o coordenador do Grupo Temático de Energia e Telecomunicações do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Edilson Deitos.

Segundo ele, mesmo que a lógica do sistema nacional seja a integração e os investimentos em geração ocorram onde o custo é mais baixo, a capacidade dos projetos gaúchos não deve ser desprezada. Mas, no papel, não amenizam a situação atual, que começa nos reservatórios das hidrelétricas, em 2019, e chega, agora, de modo mais efetivo ao bolso dos consumidores com reajuste de tarifas.

O professor Guilherme Fernandes Marques, coordenador do Núcleo de Pesquisa em Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos (Gespla) da UFRGS, explica que a intensificação da estiagem, na maior escassez de chuvas dos últimos 91 anos, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), esvaziou os reservatórios de água das principais hidrelétricas do país, que respondem por 64,9% da matriz energética nacional.

Como o modelo de operações é o Sistema Interligado Nacional (SIN), quando uma determinada região está com baixo estoque, a geração é concentrada em outra com maior disponibilidade. Assim, é feito o intercâmbio de energia entre regiões, com o uso das linhas de transmissão que conectam o país.

Em 2019, o Rio Grande do Sul consumiu 88,7 gigawatts por hora (GWh) e produziu 136 GWh. Mesmo que o sistema seja integrado, até este momento, a relação era superavitária. No entanto, Estados das regiões Sul e Sudeste, antes exportadores, agora demandam eletricidade de outras unidades, dentro do SIN.

Agravamento

Com a intensificação da estiagem, a seca chegou à bacia do Rio Paraná e, em 2021, o Sul passou a receber energia do restante do país. O subsistema Norte, antes importador, produziu excedentes e lançou 3,595 MW no sistema interligado nacional, em janeiro deste ano.

Agora, com baixa disponibilidade de água tanto no Sul quanto no Sudeste, comenta o professor da UFRGS Guilherme Fernandes Marques, é necessário segurar ao máximo os reservatórios para ampliar a capacidade de geração ao longo do tempo. Isso acontece porque, em níveis muito baixos, as turbinas hidrelétricas não operam.

- É preferível gerar um pouco menos de energia por um tempo para ampliar os reservatórios do que continuar em condições normais e, de repente, ter de interromper a geração. Se parar, aí, sim, existe um alto risco - analisa o professor Marques.

Antes disso, de modo preventivo, em novembro de 2020, o ONS já havia recomendado o uso de termelétricas com o objetivo de poupar a água dos reservatórios. A medida, sempre que necessária, encarece o custo de produção, uma vez que estas usinas precisam arcar com preço dos combustíveis (óleo, gás, carvão), inexistentes na geração hídrica.

Algumas termelétricas demandam até R$ 2 mil por MW/hora, enquanto nas hidrelétricas os valores são inferiores a R$ 300 por MWh. Por esta razão, o Ministério de Minas e Energia já projeta que, além dos repasses consolidados, o acionamento das usinas térmicas resultará em custo adicional de R$ 9 bilhões aos consumidores.

O coordenador da Fiergs Edilson Deitos confirma que o momento é delicado, mas diz que as medidas possíveis foram adotadas. Para ele, as políticas do sistema elétrico têm efeito de longo prazo e, por isso, muito da atual conjuntura é consequência da Medida Provisória (MP) 579, convertida na Lei Federal 12.783 de 2013.

Naquele momento, foram privilegiadas as chamadas usinas fio d?água, ou pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Ou seja, com reservatórios apenas para a regularização diária ou semanal, mas com baixa capacidade de armazenamento.

- Isso mostra o quanto a falta de grandes reservatórios gera impactos ambientais, econômicos e sociais. É o momento de analisar a grande dependência que temos em energia e não gerar tantos entraves para projetos desta área - defende Deitos. - Em momentos de crise hídrica, o importante é avaliar o ambiental, mas também o econômico e o social, e o que a falta de uma maior celeridade na aprovação poderá causar - acrescenta.

RAFAEL VIGNA


31 DE AGOSTO DE 2021
NÍLSON SOUZA

O país do golpe

Por consideração aos amigos e parentes mais antigos, entre os quais a minha mãe, prestes a completar 98 anos, ainda conservo um telefone fixo em casa. De cada 10 ligações que recebo, nove são tentativas de golpe. Outro dia, em plena madrugada, me ligou uma menina desesperada:

- Pai! Pai! Me pegaram! Eu tô machucada. Me ajuda.

E chorava copiosamente. Daria uma boa atriz de novela, pensei. Como não tenho filha e esse embuste do sequestro virtual é mais velho do que Matusalém, respondi calmamente:

- Moça, vai procurar outro pai, que eu preciso dormir.

Juro que a ouvi rir antes de desligar. Os golpistas até se divertem enquanto atuam. Alguns são verdadeiros especialistas nas suas áreas de fraude. Os mais aplicados são os falsos funcionários de banco, que, inclusive, se identificam:

- Aqui é o fulano, da central de segurança do banco xis. O senhor fez uma compra no seu cartão na loja tal...

Como na maioria das vezes os vigaristas sabem o seu nome completo e a instituição bancária onde você tem conta, sempre dá um calafrio antes do raciocínio lógico de que os bancos sequer costumam atender quando a gente liga para eles, quanto mais ligarem espontaneamente para clientes. Se o desavisado responde que não fez compra nenhuma, vem aquela história de cartão clonado, orientação para cortá-lo e entregar para o motoboy que irá substituí-lo. Golpe manjado, mas recordista em vítimas.

Com a pandemia, a disparada das compras online e o uso rotineiro de mensagens de celulares, os golpistas se multiplicam geometricamente. Agora surfam na onda do Pix, obrigando as autoridades a limitar o valor das transferências bancárias em horários noturnos. Invertemos o velho brocardo (acho que não há nada mais velho do que brocardo!): "Hecha la trampa, hecha la ley".

Aliás, a frase original tem uma história engraçadinha, contada pelo escritor italiano Fosco Maraini: monges japoneses, pelas regras da sua congregação, só podiam comer carne de animais marinhos. Em tempos de pesca escassa, simplesmente batizaram os porcos de "baleias silvestres".

Malandros são criativos. Meu maior medo agora é aquele recurso de inteligência artificial que recriou a voz do falecido pai do Zico. Se minha mãe me ligar pedindo um vale, terá que passar por um teste de maternidade.

NÍLSON SOUZA

31 DE AGOSTO DE 2021
INFORME ESPECIAL

PUC oferece parque esportivo inédito em Porto Alegre

A PUCRS oferece à comunidade um parque esportivo com uma das estruturas mais completas da América Latina, com características inéditas em Porto Alegre. Aberto ao público externo, o local integra o Campus Saúde da universidade.

O complexo de saúde e bem-estar foi desenvolvido após consultas a usuários, colaboradores, alunos e especialistas. Além da ampliação do espaço, a PUCRS buscou junto à comunidade científica tendências em tecnologia para compor a iniciativa.

Os equipamentos de alta tecnologia são os mesmos utilizados por atletas olímpicos. Através de uma interface inteligente, é possível acessar imagens simuladas para, por exemplo, correr como se estivesse em qualquer lugar do mundo.

O Campus Saúde é uma conexão entre parque esportivo, Instituto do Cérebro, Centro Clínico, Centro de Reabilitação do Hospital São Lucas da PUCRS, Escolas de Medicina e de Ciências da Saúde e da Vida e de iniciativas de inovação como o BioHub, empreendimento do Tecnopuc que atua na geração de negócios inovadores em ciências da vida.

O reitor da Universidade, irmão Evilázio Teixeira, destaca que a estrutura também é um incentivo à prevenção:

- Quando as pessoas dão maior atenção à integralidade do corpo, mente e espírito, o mundo se torna um lugar melhor. Aprender a cuidar de si hoje, para crescer e envelhecer de maneira mais saudável e exitosa, é o que queremos motivar e tornar acessível - ressalta.

O Parque está em funcionamento, com protocolos sanitários, de segunda a sexta-feira. Informações: parqueesportivo@pucrs.br

TULIO MILMAN

31 DE AGOSTO DE 2021
PRIVATIZAÇÃO DA CORSAN

Piratini quer votação hoje, mas prefeitos pedem tempo

Projeto que autoriza venda do controle acionário da estatal tramita em urgência e precisa de ao menos 28 votos favoráveis

O Palácio Piratini pretende levar a votação hoje, na Assembleia Legislativa, o projeto de lei que autoriza a venda do controle acionário da Corsan. A proposta tramita em regime de urgência e tranca a pauta do parlamento.

O governo sustenta que a injeção de recursos privados é o único caminho possível para que a companhia consiga efetuar os investimentos necessários para cumprir as metas do novo marco legal do saneamento, aprovado no ano passado pelo Congresso. Entre outros pontos, a legislação prevê a garantia de acesso de 99% da população à água potável e de 90% ao tratamento e à coleta de esgoto até 2033.

A oposição contesta os números apresentados pelo Piratini e afirma que a companhia tem condições de atender às metas no prazo adequado, além de argumentar que o abastecimento de água é uma tarefa do poder público.

Para que o projeto seja aprovado, são necessários votos favoráveis de ao menos 28 dos 55 deputados estaduais. Em junho, na votação do segundo turno da proposta de emenda à Constituição (PEC) que dispensou a necessidade de plebiscito para a alienação da estatal, o governo obteve 35 votos.

A intenção do Piratini contraria a decisão dos prefeitos gaúchos, que se reuniram em assembleia extraordinária ontem. Os gestores municipais solicitaram um "prazo razoável" para o debate sobre a desestatização da companhia, a ser definido pelo governo do Estado e pela Assembleia. A deliberação, entretanto, não estipulou qual seria o tempo adequado, tampouco deixou claro o pedido para a retirada do regime de urgência.

Oposição

O objetivo inicial da reunião dos gestores municipais era de colher a opinião de cada um dos prefeitos sobre a alienação da Corsan, que atende 316 das 497 cidades. O presidente da Famurs, Eduardo Bonotto (PP), prefeito de São Borja, optou por emitir uma posição coletiva. A sugestão foi acatada por todos os 321 participantes, de acordo com a Famurs - a maioria por videoconferência.

Entre os que se manifestaram, a maioria discursou contra a privatização, nos termos em que a proposta foi encaminhada. Em geral, pediram mais tempo para discutir o modelo e contribuir com sugestões, além de demonstrarem dúvidas a respeito das consequências para os municípios.

Um dos principais articuladores políticos do governo, o chefe da Casa Civil, Artur Lemos, disse que em sua interpretação os prefeitos deixaram a decisão nas mãos da Assembleia e do Piratini:

- A decisão foi no sentido de que o prazo para o encaminhamento será definido pela Assembleia e pelo Poder Executivo. O Executivo encaminhou o projeto com urgência e vamos até tarde da noite (ontem), e iniciar o dia, (hoje), discutindo com a nossa base na Assembleia, porque entendemos que já temos elementos para demonstrar a necessidade da privatização para prestar melhores serviços para a sociedade.

Lemos ponderou que o debate não se encerra com a aprovação do projeto de lei na Assembleia, já que, antes da privatização, o Piratini pretende assinar com todas as prefeituras atendidas pela Corsan aditivo aos contratos atuais, em que serão definidas intervenções em cada município.

- A aprovação é o pontapé inicial para que se converse com cada um dos municípios e se comece a adequar as providências necessárias em cada uma das cidades.

Líder da bancada do PT, maior partido de oposição da Assembleia, Pepe Vargas disse que o governo deveria atender ao pedido dos prefeitos e postergar o prazo.

PAULO EGÍDIO

segunda-feira, 30 de agosto de 2021


30 DE AGOSTO DE 2021
CÉSAR OLIVEIRA

Entre o certo e o errado

O que existe entre o certo e o errado? Extremos que nos afastam e meios que nos unem.

Há tempos venho falando, em diferentes momentos e ocasiões: os extremos estão criando um abismo entre nós. Vivemos juntos, trocamos ideias e experiências, somos impactados, muitas vezes, por coisas de que nem sabíamos da existência. Todavia, não parece que é nesse caminho de consciência coletiva que a humanidade está indo (e olha que eu gostaria muito que fosse).

Dizem por aí que a pandemia veio para nos ensinar, mas será que de fato estamos aprendendo?

Certeza temos que já não importa mais como sairemos deste processo pandêmico, ao menos é o que está aparentando. Mas como estaremos após ele: permaneceremos ou evoluiremos?

Convivo em dois meios distintos e próximos ao mesmo tempo, o político e o artístico-cultural. Em ambos, sinto que as ideias extremas têm se mostrado nocivas, pois deixam o meio desassistido. Falo desses dois ambientes porque são aqueles em que tenho maior vivência, mas com certeza isso ocorre em outros tantos setores.

Quando se fala em política, é difícil não lembrar dos entendimentos extremos que algumas pessoas bradam sobre "direita" e "esquerda", como se, por exemplo, tudo fosse passar por privatização ou estatização. Será mesmo que não pode haver um meio-termo? O Estado não pode gerir aquilo em que possui capacidade e a iniciativa privada contribuir onde lhe é possível? Penso que sim.

Na cultura, com o devido respeito aos autênticos costumes e representações - pois os defendo diariamente -, muitas vezes a falta de sensibilidade gera uma incapacidade de cativar. Está chegando a Semana Farroupilha, e muita gente terá contato pela primeira vez com a nossa cultura. Precisamos nos questionar: o que fará a pessoa se apaixonar pelo que é nosso? A pilcha integralmente correta ou o acolhimento ao ganhar um lenço do amigo e todo o entendimento que há neste ato? A música que, ao seu gosto, é a mais qualificada pela sua execução técnica e conteúdo intelectual ou simplesmente uma música regional gaúcha capaz de despertar a admiração pelas nossas tradições por meio da sua autenticidade?

Pergunto, questiono, reflito e posso até ser repetitivo, mas é porque me preocupa o fato de perdermos coisas importantes pelo ímpeto de estarmos sempre certos.

A escolha é nossa. Seguiremos puxando as extremidades e nos afastando ou buscando os meios que nos unem para nos fortalecermos enquanto povo?

CÉSAR OLIVEIRA

30 DE AGOSTO DE 2021
DAVID COIMBRA

As coisas importantes da vida o dinheiro não compra

Educar um filho é uma tarefa muito complicada. Muito. Você está formando um ser humano, afinal. Só que, neste caso, você não pode se considerar autor. Não é como escrever um livro, por exemplo, ou pintar um quadro, ou construir uma casa. Não. O livro, o quadro e a casa serão aquilo que você fizer deles. Uma pessoa, não. Porque a pessoa sofre outras influências. De outras pessoas, do meio ambiente, de suas próprias demandas internas.

Então, você, como pai, passa o tempo todo em dúvida: será que estou forçando muito? Será que estou sendo muito frouxo? Qual é a medida certa?

É inegável que o exemplo é o mais importante. A vida não está pronta para ninguém. Assim, você faz as coisas de um jeito e, se o seu filho o tem como modelo, é nisso que ele vai se basear.

Atitudes, portanto, são mais eficientes do que palavras. Mesmo sabendo disso, sempre repeti algumas máximas para o meu filho, com o objetivo de introduzir aquilo em sua cabeça. É a tática da propaganda. Uma das frases que sempre lhe digo é:

- Nós comemos de tudo.

Deu certo. Meu filho come brócolis, mocotó, polvo e massa com sardinha. Sem frescura. Claro, um lema pode acabar se voltando contra você, e isso aconteceu comigo. Meu filho tinha uns quatro anos de idade e nós estávamos à mesa. A Marcinha foi me servir de um pedaço de galinha e recusei:

- Não, não, obrigado. Não estou a fim de galinha.

Ele, pequeninho, mas grandemente sarcástico, me lançou um olhar comprido e perguntou:

- Ué? Nós não comemos de tudo?

Tive de comer a galinha. Outra que sempre digo para meu filho é:

- As coisas mais importantes da vida o dinheiro não compra.

E arremato: o dinheiro compra companhias, não amigos; o dinheiro compra remédios, não saúde; o dinheiro compra prazer, não amor.

Óbvio que o dinheiro é fundamental para você ter uma vida digna e suprir suas necessidades, mas as coisas realmente importantes não podem ser medidas em dólar.

Estou criando uma alma desapegada a valores materiais, pensava eu, com certo orgulho, até porque volta e meia meu filho repetia a frase: "As coisas mais importantes da vida o dinheiro não compra". Só que, neste final de semana, alguém fez a ele aquela pergunta que os adultos adoram fazer às crianças:

- O que tu quer ser quando crescer?

E ele, sem hesitar: - Quero ser rico. Muito, muito, muito rico!

Olhei para ele, incrédulo, e repeti em silêncio para mim mesmo a máxima mais verdadeira de tudo isso que escrevi: educar um filho é, mesmo, uma tarefa muito complicada.

DAVID COIMBRA

30 DE AGOSTO DE 2021
A VIDA É LOKA

A história da sentença criminal com poesia

Com uma poesia emoldurando o relatório de uma sentença, a juíza Karla Aveline, titular do 3º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, traduziu por meio da literatura seu entendimento sobre trabalho infantil no narcotráfico. A decisão viralizou - até mesmo o autor dos versos, Sergio Vaz, se manifestou nas redes sociais.

Intitulado A Vida É Loka, o poema (leia abaixo) foi usado para provocar reflexão sobre a ausência de políticas públicas nas comunidades brasileiras. Em um dos trechos, o poeta compara um livro a "uma arma de quase 400 páginas na mão". Em outros, menciona "pílulas de sabedoria", "tráfico de informação" e "umas mina cheirando prosa".

A sentença foi proferida no dia 20, após representação do Ministério Público em desfavor de um adolescente. O órgão imputava a ele a prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, pedindo a aplicação da medida socioeducativa de internação sem possibilidade de atividades externas. Em audiência, o réu negou a autoria. A juíza - que figurava como substituta na 4ª Vara do Juizado - entendeu que se tratava de um caso de trabalho infantil e julgou improcedente a representação, afastando a aplicação das medidas socioeducativas "a fim de que o adolescente que tem sua força de trabalho explorada pelas organizações criminosas receba a proteção adequada".

Karla sustenta sua posição com base na convenção n° 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Segundo a legislação, vigente no Brasil, "a expressão das piores formas de trabalho infantil" compreende "utilização, recrutamento e oferta de criança para atividades ilícitas, particularmente para a produção e tráfico de entorpecentes conforme definidos nos tratados internacionais pertinentes".

- A questão é que esse tema não é debatido, seja no meio jurídico, seja na sociedade. Esbarramos no senso comum de que um adolescente é um traficante, sem olhar o contexto e a ausência de políticas públicas. Esse adolescente não deve ser criminalizado, mas protegido - afirma.

Ela conta que estava no último dia do prazo para fazer a sentença quando teve um "insight":

- Naquele dia, recebi uma música de um amigo. A letra falava sobre contradições, dificuldades de pessoas empobrecidas e o sofrimento dessa juventude. O insight se deu nesse momento, quando lembrei da poesia.

Amante da literatura, ela diz que conheceu o trabalho do poeta há alguns anos, após ter lido uma entrevista dele. Chamou a atenção da magistrada não só a produção literária do autor, mas a atuação dele em bairros periféricos de São Paulo (Vaz é criador de uma cooperativa cultural na capital paulista):

- Percebi o impacto da literatura naquele contexto e isso me marcou. Sem falar que gosto da forma como ele usa a escrita para dialogar com a comunidade e proporcionar reflexão e transformação.

Escravização

À sentença, a juíza acrescentou trechos de sua dissertação de mestrado, apresentada em 2020 na Universidad Pablo de Olavide, em Sevilha, na Espanha. O trabalho - no qual a magistrada tirou nota máxima - fala sobre o que Karla considera um "silenciamento" da magistratura brasileira a respeito do trabalho infantil no narcotráfico, o que estaria, segundo ela, ligado ao perfil dos juízes e juízas do Brasil.

- Nossa magistratura é 80% branca, 60% masculina. Estamos em posições privilegiadas, enquanto esses adolescentes, em sua maioria, são pretos ou pardos. Então, há a continuidade de um projeto colonial, onde nós, brancos, hierarquizamos, inferiorizamos, encarceramos corpos negros. Essa escravização sempre contou com a chancela dos poderes ocupados por pessoas brancas - argumenta.

Segundo ela, a decisão que reconhece o ato infracional análogo ao tráfico como trabalho infantil não tem precedentes em primeiro grau. Em segundo grau, a magistrada lembra que um desembargador do Rio costumava sustentar suas decisões desta forma, mas "era sempre voto vencido". Questionada por que acredita que o uso de uma poesia gerou tanta repercussão, a magistrada explica:

- A nossa língua não é a mesma da maior parte da população. Quando vê um juiz expressando a voz do outro, a comunidade se surpreende. A literatura proporcionou que eu pudesse dialogar com outros mundos, como esse que a gente encarcera.

ROSSANA RUSCHEL


30 DE AGOSTO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

ENTRE O OTIMISMO E AS INCERTEZAS

Zero Hora publicou na quinta-feira uma página com o resumo de uma série de entrevistas realizadas pelo programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, com empresários, lideranças setoriais e executivos de companhias relevantes do Estado. Há, felizmente, um unânime sentimento de otimismo para os próximos meses, em maior ou menor grau, graças ao avanço da vacinação contra a covid-19, o que põe à frente esperanças palpáveis de controle da pandemia. Desde o começo do ano passado, a crise sanitária criou severas dificuldades para a economia, com reflexos nos negócios, no emprego e na renda da população. Ao longo de 2021, a despeito da preocupação com o novo pico da doença nos meses iniciais, foi se sedimentando uma maior confiança na retomada da atividade no Estado e no país.

As expectativas positivas são sem dúvida uma injeção de ânimo, mas o Brasil precisa, mais do que recuperar perdas, ingressar em um período de crescimento forte e constante para fazer com que a grande massa de desempregados, por exemplo, encontre uma ocupação, volte a ter dignidade e participe do mercado de consumo, dando nova dinâmica à economia pelo impulso ao mercado interno. 

A questão é que começou a aparecer uma profusão de incertezas que têm levado a uma sequência de revisões para baixo das projeções para o PIB de 2022. A mediana das opiniões de especialistas estava até semana passada em 2%, de acordo com o Boletim Focus, do Banco Central, mas há quem aposte em um resultado ainda mais fraco. Se esse cenário se confirmar, o país seguirá a toada observada nos últimos anos, de avanços medíocres e insuficientes, após um período recessivo seguido de baixíssimo crescimento.

A continuidade da recuperação pós-pandemia é colocada em xeque por diversos fatores. Junto ao desemprego, há alta acelerada da inflação, especialmente de itens que compõem grande parte dos gastos das classes baixa e média, como alimentos, gasolina e energia elétrica. A majoração dos preços tem levado o Banco Central a elevar a taxa Selic, o que sempre é um inibidor da atividade e dos investimentos produtivos. Há, ao mesmo tempo, sérias preocupações com a situação orçamentária do país devido a desconfianças de que o governo federal busca saídas que burlam regras fiscais para financiar programas sociais, de olho nas eleições presidenciais de 2022, sempre um perío- do de forte nervosismo. 

As reformas estão paradas ou feitas de maneira que não resolvem os grandes problemas, como mostram as discussões em relação a mudanças no sistema tributário, focado no imposto de renda. Para completar, a crise política não cessa, jogando mais lenha na fogueira da desconfiança. Todo esse cardápio de preocupações se reflete no dólar, no juro, na inflação e na confiança dos agentes da economia. São ingredientes de uma receita indigesta, na contramão do que seria necessário para recolocar o país no caminho do crescimento robusto e sustentável.

Não há atalhos para encontrar a saída desse labirinto. As soluções passam, em primeiro lugar, por uma pacificação política, ora difícil de ser vislumbrada, além de uma gestão competente da crise energética e respeito à responsabilidade fiscal na busca por moldar o programa de transferência de renda planejado pelo Planalto. Com seriedade e serenidade, constroem-se meios que acabarão se refletindo na melhora das expectativas e dos indicadores, permitindo que o otimismo agora expressado no meio empresarial no Estado não se transforme em nova frustração.

 


30 DE AGOSTO DE 2021
ACERTO DE CONTAS GIANE GUERRA

Liberados projetos no Country Club

Foi liberada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) a construção de um hotel, uma torre corporativa e um residencial no Porto Alegre Country Club, que recebeu índices construtivos após ceder área para prolongamento da Rua Anita Garibaldi. O projeto Nilo Country é da CFL Incorporadora, que investirá R$ 41 milhões e estima gerar 2,3 mil empregos diretos e indiretos com a obra.

"Estamos com projetos trans­for­madores sendo aprovados para o eixo da Nilo Peçanha. Só entre Unisinos e Iguatemi, são R$ 380 milhões em novos empreendimentos", diz o titular da Smamus, Germano Bremm.

Há poucas semanas também foi aprovado investimento de R$ 64 milhões da Melnick. Ambos estão no programa de licenciamento prioritário para empreendedores que se comprometem a iniciar a obra em até um ano após a licença. Ainda sobre a CFL, o CEO da incorporadora, Luciano Bocorny Correa, disse recentemente à coluna que os planos da empresa somam R$ 1 bilhão em projetos para RS e SC.

Bandeiraço à vista

Está para sair amanhã o novo reajuste da bandeira vermelha patamar 2, cobrança extra mensal na conta de luz definida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Há dois meses o valor subiu 52%, elevando em 10% a conta do porto-alegrense, por exemplo. Só que o custo para gerar energia no país segue aumentando devido à crise hídrica - e vai piorar. No melhor dos cenários, teremos aumento dos atuais R$ 9,49 para quase R$ 15 a cada 100 kWh consumidos, com nova alta de cerca de 50%. Mas se fala que o necessário seria R$ 19, dobrando a bandeira. 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, passou a defender um reajuste menor. A proposta do Ministério de Minas e Energia foi classificada de "bandeiraço" pela área econômica e levou até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a entrar na discussão, porque ele precisa domar a inflação depois. O aumento da bandeira em mais 50% levará a previsão da Quantitas Asset para o IPCA de 7,8% para 8% em 2021.

ACERTO DE CONTAS GIANE GUERRA

30 DE AGOSTO DE 2021
TENSÃO ENTRE OS PODERES

Contra manifesto sobre a crise, BB e Caixa pressionam Febraban

O Banco do Brasil (BB) e a Caixa resolveram deixar a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e já avisaram a decisão ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O motivo da saída se deve a um manifesto que a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) deve publicar amanhã, com pedido de harmonia entre os três poderes. A Febraban é signatária do documento.

O entendimento dos bancos públicos, de acordo com fontes, é de que a federação, que representa o setor no país, é privada e está se posicionando de forma política, com o que ambos, controlados pelo governo, discordam.

A informação sobre o desembarque de BB e Caixa da Febraban foi antecipada pelo colunista Lauro Jardim, de O Globo.

Os dois bancos teriam encaminhado nota à Febraban, comunicando a saída da entidade caso o manifesto seja publicado. Segundo relatos, ambos se posicionaram contra a adesão à iniciativa, que foi votada na instituição e teve concordância da maioria. O assunto tem sido discutido há uma semana.

O manifesto não cita o presidente Jair Bolsonaro, mas traz críticas implícitas à gestão de Guedes e foi encarado pelos bancos públicos como claro ataque à política econômica. Isso porque no texto, obtido pelo Estadão, as entidades que o assinam pedem "medidas urgentes e necessárias" para o Brasil superar a pandemia, voltar a crescer e gerar empregos para, assim, "reduzir as carências sociais" que "atingem amplos segmentos da população".

No governo, quem liderou o movimento de ruptura dos bancos públicos com a Febraban foi o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, que mantém proximidade com Bolsonaro.

A relação dos bancos públicos com os privados já estava ruim na Febraban, ao ponto de uma associação nacional dos bancos públicos estar sendo cogitada. O manifesto da Fiesp, intitulado "A praça é dos três poderes", foi assinado por diversas entidades da sociedade civil. Juntas, destacam no documento que veem com "grande preocupação" a "escalada de tensões e hostilidades entre as autoridades públicas".

O documento pede a harmonia como "regra" entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Nenhum dos poderes, defende, é "superior em importância", nenhum "invade o limite" dos outros e um "não pode prescindir" dos demais.

A cúpula dos dois bancos oficiais contesta o diagnóstico de grave crise do texto. Para eles, "o Brasil já está crescendo, a economia está em ?retomada em V?, gerando empregos". Por essa avaliação, o manifesto não faria sentido.

Nas duas instituições, há uma ala que se preocupa se a saída da Febraban pode ser questionada por órgãos de controle, como Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal (MPF), ficando caracterizado como ingerência política. Além disso, o desligamento dos dois maiores bancos da associação que representa as instituições financeiras pode ter consequências em "objetivos comuns", como a reforma tributária, em que todos estão do mesmo lado.

Procurados, BB e Caixa não se manifestaram sobre o assunto.

A Febraban afirmou que não faz comentários a respeito de posições atribuídas a seus associados. Sobre o manifesto da Fiesp, disse que o documento foi "dirigido a várias entidades e que o assunto foi submetido à governança da Febraban, como é usual".

Alternativas

Em reação, o presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), disse ontem que vai apresentar requerimento para ouvir Paulo Guedes, Pedro Guimarães e o presidente do Banco do Brasil, Fausto Ribeiro, sobre o tema:

- Quando você politiza essa questão dos bancos, é muito triste, a gente começa a ficar preocupado. Quero entender, de fato, o que está acontecendo, não dá para a gente ficar nessa economia ideológica.

O requerimento deve ser apresentado hoje. A ideia é que seja aprovado até quarta-feira, e audiência única seja marcada em 15 dias.

No sábado, Jair Bolsonaro disse esperar que não haja tentativas de conter as manifestações de seus apoiadores previstas para Sete de setembro. Ele negou que defenda ruptura entre poderes, mas afirmou que há "limite".

- Temos um presidente que não deseja nem provoca rupturas, mas tudo tem um limite em nossas vidas. Espero que não queiram tomar medidas para conter esse movimento - disse Bolsonaro em encontro de líderes evangélicos, em Goiânia.

O presidente declarou ainda que existem três caminhos para ele no futuro:

- Tenho três alternativas: estar preso, ser morto ou a vitória (na eleição de 2022). Pode ter certeza, a primeira alternativa, preso, não existe. Nenhum homem aqui na Terra vai me amedrontar. Tenho a consciência de que estou fazendo a coisa certa.


30 DE AGOSTO DE 2021
CLÁUDIA LAITANO

O ocaso do ogro

Não peguei o cigarro liberado na mesa de trabalho nem as máquinas de escrever, mas alcancei o tempo em que quase tudo era permitido em um escritório: humilhação pública, cantada do chefe, piada racista, homofobia. Quando a gente desembarca em um ambiente desconhecido, sem experiência, tudo parece aceito e consolidado. Somos levados a crer que aquela é a natureza inexorável das coisas e não uma acomodação provisória, circunstancial, sujeita a rearranjos permanentes.

Nos últimos 30 anos, na maioria das empresas, o cigarro sumiu não apenas dos espaços comuns, mas do prédio inteiro. Os computadores foram trocados umas 200 vezes, e o telefone fixo virou enfeite. Um tanto em função de leis e processos trabalhistas, outro tanto por mudanças culturais mais abrangentes, as relações pessoais dentro do ambiente de trabalho também mudaram.

O chefe habituado a humilhar seus subordinados deixou de ser visto como um líder eficiente e passou a ser encarado como uma pessoa desequilibrada, provavelmente inapta para a função de gerenciar uma equipe. As piadas racistas e homofóbicas foram minguando até quase desaparecerem - pelo menos dos espaços corporativos mais formais. Surgiram ouvidorias para recolher queixas dos funcionários insatisfeitos, investigações internas e processos por assédio moral. Gritar, desrespeitar, humilhar passou a ter consequências. Não digo que os ogros estejam todos desempregados e fazendo terapia, mas imagino que dormem menos tranquilos sabendo que o destempero de hoje pode ser o processo por assédio moral de amanhã.

O fato é que temperamentos muito agressivos e apetites exagerados pelo poder passaram a ser vistos com desconfiança até mesmo no ambiente supercompetitivo de uma grande empresa. Afinal, que acionista gostaria de colocar um sujeito imprevisível no comando de seus negócios? E que executivo conseguiria manter o emprego fazendo troça publicamente da doença, do salário ou dos problemas pessoais dos seus subordinados? E quem gostaria de trabalhar sob o comando de um líder instável e sem escrúpulos?

A estabilidade emocional e o profissionalismo, sem falar na competência, fazem bem para os negócios. Quem diria. Ainda assim, há sempre quem prefira um ogro no comando.

sábado, 28 de agosto de 2021


Silêncio

Não fale. Mantenha o nobre silêncio. Sem reclamar, sem resmungar, sem falar nem o bem nem o mal. Observe em profundidade a si. Quem é você? O que é a mente?

Não se preocupe. Ocupe-se em andar em plena atenção, saber como pisa no chão. Sentir o ar, a brisa, o vento e as fragrâncias de um local onde a espiritualidade é cultivada há décadas.

Durante três dias (de 3 a 5 de setembro), no Cecrei, em São Leopoldo, vamos nos sentar em meditação silenciosa. Deveria ser um retiro presencial, em 2020. Transferimos para 2021 e agora será híbrido. Carros híbridos, aulas híbridas, árvores híbridas. Geralmente os frutos ficam mais doces e o ar, menos poluído. Tentemos. Em silêncio. Apreciando a vida.

Algumas pessoas se hospedarão no Centro de Espiritualidade Cristo Rei, um dos vários locais, no Brasil, de retiros espirituais de jesuítas. Outras, como eu, estaremos online, para evitar viagens poluentes da atmosfera e possíveis vírus. Quartos individuais e distanciamento, máscaras obrigatórias, álcool gel, muito sabão e água e o pré-requisito de terem feito teste de covid recentemente e já estarem vacinados. A fé caminha de mãos dadas com a prudência e o cuidado.

Os encontros entre pessoas de diferentes tradições é um dos alicerces na construção de uma cultura de paz, justiça e cura. Algumas pessoas hoje chamam de encontros inter, intra ou trans religiosos, onde podemos experimentar outras práticas espirituais, sem nunca nos afastarmos da nossa tradição. Pelo contrário, nos aprofundando em nossa fé.

Não é turismo espiritual, dar uma espiadinha, só para ver como é: tirar foto e colocar nas redes sociais. Nada disso. Fotos e celulares, rádios e televisões, livros, revistas, textos e computadores - tudo ficará em tempo de espera por um curto final de semana.

Silencie. Não fale. Internamente permita que tudo se cale. Não procure se comunicar com outros praticantes/retirantes. Vamos nos afastar das atividades quotidianas, para vivenciar a plenitude.

Silencie. Não olhe para as outras pessoas, não faça gestos, não pisque os olhos, não mexa a cabeça em aprovação ou reprovação. Sinta o que se passa no seu corpo e na sua mente. Você com você.

Penetre o seu mais íntimo, além das palavras e dos gestos. Reconheça o movimento incessante dos neurônios e sinta os espaços, as pausas entre palavras, imagens, sentimentos, sensações, emoções, memórias. Observe e investigue em profundidade. Não importa que seja um dia ou um ano. Entregue-se e redescubra o que realmente é valioso para você.

Um retiro de silêncio Zen em um centro de espiritualidade Inaciana é para pessoas de todas as tradições espirituais e para ateus. Juntos, nós, seres humanos, podemos facilitar a manutenção do silêncio sagrado para poder compreender melhor a própria vida.

Um centro de espiritualidade inaciana significa ser parte da ordem dos Jesuítas, fundada por Santo Inácio de Loyola, no século 16. Grupo católico que tem como prática a meditação silenciosa, os exercícios espirituais, a reflexão profunda sobre o que realmente importa. Para não ficarmos importando - colocando para dentro de nós - o que é menor.

Em nós, habita o sagrado. O sagrado presente em cada partícula e no maior espaço. Podemos senti-lo na quietude profunda do encontro e da procura. Somos o todo e o todo é em cada um de nós. O tempo urge. Perceba e sinta o dulcíssimo sabor da espiritualidade. Silencie.

Silêncio para ouvir, ver, sentir e ser - intersendo, em comunhão auspiciosa com toda vida da Terra.

Mãos em prece


28 DE AGOSTO DE 2021
LYA LUFT

Querer não é poder

Eu tinha horror dessas frases cretinas que raramente funcionam: "Sobe na bicicleta, não precisa mais de rodinhas! Toma impulso e vai!".

Fiquei semanas com marcas do tombo homérico.

Algo parecido me ocorreria décadas depois na Grécia após um jantar maravilhoso à beira do mar. Era preciso entrar num minúsculo barquinho para chegar ao iate dos amigos. Protestei que nem pensar! Alguém repetiu a velha frase: "Toma impulso que vai!".

Cheguei no iate molhada dos pés à cabeça, dessa água que ali não era verde-cristalina. E ainda tendo de fingir que achava graça...

Esse momento da minha vida é um dos que mais me lembram disso: quero saltar da cama e correr pro banheiro? Só com andador, essa aranha metálica detestável e temporária, mas útil.

Quero passar uns dias lindos na casinha do Bosque em Gramado? Nem pensar, por enquanto.

Uma velha bruxa nada simpática nem engraçada me pegou debaixo do braço, e eu que me comporte.

Mas uma coisa eu posso: tentar ser otimista e confiante, curtir o amor que me rodeia, agradecer tantos cuidados.

Ah sim, apesar de alguns momentinhos menos doces, isso eu posso.

Mas vêm as trovoadas e a chuva: ótimo me aconchegar nas cobertas. Ler me cansa? Aprendo e curto coisas incríveis em ótimos programas de TV. E o Whats sempre transborda de recados de amizade, descobertas, vida.

Obrigada, vida.

LYA LUFT

28 DE AGOSTO DE 2021
MARTHA MEDEIROS

Não basta falar em Deus

Um leitor me pergunta por e-mail: "Como podes atacar um homem tão bom, um aliado de Deus?". Não preciso dizer a quem ele defendia. A mensagem era cortês, de alguém que acredita que um político que se apresenta abraçado a Deus logicamente fará o melhor para todos. Enquanto isso, o diabo ri pelas costas dos inocentes.

Política e religião não deveriam se misturar, um assunto é público e o outro é privado. Mas, curiosamente, são os políticos mais "polêmicos" (ah, os eufemismos) que usam e abusam de Deus como cabo eleitoral, pois sabem que a religião sempre serviu como blindagem contra críticas.

Muitos de nós buscam conforto na religião. Outros buscam conforto na natureza, na arte, na ciência, no humanismo. Tanto faz. Uma pessoa é boa pelos seus princípios éticos e morais, não pelos meios com que alimenta seu espírito. Eu posso ser equilibrada, amorosa, generosa e solidária sem nunca ter colocado uma hóstia na boca e sem atribuir minhas ações a uma força divina e sobrenatural. Assim como posso ir à missa todos os domingos, crer que Deus está acima de tudo, e minha suposta benignidade ser uma fraude.

O que eu chamo intimamente de Deus, e o que você chama, está igualmente a serviço do bem e do mal, ou não haveria extremistas radicais, atentados terroristas, populações subjugadas em nome da fé. Adesivar o carro com o emblema "Jesus te ama" ou rezar antes das refeições têm efeito zero sobre nossa índole.

Há maneiras mais eficientes de descobrir se alguém é, de fato, especial. Ouça o que ela diz. Observe como se comporta. Que respeito tem pelos outros. O quanto é sensível ao sofrimento alheio. Como trata aqueles que a estão servindo. O quanto se interessa por quem não lhe é útil. O que a emociona. Em que medida se compromete com a verdade. O quanto se dedica à escuta. O tom de voz com que se comunica. Em que ela contribui para a sociedade. Qual sua predisposição em evoluir, em acompanhar as mudanças do seu tempo. O quanto evita causar desassossegos. Se estende a mão quando lhe pedem ajuda. Como lida com crianças e idosos. Qual a importância que dá para a beleza de uma escultura, para a emoção provocada por uma música. Se consegue compreender que miséria e vício não são escolhas, se sente compaixão por quem padece pela desigualdade social.

Prestando bem atenção, você conseguirá perceber se essa pessoa tem valores e intenções confiáveis, ou se é uma egoísta a serviço da própria vaidade e da ambição por poder. Seja qual for o resultado da sua análise, você não terá a mínima ideia se ela é religiosa ou não.

A pessoa que fala em Deus, que cita Deus, que se agarra em Deus, pode ser um ser humano extremamente bom e justo. Mas, para confirmarmos, falta todo o resto.

MARTHA MEDEIROS

Desde quando educação é exclusão?

Esse ministro da educação (a caixa baixa é proposital), Milton Ribeiro. O homem é um equívoco em forma de bigode. Um erro em forma de pastor. E se parecer que essa é uma coluna engraçada, não é. Ela fala de uma tragédia, ideias elitistas e preconceituosas na educação. E isso é triste.

Aos fatos.

Em entrevista que parece um esquete de programa humorístico ruim, o ministro da educação declarou que, no Brasil, a universidade deveria ser para poucos. Na visão do excelentíssimo, o país precisa é de técnicos - e precisa mesmo, mas não por imposição, e sim por escolha. Haveria menos engenheiros trabalhando nos aplicativos, segundo ele, se tivessem feito um curso técnico no lugar de uma faculdade.

Depois de meses de um silêncio que fazia crer que o país nem tinha ministério da educação, seu Ribeiro tirou o bigode para fora porque só agora, 13 meses depois de empossado, descobriu nossos cursos técnicos - criados em 2008. Ficou tão maravilhado que chamou os cursos de "vedetes do futuro". Virginias Lanes do amanhã. Se depender do ministério dele, o Brasil será uma Alemanha, onde "são poucos os que fazem universidade, universidade deveria ser para poucos nesse sentido de ser útil à sociedade".

Com esse discurso, o ministro desconsiderou completamente a vontade das pessoas. A vocação. O sonho de entrar na Universidade - que sempre foi tão restrito, quase inacessível para a maioria dos brasileiros antes dos programas de incentivo. Não sei você, mas eu morro chorando cada vez que vejo alguém que veio de uma situação vulnerável conseguir um diploma de Pedagogia, de Biologia, de Medicina. Isso não conta para um ministro da educação?

Porque estava muito inspirado (só que não), Milton Ribeiro também disse que os filhinhos de papai - ele falou isso, não eu - deveriam ocupar as vagas das universidades públicas, já que os impostos dos papais sustentam o país e, por consequência, as universidades públicas. Com um estímulo desses, até dá para entender por que o Enem teve o menor número de inscritos em 14 anos.

Seja como for, a ideia de Ribeiro encontrou apoiadores. Mas então ele deu outra entrevista, e aí ficou difícil alguém defender o bigode ministerial. Para Milton Ribeiro, quando uma criança com deficiência é incluída em salas de aula com alunos sem a mesma condição, ela "atrapalha, entre aspas", a aprendizagem das outras.

Onde é que esse senhor andou nas últimas décadas para estar tão defasado, tão mal informado, tão obsoleto? E olha que ele é um religioso, líder de alguma igreja por aí. Imagino o que os pais de crianças especiais, que lutam todos os dias pela inclusão dos filhos, devem ter sentido.

Não demorou para o Ministério da Educação lançar a surrada nota de "o ministro se desculpa com todas as pessoas que se sentiram ofendidas". E já o seu Ribeiro estava metendo os pés pelas mãos novamente, declarando que não se referiu a todas as crianças especiais, só "às que têm um grau de deficiência que tornam a convivência com as outras impossível".

Impossível é imaginar que o ministro da educação do Brasil seja uma versão sem graça alguma do Justo Veríssimo, o personagem criado por Chico Anysio. Até no bigode os dois se parecem. A diferença é que o personagem do Chico nos fazia rir dos pensamentos e preconceitos de um político desprezível. No caso do ministro Ribeiro, dá vontade mesmo é de chorar.

E mudando para o prazer de estudar, vem aí mais uma Oficina do Subtexto da Cíntia Moscovich. Agora online, os encontros com o talento e carisma da Moscovich têm reunido alunos pelo mundo inteiro. A ideia é estimular a criatividade e trabalhar a criação de contos com o uso de filmes, clipes, séries e muitos outros materiais. Para mais informações e inscrições, é só escrever para oficinasubtexto@gmail.com.

CLAUDIA TAJES