sexta-feira, 8 de outubro de 2021


08 DE OUTUBRO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

COMBUSTÍVEIS E SOLUÇÕES SIMPLISTAS

Conter a escalada do preço dos combustíveis requer, em primeiro lugar, um diagnóstico correto dos fatores que influenciam na alta, para a partir daí propor soluções, analisá-las e agir. A discussão que existe no momento, partindo do governo federal e do presidente da Câmara Arthur Lira, ao apontar para o ICMS cobrado pelos Estados como grande vilão, é simplista e não soluciona o ponto central. O imposto tem sim grande peso na formação do valor cobrado dos motoristas, mas em regra não tem sido majorado. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a alíquota da gasolina é de 30% e, como já estabelecido, cairá para 25% a partir de 2022. O percentual incide sobre o chamado preço médio ponderado ao consumidor final, que inclui todos os demais custos. Mas a origem dos aumentos para quem vai abastecer está na variação nas refinarias.

A política da Petrobras estabelece que a cotação internacional do petróleo e o dólar são os dois grandes fatores que influenciam no preço de vendas nas refinarias. Em relação à commodity, por oscilar de acordo com circunstâncias da oferta e da demanda globais, não há o que fazer. No que se refere ao câmbio, no entanto, é diferente. Existem diversos aspectos internos que levaram à forte valorização da moeda americana nos últimos anos e é nesta frente que tanto governo federal quanto o Congresso poderiam contribuir, mas estão pecando.

Desde o início do governo Jair Bolsonaro, o dólar sobe 42% ante o real. A moeda nacional é uma das que mais vêm se desvalorizando no mundo, destoando inclusive de seus pares de países emergentes. Além de hoje existir certo consenso de que o Banco Central exagerou no movimento de corte da taxa Selic, o flerte do Executivo com a irresponsabilidade fiscal, muitas vezes insuflado pelo Congresso, estressa o mercado. Efeito semelhante têm os sobressaltos constantes com crises políticas e institucionais, sem falar nas reformas desidratadas.

Diante de tamanhas instabilidades e fragilidades, o Brasil conseguiu uma façanha às avessas. O mundo vive desde o ano passado um ciclo de valorização das commodities. Como o Brasil é grande vendedor destes produtos para o Exterior, o ingresso de dólares em regra segura o câmbio nestes momentos, ajudando a conter a inflação. Mas não é o que se verifica agora. Existem indícios de que, em virtude das turbulências internas, exportadores têm preferido manter dólares fora do Brasil. Assim, ao lado das cotações em alta do petróleo, o câmbio também está na raiz dos reajustes de 51% da gasolina nas refinarias da Petrobras este ano. Para piorar, calcula-se que ainda há defasagem em relação aos preços internacionais .

Com a contrariedade de governadores e prefeitos, que temem perda de arrecadação, Arthur Lira pretende votar na próxima semana, de afogadilho, proposta para alterar o cálculo de como o ICMS incidiria sobre os combustíveis. Passaria a ser considerada uma média de preços dos últimos dois anos. Conforme o presidente da Câmara, seria possível deixar a gasolina 8% mais barata. O risco é que, mesmo com este benefício, a vantagem seja anulada, logo adiante, com o prosseguimento de incertezas internacionais e internas que acabam pressionando o valor nas bombas. Buscar construir um consenso para fazer com que o imposto estadual pese menos no preço cobrado do consumidor é válido. Desde de que feito a partir de um debate sério. Avaliar uma verdadeira reforma tributária poderia ser um ponto de partida. Mas o que poderia trazer melhores efeitos seria privilegiar a responsabilidade fiscal, ante tentações populistas e eleitoreiras, e contribuir para o apaziguamento do país. 

Nenhum comentário: